Angola carece de legislação para punir poluidores
Obra da jurista Margarida de Almeida é um grande contributo para o direito ambiental
A ministra do Ambiente, Fátima Jardim, aplaudiu em Luanda a iniciativa da jurista Margarida de Almeida, que traz à discussão um problema pouco discutido em Angola, depois de ter feito uma investigação exaustiva à volta da poluição marinha.
Fátima Jardim, que falava ao Jornal de Angola depois da cerimónia de lançamento do livro de Margarida de Almeida, intitulado “Poluição do meio ambiente marinho - direitos difusos e colectivos”, acentuou que “a água é vida” e alertou que os problemas da poluição agravam-se cada vez mais com o desenvolvimento das sociedades modernas.
A antiga ministra das Pescas concordou, tal como a autora do livro, que se deve continuar, na área do Direito, a regulamentar e a legislar para “podermos cada vez mais defender os direitos da água e do mar”.
“Este brilhante livro é uma valiosa contribuição para todos nós”, declarou a ministra Fátima Jardim, que chamou a atenção aos jovens para a necessidade de continuarem a investigação feita por Margarida de Almeida, em cujo livro destaca que “o Mundo tem de proteger o direito da água e do mar como uma perspectiva de futuro que assegure o desenvolvimento sustentável”.
“Temos áreas da parte ambiental que ainda não estão exploradas nem protegidas”, advertiu a titular da pasta do Ambiente, para quem é preciso dar continuidade à obra de Margarida de Almeida, por ser “um contributo para podermos, cada vez mais, assegurar um direito que não é só de Angola, para vivermos todos num ambiente sadio”.
Fátima Jardim fez rasgados elogios a Margarida de Almeida, considerando-a “uma grande ecologista”, por ter feito uma investigação exaustiva, tendo analisado aspectos da realidade angolana que são desconhecidos de muitas pessoas no país.
A ministra do Ambiente disse que existe poluição marítima em Angola causada por entidades e pessoas que não são responsabilizadas por falta de legislação. “Se continuar a haver poluição do mar, não vamos ter um desenvolvimento humano adequado”, alertou Fátima Jardim, que disse ter descoberto no livro a possibilidade de serem estabelecidas consultorias sobre a preservação dos oceanos, que hoje “constituem, no quadro dos objectivos realmente sustentáveis, um dos pilares importantes da sustentabilidade até ao ano 2050”.
“Estamos a fazer perspectivas de uma nova agenda, de 2025 a 2050, onde a autora do livro poderá dar o seu valioso contributo”, salientou.
Autora acredita em causas
O livro de Margarida de Almeida, uma mulher que se empenha em causas ecologistas, contém em 378 páginas a dissertação de mestrado defendida pela autora em 2011, na Universidade Metodista de Piracicaba, no Brasil.
Antiga guerrilheira da luta pela Independência Nacional, Margarida de Almeida é licenciada em Direito pela Universidade Lusíada de Angola e especialista em Direito do Ambiente, centrado nas questões do Direito do Mar e da poluição marinha, bem como no Direito Comparado, sobretudo relativamente às legislações de Angola e do Brasil.
Professora de Direito do Urbanismo e Ambiente, Margarida de Almeida, que faz da docência uma das suas grandes paixões, afirmou que o livro tem o objectivo de complementar o que já existe sobre o assunto em Angola, mas deu ênfase ao facto de não ter encontrado, na pesquisa que fez, nenhum livro editado no país que aborde a poluição marinha na sua abrangência jurídica.
“Eu fui a primeira”, afirmou a autora do livro que contém cinco capítulos, o primeiro dos quais dedicado ao mar, aos oceanos e à relação entre a água, o mar e a saúde e o segundo constitui uma análise da evolução histórica. Lembrando que há mais água salgada do que terra, Margarida de Almeida acentuou que, além das árvores, o mar também fornece oxigénio ao homem, através das algas.
“O mar é a principal fonte de oxigénio”, reafirmou Margarida de Almeida, quando falava dos efeitos da poluição marinha tanto para a saúde humana como para a natureza. Mencionou, como exemplo, a tainha. “O peixe tainha alimenta-se dos esgotos, pois onde houver esgoto tem tainha”, alertou a ecologista.
No âmbito da cadeia alimentar, adiantou, a tainha chega à mesa das pessoas contaminada, por exemplo, com febre tifóide e cólera. Margarida de Almeida estendeu o exemplo da tainha ao marisco do litoral.
A autora do livro deu ainda ênfase ao facto de hoje em dia o ambiente ser encarado como um direito fundamental. “Assim como tenho direito fundamental à vida, ao bom nome e à minha privacidade, o direito ambiental, nos Estados democráticos, também já é um direito fundamental”, acentuou.
No capítulo sobre as regras que orientam o Direito Ambiental, destaca os princípios do “poluidor pagador” e do “usuário pagador”. “Se você polui, tem de pagar”, salientou Margarida de Almeida, que disse, por outro lado, ser contrária à utilização “do carro do fumo que se usa para matar mosquitos no nosso país”.
A autora alertou que os produtos utilizados pelo carro de fumigação são altamente tóxicos que provocam cancro. Por essa razão, no “Mundo civilizado já deixou de ser usado desde os anos 60”.
Margarida de Almeida faz ainda uma incursão por outros tipos de poluição, como a agrotóxica, a terrestre e das praias. No decurso da sua investigação, teve de fazer literalmente um mergulho no mar, tendo considerado um dos piores momentos da sua vida, por não saber nadar.
Apesar disso, “foi uma experiência maravilhosa e valeu a pena, porque dentro do mar há cores que aqui na terra não existem”, declarou. Margarida de Almeida disse ter estado acompanhada na sua aventura marinha de um experiente mergulhador. A investigação fez com que voltasse a rever as lições da física, química e biologia, além de estudar oceanografia.