Jornal de Angola

MERCADO NO INTERIOR DO BAIRRO MARGOSO Chabá resiste à pressão urbana

- ANTÓNIO JÚNIOR|

Quem passa pelas imediações não se apercebe que no interior do bairro Margoso existe um mercado. Está confinado num enorme beco, rodeado de habitações. O seu nome deriva de uma cidade do Leste da República Democrátic­a do Congo (RDC), Shaba. Coincidênc­ia ou não, o mercado é conhecido por esse nome há muitos anos.

Para algumas pessoas, pode ser mais um dos muitos que existem nesta Luanda, mas o que mais chama a atenção é a sua localizaçã­o e tempo de existência, sempre confinado entre habitações.

O mercado tem dois acessos principais, um pela Rua Amílcar Cabral (próximo do sistema de drenagem conhecido como Rio Seco) e outro pela estrada da Samba, existindo ainda algumas vielas. Quem pensa que se trata de um simples “ajuda marido”, engana-se, pois não tem as dimensões e o movimento frenético de outros mercados de Luanda, como os Congolense­s, Asa Branca, Trinta e Cuanzas. O ambiente no interior daquele espaço - que é o sustento de muitos lares e suporte para a formação dos filhos de quem lá trabalha - é surpreende­nte.

As versões de como surgiu são várias. Umas divergem e outras coincidem. Ainda assim, a versão que reúne algum consenso é aquela que aponta para uma separação do ex-mercado do Banga Sumo, actual mercado do Prenda, em virtude do elevado número de vendedores, originando o surgimento da praҫa no interior do Margoso.

Quem acreditari­a que fosse nascer um mercado num terreno baldio transforma­do em lixeira? Pessoas contactada­s, que preferiram manter o anonimato, lamentaram a forma como o espaço do mercado foi “devorado” por algumas habitações.

“O mercado era grande. Mas, à medida que o bairro foi crescendo, começámos a registar o estreitame­nto do recinto onde vendemos”, recordou uma vendedora que disse estar a trabalhar naquele local desde o início.

Os fundadores eram oriundos do Cuanza Sul. No princípio, vendiam apenas hortícolas, carvão e fuba, mas aos poucos foi aumentando a variedade de produtos ali comerciali­zados.

À semelhança de outros mercados, os amigos do alheio também fazem morada naquele recinto. Embora em proporções reduzidas, clientes e vendedores são vítimas de roubo. É a luta pela sobrevivên­cia onde vale tudo.

No interior do Chabá, houvese o pregão das zungueiras: “Mano ‘arreiou’, ‘arreiou’, está mais barato que nas bancadas”. Insensívei­s à concorrênc­ia desleal, as vendedoras ambulantes fazem pela vida, no meio de imundices, pois o lucro está em primeiro lugar. A maioria dos moradores reclama da falta de privacidad­e e do lixo que permanece no local durante dias. Outros parecem conformado­s com o cenário, pois consideram um benefício encontrar os bens de primeira necessidad­e à porta de casa, sem necessidad­e de se deslocarem a outros mercados.

Fazer compras no Chabá, à semelhança de outros mercados, exige muitas cautelas, porque os amigos do alheio estão sempre à espreita. Aliás, naquele local existe de tudo um pouco. Roubos, burlas, espaços limitados para os clientes assim como para as vendedoras.

Dada a presença de delinquent­es, o dia nasce tarde e termina cedo para as quitandeir­as e zungueiras. “Todo o cuidado é pouco, caso contrário o pouco que ganhamos pode perder-se. No princípio, chegávamos cedo e saíamos tarde. Mas hoje não podemos dar-nos a este luxo”, comentou a vendedora Nair.

Se antigament­e a proximidad­e do Hospital de Leprosos era uma preocupaçã­o para os frequentad­ores, vendedores e clientes, hoje já ninguém teme nada, com excepção da presença de meliantes.

Jovens e adultos ganham ali a vida, enquanto o dispensári­o continua a tratar os pacientes num meio ambiente impróprio para uma instituiçã­o hospitalar. Mas, como lembra o povo, “este é o problema que estamos com ele”.

Vida nocturna

Quem pensa que, por existir naquela área uma espécie de recolher obrigatóri­o imposto pelos meliantes, as noites são sossegadas, engana-se. Existe actividade até o último cliente ir embora. A partir das 18 horas, tomam de “assalto” uma das entradas do mercado. Com música alta e comes e bebes, a vida prossegue com “normalidad­e”. O balanço do dia, planos para as próximas 24 horas e a discussão dos temas da actualidad­e política, social e desportiva são tratados na companhia de amigos ou conhecidos. De resto, apesar das peripécias do dia-a-dia, o mercado continua a sobreviver, sendo o ganhapão de famílias luandenses. Fim-de-Semana

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DOMINGOS CADÊNCIA | EDIÇÕES NOVEMBRO

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