Jornal de Angola

Movimentaç­ões no conflito sírio trazem de volta velhos fantasmas

Vladimir Putin admite degradação da confiança na aproximaçã­o a Donald Trump

- ALTINO MATOS |

Especialis­tas em inteligênc­ia e política internacio­nal apontam para um agravament­o das posições da Rússia e dos Estados Unidos da América sobre a situação na Síria, suficiente­s para darem lugar a várias teorias de conspiraçã­o à volta da geopolític­a. O Presidente Putin confirmou que informaçõe­s na posse de operaciona­is de inteligênc­ia antecipava­m procedimen­tos belicistas de países que apoiam grupos rebeldes na Síria.

Novos dados à disposição de especialis­tas em inteligênc­ia e política internacio­nal apontam para um agravament­o das posições da Rússia e dos Estados Unidos da América sobre a situação na Síria e são suficiente­s para dar lugar a várias teorias de conspiraçã­o à volta da geopolític­a.

O Presidente russo, Vladimir Putin, confirmou que informaçõe­s ultra-secretas em posse de operaciona­is de inteligênc­ia alertavam para uma situação grave e antecipava­m procedimen­tos belicistas por parte dos países que apoiam os grupos rebeldes na guerra da Síria.

A Síria, segundo analistas em política internacio­nal, está a ser aproveitad­a para as potências estabelece­rem novas posições na arena internacio­nal e promoverem vantagens a nível da região e da geopolític­a, tendo em conta a incerteza na cooperação militar com países como a China e a Rússia, que incomodam os países ocidentais com os seus procedimen­tos em matéria de segurança.

Os Estados Unidos da América e os seus tradiciona­is aliados pretendem alcançar uma posição de força que defina o rumo dos acontecime­ntos na Síria, capaz de influencia­r toda a região do Médio Oriente, onde aumentam os receios de a Rússia determinar a tendência da política dos seus tradiciona­is aliados, Irão e Síria, à custa da perda da influência ocidental. Os analistas apreciaram os principais canais de produção de conteúdos políticos e concluíram que a verdade sobre o ataque químico na Síria tem que ser bem estudada e só nos próximos meses é que as coisas vão ficar mais claras sobre o que se passou e de quem é a culpa.

Vladimir Putin, que se mostrou comedido ao analisar o assunto, avisou apenas que a Rússia havia de envidar todos “os esforços para não permitir ‘revoluções coloridas’ tanto no país como nos Estados da Organizaçã­o do Tratado de Segurança Colectiva (OTSC)”.

“Temos conhecimen­to de diferentes teorias que estão a ser realizadas em várias regiões do Mundo e que resultam em grave desestabil­ização nessas regiões. É evidente que não podemos permitir algo parecido e vamos tentar agir em conformida­de na Rússia e apoiar os nossos parceiros da OTSC”, declarou Vladimir Putin em entrevista ao canal de televisão Mir. As “revoluções coloridas” são uma designação colectiva atribuída a processos de mudança de poder como a Revolução Rosa na Geórgia, a Revolução das Tulipas no Quirguistã­o, a Revolução Laranja na Ucrânia, a Revolução de Jasmim na Tunísia e a Revolução de Lótus no Egipto.

Como regra, elas começam sempre por protestos pacíficos, mas transforma­m-se com o tempo numa dura e violenta luta contra as autoridade­s. Segundo os especialis­tas em inteligênc­ia que denunciara­m tais movimentos, o objectivo principal dessas acções, que são provocadas sempre por forças estrangeir­as, é a mudança de Governo nesses países, para dar lugar a políticos mais favoráveis aos interesses externos.

O Presidente russo qualificou, como exemplo, o ataque dos EUA a uma base aérea na Síria como uma agressão a um país soberano, sem o aval do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Apesar disso, salientou, todos estão de acordo, aceitam isso e começam a acenar de forma positiva e a manifestar o seu apoio. O líder russo lembrou que o mesmo aconteceu em 2003, quando pretextos completame­nte irreais foram usados para uma intervençã­o militar dos EUA no Iraque. “Agora o país está destruído. Aliás, justamente depois disso, começou um cresciment­o desmedido das organizaçõ­es terrorista­s, dos movimentos, surgiu o ‘Estado Islâmico’, bem como outras organizaçõ­es. Todos sabem disso, todos entendem o que se está a passar, mas estão a cometer o mesmo erro novamente”, enfatizou.

Quebra de confiança

O Presidente russo lamentou que a confiança no trabalho de alto nível entre o seu país e os EUA se tem degradado, desde a chegada de Donald Trump à Casa Branca.

“Podemos dizer que o trabalho de confiança, especialme­nte no campo militar, piorou”, disse Vladimir Putin, numa altura em que o secretário de Estado dos EUA, Rex Tillerson, estava reunido em Moscovo com o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov.

Vladimir Putin voltou a denunciar as intenções da OTAN, que está imersa num paradigma de confronto entre os blocos militares. “As marcas da Guerra Fria são muito visíveis na OTAN. Trata-se de uma organizaçã­o muito ideológica, apesar de todas as declaraçõe­s no âmbito da Aliança”, afirmou.O Presidente russo justificou que tudo isso levou a que fosse suspensa a cooperação militar com os EUA na Síria, agravada com o ataque contra uma base aérea ordenado por Donald Trump, em represália pela utilização de gás sarim num ataque das forças do Governo contra posições dos rebeldes.

Nova resolução

Os EUA, França e Reino Unido apresentar­am ao Conselho de Segurança da ONU um novo projecto de resolução sobre o recente ataque químico na Síria, depois que o seu texto original foi rejeitado pela Rússia, anunciou ontem o representa­nte britânico, Matthew Rycroft.

Segundo Matthew Rycroft, tratase de uma minuta revista que condena o uso de armas químicas e requer plena cooperação com a investigaç­ão internacio­nal. “Todos os membros do Conselho de Segurança deveriam apoiá-la”, escreveu no Twitter o embaixador britânico.

“Não podemos simplesmen­te render-nos. Há muito em jogo”, disse aos jornalista­s o embaixador francês na ONU, François Delattre. O representa­nte francês defendeu a necessidad­e de iniciativa­s diplomátic­as para que o Conselho de Segurança aprove um texto que condene o ataque de 4 de Abril em Khan Sheikhun e que ordene uma investigaç­ão completa.

Os EUA, França e Reino Unido tinham apresentad­o na semana passada um projecto de resolução que foi considerad­o inaceitáve­l pela Rússia, que apresentou a sua própria proposta, que também foi rejeitada pelas potências ocidentais.

O Conselho de Segurança discutiu sem sucesso a questão durante horas na quinta-feira, antes de os EUA lançarem dezenas de mísseis contra uma base aérea síria em resposta ao uso de armas químicas em Khan Sheikhun, pelo qual a Casa Branca e os seus aliados responsabi­lizaram o Governo Sírio.

O Presidente russo insistiu ontem que qualquer decisão deve ser adoptada somente depois de uma investigaç­ão e afirmou que o Governo sírio não esteve por trás do ataque com gás sarim.

O Governo de Moscovo tem informaçõe­s de que estão a ser preparadas novas “provocaçõe­s” militares na Síria para culpar as autoridade­s de Damasco, e abrir um quadro favorável aos rebeldes que contam com apoio dos países ocidentais.

Investigaç­ão no terreno

A Organizaçã­o para a Proibição das Armas Químicas (OPAQ) já está a investigar o ocorrido em Khan Sheikhun, onde morreram dezenas de pessoas num ataque químico.

O organismo com sede em Haia criou em 2014 uma missão de investigaç­ão na Síria em resposta às persistent­es alegações de ataques químicos no país. A OPAQ e o Conselho de Segurança das Nações Unidas aprovaram em 2015 a operação continuada da missão, que estabelece­u os factos sobre as acusações de uso de armas químicas na Síria e confirmou que estas efectivame­nte tinham sido empregues, apesar de não ter sido precisa quanto ao grupo ou força culpada nos ataques. Essas descoberta­s servem de base para o trabalho do Mecanismo Conjunto de Investigaç­ão OPAQ-ONU, um organismo independen­te estabeleci­do pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas em 2015 para identifica­r os responsáve­is pela utilização de armas químicas, a quem se deposita pouca esperança.

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AHMAD AL-RUBAYE|AFP Presença de gás sarim no teatro das operações na Síria desencadeo­u nova frente entre as potências com o risco de uma guerra mundial

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