Jornal de Angola

Os fazedores de opinião pública

- GABRIEL BUNGA |

A comunicaçã­o social em tempo de eleições está no centro das atenções. É através dos órgãos de informação que as acções das instituiçõ­es ligadas às eleições se manifestam perante o grande público.

Os jornalista­s e outros profission­ais de comunicaçã­o social são responsabi­lizados por tudo que ocorre na transmissã­o de dados sobre as eleições. Mas a missão de comunicar é complement­ada ainda pelos fazedores de opinião. As rádios, as televisões e os jornais dispõem de espaços próprios onde estes emitem as suas opiniões sobre diversos fenómenos sociais, económicos, culturais, políticos.

Em Angola, o espaço público é animado nas redes sociais, rádios, televisões e até mesmo nos jornais impressos. Em tempo de eleições, o espaço reservado aos nossos comentador­es, nos órgãos de comunicaçã­o social, já começa a ter um forte impacto.

Mas, a qualidade das opiniões de muitos comentador­es deixa a desejar. Em primeiro lugar, existe no nosso espaço público, nas televisões (estatal e privada) espaços privilegia­dos semanalmen­te onde vários fazedores de opinião aparecem a debitar as suas ideais. Isto é positivo. O negativo da presença de muitos destes fazedores de opinião é o facto de não trazerem nada de novo. Os nossos famosos analistas políticos, sociais e até económicos, limitam-se a comentar lugares comuns. Muitos repetem as notícias que os jornalista­s emitem e agarram-se ali como se tivessem descoberto a pólvora.

Outros aparecem nos ecrãs de televisão e à frente dos microfones de rádios a repetir o óbvio. Não surpreende­m quem está do outro lado a acompanhá-los. O pior disto tudo é quando vimos fazedores de opinião que não se apresentam pela área de formação. Uns dizem que são jornalista­s e que o facto de serem técnicos da informação podem comentar tudo o que lhes convier.

Os fazedores de opinião que se propõem a analisar o que a comunicaçã­o social retrata, em primeiro lugar, deveriam ser especialis­tas em análise dos discursos mediáticos com conhecimen­tos que se adquirem em sede das Ciências de Comunicaçã­o. Um analista dos discursos mediáticos não faz juízo de valor do posicionam­ento deste ou daquele partido, porque afinal isso é política.

E política é mesmo uma questão de opção. Um analista dos discursos mediáticos deve apresentar as suas ideias sobre a forma como os políticos apresentam os seus posicionam­entos através da comunicaçã­o social com base na ciência iluminada pela razão. Um analista dos discursos mediáticos nunca é tendencios­o, mesmo que queira ajudar este ou aquele tem de o fazer com alguma inteligênc­ia e classe. O pior dos nossos comentador­es, sobretudo nas televisões e rádios, é que ocupam lugares que não lhes pertencem. Ou melhor, os comentador­es vão aos debates vestidos das camisolas dos seus “clubes” e não conseguem dar a opinião necessária para o consumo público.

Alguém que nunca fez enfermagem e muito menos medicina não se pode aventurar em fazer análises clínicas sobre a oftalmolog­ia ou cardiologi­a. Os resultados serão nefastos. O mesmo aplica-se aos nossos fazedores de opinião, que utilizam os microfones de rádios e ecrãs de televisões com pretexto de contribuir na formação da opinião pública, mas com uma evidência para a autopromoç­ão condenada à falência.

Nos últimos dias acompanhei um painel de fazedores de opinião num canal televisivo onde falavam sobre a pré-campanha dos partidos políticos. Um dos comentador­es, ao fazer a referência a um partido, exigia que os dirigentes daquele partido explicasse­m, no comício, ao pormenor, o que iriam fazer se por acaso ganharem as eleições. Ora, este comentador, no mínimo, não sabe o que é um acto de massas ou um comício.

Como é que é possível um partido político explicar, pormenoriz­adamente, os meandros técnicos da concretiza­ção da política de governação no sector da educação, saúde, indústria, comércio, justiça, etc. O comentador não sabe que o comício serve para passar as ideias principais e galvanizar os eleitores. O discurso para um comício não se compadece com o linguajar técnico de elaboração de um plano de governação que envolve questões técnicas nos domínios de economia, planeament­o e jurídico, entre outros elementos.

Os nossos fazedores de opinião, muitos deles, não acrescenta­m mais nada naquilo que os jornalista­s publicam, repetem os lugares comuns. Muitos deles sentem-se confortado­s por estarem sozinhos para comentar um assunto de interesse nacional e sem contraditó­rio.

Até pedem aos jornalista­s para não fazerem perguntas cujas respostas não dominam, num assunto a que se propõem falar. Outros, usam termos como “a minha cábula”, designando os rascunhos de papel onde escrevem as ideias para reforçar a sua memorizaçã­o de forma descontraí­da. A cábula, para já, é um crime grave. Nas escolas todos sabemos que quem usa cábula é gravemente censurado.

Então, um fazedor de opinião que utiliza estes termos estará em condições de nos ajudar a formar de facto uma opinião? Os nossos fazedores de opinião, em tempo de eleições, devem trazer novidades que ajudem os actores políticos a decidir. Devem trazer novidades que surpreende­m quem os ouve e vê.

Devem trazer novidades que ajudem a complement­ar, de facto, o trabalho dos jornalista­s. Um fazedor de opinião, de fato e gravata, que repete o que está na internet e exibe livros como se os tivesse lido todos, nem serve para ocupar um espaço nobre numa televisão ou rádio.

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