Processo dos 50 foi o despertar da consciência dos angolanos
Todas as vezes que celebram aniversário, os membros do Processo 50 visitam locais com memória histórica. Foi assim nos Marcos Históricos de Kifangondo e do Cazenga, no Memorial de Teka Dia Kinda, em Malanje, e no Memorial de Caxito.
Ontem, os membros do Processo 50 visitaram o Museu Nacional da Escravatura, onde receberam explicações sobre o drama humano dos antepassados africanos, que foram reduzidos à condição desumana, por causa de um tráfico cruel e avassalador. Amadeu Amorim, membro do célebre Processo dos 50, fala do que representa o dia 29 de Março. “Fazemos hoje 58 anos. É um dia muito importante e cheio de simbolismos, porque foi nesta altura, nos idos anos de 1950, que o povo angolano se começa a erguer e vislumbrar a Independência”, diz, lembrando que a história conta que “houve uma rebelião intermitente, mas constante”.
De 1941 a 1942, houve uma certa acalmia, para em 1959 os nacionalistas se levantarem pela última vez e dar uma luta que daria sequência a tudo o que viria a acontecer mais adiante. Em 1960, prossegue, houve o levantamento e massacre de Icolo Bengo. Já em 1961 foi a vez da Baixa de Kassange e, depois, seguiu-se o 4 de Fevereiro, o 15 de Março e, por fim, deu-se a fuga dos estudantes da Casa dos Estudantes do Império, que viriam a engrossar os movimentos para a guerrilha. “Esta foi uma luta generalizada e que tocou a todo o povo angolano”, disse, para acrescentar: “damos o grito nosso de concordância sobre a necessidade de criação de um museu que retrate a nossa luta”, defende Amadeu Amorim. O nacionalista sublinha que a Casa da Reclusão pode ser aproveitada, para que, passo a passo, a história de Angola não morra. “A nossa geração está a acabar e, daqui a dias, o nosso neto ou bisneto não vai conhecer a nossa história, se não olharmos para a questão com a necessidade que se impõe ”.
Beto Van-Duném, outro dos membros do Processo dos 50, também esteve no Museu da Escravatura, um local cheio de simbolismos e de memórias. Só na costa africana foram 12 milhões de negros tornados escravos. Em Angola, mais de cinco milhões. Muitos foram para São Tomé e outros para o Ghana, passando por Cabo Verde. Todos estes iam trabalhar nas minas de ouro. Outros ainda foram parar nas Américas e Europa.
Beto Van-Duném lembra os passos iniciais do Processo dos 50 e de ter sido ele e mais outros jovens, ao longo dos seus 16 ou 17 anos, os protagonistas desse importante processo. “Tudo isso começou comigo e com Amadeu Amorim. Fomos nós que iniciámos todo este processo que levaria à nossa Independência”, diz, emocionado, para sublinhar: “conseguimos, através do Presidente Neto e de Lúcio Lara, uma máquina para fazer panfletos, à mão de Ilídio Machado, cujo ideal pela Independência era irrefutável”. Beto Van-Duném recorda que foi no final da década de 50, que politicamente se começou a dar informações ao povo com mensagens, que incitavam à luta pela Independência. “Trabalhámos noites inteiras. A luta começa deste modo, parecendo que não”. Hoje, Beto VanDuném fala com reconhecido e incontido orgulho sobre os caminhos do desenvolvimento do país. Agora, o fundamental é consolidar.
Actualizar conhecimentos
Augusto dos Santos, outro membro do Processo dos 50, não se arrepende dos dias em que nos idos anos de 1950 teve de “embolsar coragem” e lutar pela pátria. “O que o nosso país vive hoje e o estágio de desenvolvimento que alcançou resulta de um passado de luta pela conquista da Independência”, afirma.
O nacionalista explica que o desenvolvimento é visível aos olhos de todo o mundo, não apenas dos angolanos. “Orgulhamo-nos por tudo quanto tenhamos feito. Valeu a pena. Somos independentes e livres. Temos um Hino, uma Bandeira e uma Constituição da República. O que mais queremos? Deixámos de ser escravos. Somos os donos do nosso destino”, diz Augusto dos Santos.
Ao referir-se à visita ao Museu da Escravatura, afirma: “É necessário actualizar os conhecimentos da identidade e da história angolana para as novas gerações. Os tempos modernos, desde o Processo dos 50 à Casa da Reclusão, do São Pedro da Barra, ao Cuito Cuanavale, entre outros, carecem de actualização”, defende.
Valorizar a História
Depois da visita guiada, os apelos sobre preservação da identidade histórica e valorização do passado de quem lutou pela paz e Independência, fizeram eco. O presidente da Associação dos Antigos Guerrilheiros da Pátria, José Fernandes, também membro do Processo dos 50, defende políticas para preservar a História do país. “É preciso olhar para isso, para que a história não morra. É por isso que hoje estamos aqui no Museu da Escravatura para reflectirmos sobre o nosso passado e, deste modo, pensarmos em como projectar o futuro”, realça, para acrescentar que, no futuro, “o fundamental vai ser continuarmos unidos, para que possamos navegar no mesmo barco”.