ONU quer fim dos abusos de contrabandistas
Centenas de migrantes foram socorridos esta semana na região italiana da Sicília
A Agência das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) quer mais medidas antes da captura e da exposição dos que tentam cruzar o mar Mediterrâneo pelo que chama de “abusos horrendos” de contrabandistas na Líbia e em países de trânsito, disse ontem o chefe da instituição mundial.
Fillipo Grandi disse que as acções incluem o redobrar esforços para resolver conflitos, sobretudo em África, e o uso de recursos de desenvolvimento de uma forma muito mais estratégica.
O apelo da agência da ONU surge depois do anúncio de que mais de seis mil pessoas atravessaram o Mediterrâneo para chegar à Itália desde sexta-feira.
O movimento fez subir o número total de migrantes e refugiados para mais de 43 mil.
Fillipo Grandi diz ser preciso reduzir a pobreza, mitigar os efeitos das mudanças climáticas e apoiar os países que acolhem ou são usados para a passagem de um grande número de refugiados.
O pedido da agência é que haja políticas e acção coordenada dos países europeus e doadores.
Para o chefe da ACNUR, a rota do Mediterrâneo Central, a partir do norte de África, tem provado ser a mais mortífera. Mais de 1.150 pessoas desapareceram ou morreram enquanto tentavam chegar à Europa desde o início do ano.
A ACNUR sublinha que desde que 2017 começou, uma em cada 35 pessoas morreu durante a viagem marítima da Líbia para a Itália. Somente nos últimos quatro dias 75 pessoas perderam a vida.
A agência quer que a prioridade seja salvar as vidas após o recente aumento nas chegadas. O apelo é que haja mais esforços de resgate ao longo do percurso que a ACNUR considera “uma questão de vida ou morte”. A agência elogia os esforços feitos para o salvamento de dezenas de milhares de vidas pela Guarda Costeira italiana, em coordenação com a Frontex, a agência europeia que vigia as fronteiras do continente, e as ONG.
No ano passado mais de 46 mil pessoas foram resgatadas por organizações de sociedade civil no Mediterrâneo Central, o equivalente a 26 por cento das operações, e o número de 2017 devem atingir um terço.
Fillipo Grandi revelou estar “profundamente chocado” com a violência levada a cabo pelos contrabandistas, que inclui o assassinato de jovens que foi recentemente relatado por sobreviventes. Os passageiros a bordo de navios usados pelos traficantes oscilam entre 100 e 150, o que agrava o risco de naufrágios, aliado à fraca qualidade de navios e ao uso crescente de barcos de borracha no lugar de embarcações de madeira.
Os migrantes e candidatos a asilo não podem pedir ajuda e ser localizados. A ACNUR sublinha que esta situação não pode continuar sendo “imperioso combater as causas profundas do movimento de pessoas”. O chefe da agência quer opções credíveis para os que precisam de protecção internacional, incluindo formas seguras para chegar à Europa, de reunir famílias, para a sua transferência e reassentamento.
Migrantes socorridos
O apelo da Agência das Nações Unidas para os Refugiados é feito depois de 541 migrantes serem socorridos na segunda-feira no porto de Catania, na Sicília, de acordo com fontes de segurança italianas, citadas pela PANA.
Estes migrantes foram socorridos em seis operações no Mediterrâneo, precisaram as mesmas fontes e indicaram que as autoridades locais de Catania lançaram o sistema de acolhimento e prevenção médica, numa altura em que equipas móveis da segurança realizavam inquéritos para determinar a identidade de cada migrante.
A Itália é o único país que alberga actualmente todos os migrantes rejeitados pelos outros países, lamentou o vice-presidente do Parlamento italiano, Luigi de Mayo, que indicou que 180 mil migrantes chegaram a Itália no ano passado, contra apenas oito mil chegados à Espanha.
O deputado italiano defendeu a reforma da convenção de Dublin relativa à determinação do Estado responsável pelo exame de um pedido de asilo apresentado num dos Estados-membros da comunidade europeia a fim de instaurar um regulamento que estipule que em cada 100 mil migrantes chegados a Itália 95 mil devem ser repartidos entre os países europeus, determinando ao mesmo tempo se os cinco mil restantes na Itália podem permanecer no local ou ser repatriados. “Temos, enquanto países ocidentais, uma grande responsabilidade pelas guerras e pela mudança climática. Nós vemos os resultados dos nossos delitos voltar para nós”, realçou Luigi de Mayo.
Assalto a Melilla
Entretanto, uma centena de migrantes africanos conseguiram entrar ontem no enclave sob administração espanhola de Melilla saltando a alta cerca fronteiriça que a separa do norte do Marrocos, afirmaram diversas fontes.
“O assalto ocorreu às 7h00 da manhã, foi um grupo muito numeroso de 300 subsaarianos e cerca de 100 podem ter entrado em Melilla”, declarou à agência de notícias France Press um portavoz da Guarda Civil espanhola.
Três guardas civis foram levemente feridos depois de receber golpes ou cair e outro ao ter sido atingido por um gancho utilizado pelos migrantes para escalar a cerca, explicou a delegação do Governo de Melilla numa declaração escrita na qual acusa os migrantes de terem lançado pedras contra os agentes e de ter danificado vários veículos da Guarda Civil.
A Cruz Vermelha atendeu três migrantes “com ferimentos leves, contusões e pequenos cortes”, disse um porta-voz da organização não governamental no enclave de Melilla.
A mais recente tentativa de entrada em massa em Melilla ocorreu em Outubro do ano passado, quando uma centena de migrantes africanos conseguiram cruzar a tripla cerca fronteiriça, de 12 quilómetros de comprimento.