Europa atenta ao voto francês
Marine Le Pen reclama contra as elites e a ingerência de Bruxelas e Berlim nas eleições
Os franceses respondem hoje à Europa, quando votarem se preferem manter-se na União e que continuam a acreditar nos valores de inclusão e solidariedade, e escolhem Emmanuel Macron, o candidato de cariz republicano, ou se, ao contrário, estão desencantados e querem uma mudança radical, e optam então por Marine Le Pen, da extremadireita, que conseguiu assombrar Bruxelas e Berlim, que estão com os olhos postos em Paris.
Emmanuel Macron, que passou rapidamente de um simples político a candidato da classe republicana, graças à aposta na determinação dos valores europeus e a promessas de criação de emprego, facilidade de financiamento e diminuição de impostos em áreas sensíveis, com o argumento de ser possível captar receitas de forma menos ofensiva aos investidores e aos empresários, liderou as sondagens tanto de opinião como de intenções de voto, o que o torna, a julgar pelos números, no vencedor das presidenciais francesas.
Analistas em matéria de natureza social e cientistas políticos dizem que Emmanuel Macron não é uma boa garantia mas perante as cartas de Le Pen, vão possibilitar que ele alcance o poder e se aproxime do desejo da maior parte dos franceses, um povo originalmente acolhedor dentro do contexto europeu. A França, nesta linha de pensamento, distancia-se da Alemanha, da Bélgica e até da Inglaterra, pelo número de imigrantes no seu território e o cruzamento de cidadãos da União em Paris, a grande capital da moda e da celebração das artes.
É neste particular que a candidata Marine Le Pen ofereceu espaço a Emmanuel Macron, que soube aproveitar e colar a adversária às políticas racistas sem a ajuda da União Europeia. Le Pen ficou em dificuldades para se desenvencilhar, e no último dia de campanha foi obrigada a escapar pelas traseiras de uma catedral, empurrada por uma multidão que apelava à França da união e da cordialidade, argumentos contrariados pela extrema-direita, que promete deixar cair tudo isso, em nome de um poder vertical e internacional. Marine Le Pen acredita que esta França, a sua França, inconcebível no imaginário de muitos franceses, é a única forma de retirar o poder das elites e devolvê-lo ao povo, a sua principal promessa de campanha.
Le Pen avisou os imigrantes para que se preparem e aceitem de forma livre deixar a França, pois o país não os aceita e não se permite que façam mais estragos, como, segundo a candidata, os actos de terrorismo e de vandalismo. Marine Le Pen foi mais longe, e promete retirar a dupla nacionalidade a todos, alegando que isso “vai ajudar a Polícia e outras forças especializadas a combater às agressões contra a França”.
Hoje, mais de 80 mil franceses expatriados votam em Bruxelas, para a segunda-volta das eleições presidenciais, o que representa um ataque às políticas da candidata da extrema-direita. Na primeira-volta, a 23 de Abril, o líder do movimento Em Marcha!, Emmanuel Macron, obteve junto destes eleitores uma larga maioria de 35 por cento dos votos, muito à frente da candidata da Frente Nacional, Marine Le Pen, que ficou na quinta posição com cerca de sete por cento dos votos. Raramente as questões europeias ocuparam um lugar tão importante numa campanha presidencial e revelaram uma profunda divisão entre os dois finalistas. O chefe do Escritório de Bruxelas da Fundação Robert Schuman, Charles de Marcilly, citado na imprensa europeia, disse que as expectativas são bastante claras eé a primeira vez que vemos presidentes das instituições a tomarem partido e a apoiar um candidato na noite da primeira volta. “É bastante inovador, pois, normalmente, há um certo recuo, evitando tomar posição e ser acusado de interferência, mas houve um claro apoio a Emmanuel Macron porque ele é próeuropeu e, além disso, está em total discordância com a política proposta pela candidata Marine Le Pen. Charles Marcilly referiu que houve um retorno à ideia de Estado-nação, com negociações entre Estados, mas não se sabe bem à volta de que mesa. Para ele, essa é a visão de Marine Le Pen, que quer o regresso do franco, e não sabemos muito mais. Marcilly disse que há uma visão que continua a ser bastante pró-europeia, mas a candidata da Frente Nacional pediu para retirar a bandeira europeia dos cenários das televisões, enquanto Emmanuel Macron, pelo contrário, assumiu o risco de agitar a bandeira da União Europeia nos seus comícios. A candidata Marine Le Pen queixou-se da interferência de políticos europeus na campanha e que tal, disse, pode ditar o rumo dos acontecimentos, isto é, a vitória nas presidenciais. Le Pen não chegou a falar em fraude, mas deixou a entender que o assunto é muito grave e complexo, a forma como Bruxelas e Berlim posicionaram-se e apelaram aos franceses, como se tratasse de uma corrida eleitoral a cargos na estrutura da União Europeia.
Le Pen e Macron acusaram-se, no último debate televisivo, com os nervos a flor da pele. A candidata da extrema-direita afirmou que Macron representa a continuidade de Hollande, e que os francesas não podem esperar nada da sua vitória, “porque vai apenas caucionar as políticas de exploração e humilhação, perante uma Europa agressiva e senhora do destino dos franceses”. Emmanuel Macron, o candidato da “república”, chamou a sua adversária de “senhora do medo”: “quando as pessoas olham para si, só encontram medo.” Macron afirmou que com Le Pen o país vai andar para trás, e Paris, a grande capital, pode viver os seus piores tempos, desde que se conhece como um lugar de paixões e de realização de sonhos”.
Brexit
“A decisão britânica de deixar a União Europeia é uma “tragédia” para a qual a Europa também contribuiu”, considerou na sexta-feira em Florença (centro da Itália) o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker. “É uma tragédia”, declarou Juncker em francês, num discurso no Instituto Universitário Europeu de Florença, antes de comentar a eleição francesa.
O presidente da Comissão explicou a sua escolha da língua francesa em Florença, garantindo que o inglês estava, “lenta mas seguramente, perdendo terreno na Europa”. “Os franceses vão votar no domingo (hoje), e eu quero que eles compreendam o que eu digo sobre a Europa e as nações”, acrescentou Juncker, em inglês, antes de mudar para o francês.
No seu discurso, o ex-primeiroministro do Luxemburgo também previu negociações difíceis pela frente depois de se reunir em Londres na semana passada com a primeira-ministra britânica, Theresa May. Na quarta-feira, May acusou os “líderes europeus” de tentar interferir nas eleições parlamentares britânicas de 8 de Junho. Ele não fez nenhum comentário directo sobre estas declarações, adoptando um tom conciliador quando falou dos “pontos fracos” da União Europeia. Estes, afirmou, podem “parcialmente explicar o resultado do referendo na Grã-Bretanha”.
“A União Europeia, em muitos aspectos, fez muito, incluindo a Comissão”, reconheceu, citando demasiada regulamentação, muita interferência na vida dos nossos cidadãos”, disse Juncker.