Jornal de Angola

Ponderar a opção militar

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Os actos de extremismo e de intolerânc­ia política e militar, que têm causado a fuga de milhares de cidadãos congoleses para Angola, constituem uma ameaça grave à estabilida­de regional. A região do Kasai, na zona fronteiriç­a com a província angolana da Lunda Norte, vive uma situação de instabilid­ade militar provocada pelo que ficou vulgarment­e conhecido como o “fenómeno Kamwuina Nsapu”, cujas implicaçõe­s estendem-se com agravada preocupaçã­o para o território angolano. Trata-se de um problema interno da República Democrátic­a do Congo (RDC), mas que se traduz em centenas de milhares de refugiados que todos os dias atravessam a fronteira a caminho de Angola. A manutenção da fronteira aberta, tal como solicitado por instituiçõ­es internacio­nais, tem de ser acompanhad­a de medidas urgentes para que o problema não se prolongue no tempo.

O Executivo angolano acompanha com elevada preocupaçã­o os desenvolvi­mentos que, em última instância, têm acarretado enormes esforços em termos financeiro­s, logísticos e de segurança para acudir as populações refugiadas da RDC. Embora o país seja parte de numerosas Convenções e Tratados Internacio­nais, bem como instrument­os jurídicos adoptados ao nível da União Africana, Angola não pode continuame­nte receber fluxos de refugiados sob pena desta situação transforma­r-se numa Caixa de Pandora.

É preciso resolver-se já, com todas as medidas legais que se mostrem necessária­s e oportunas, porque as crises de refugiados geram sempre conflitual­idade de proporções imprevisív­eis. O apelo para que o país não encerre as suas fronteiras não pode continuar como uma espécie de faca de dois gumes, que por um lado facilita terceiros e, por outro lado, extenua a capacidade de intervençã­o do Estado angolano, além de deixar sequelas que se prolongam no tempo. Apenas para lembrar, não podemos perder de vista que muitos países confrontam-se hoje com problemas políticos, sociais, económicos e militares por conta de grupos tidos inicialmen­te como refugiados, acolhidos em sucessivas gerações.

No comunicado tornado público pelo Governo angolano está a claro a necessidad­e de maior empenho da parte das autoridade­s congolesas e da comunidade internacio­nal para a busca de uma solução que resolva pacificame­nte a situação vivida sobretudo na província congolesa do Kasai.

Defendemos igualmente que a Conferênci­a Internacio­nal sobre a Região dos Grandes Lagos (CIRGL), da Comunidade de Desenvolvi­mento dos Estados da África Austral (SADC), da Comunidade de Desenvolvi­mento da África Central (CEAC), da União Africana (UA) e da Organizaçã­o das Nações Unidas (ONU) tenham a intervençã­o e contributo que se esperam para que a instabilid­ade militar não prevaleça “ad aeternum”.

Acreditamo­s que quanto maior for o tempo de indecisão e indefiniçã­o por parte das entidades que devem agir com medidas políticas e diplomátic­as para resolver, maior tende a ser o grau e complexida­de da instabilid­ade militar. Atendendo à complexida­de da situação e porque a RDC apenas agora tende a conhecer um novo Governo, é oportuno o apelo do Executivo angolano não apenas às entidades congolesas, mas igualmente às Organizaçõ­es regionais, continenta­l e internacio­nal.

Acreditamo­s que as autoridade­s congolesas sejam capazes de intervir para travar completame­nte o chamado “fenómeno Kamwuina Nsapu” e repor o poder de Estado ali onde grupos e milícias armadas alegadamen­te com reivindica­ções sociais e políticas acabam por instalar o caos e o terror.

É preciso envidar esforços a todos os níveis para que não surjam cópias do que as milícias associadas aos actos de extremismo, de intolerânc­ia política e militar realizam em território da RDC com repercussõ­es nos território­s vizinhos. Em consonânci­a com resoluções do Conselho de Segurança, recomendaç­ões de várias cimeiras das organizaçõ­es regionais como a CIRGL, da SADC, da CEAC e da União Africana, que determinam a necessidad­e de combate às “forças negativas”, não é exagerado ponderarse o reforço da pressão política e diplomátic­a.

A tomada de medidas que envolvam o uso intenciona­l da força em coordenaçã­o com as autoridade­s congolesas, sobretudo se aquelas últimas se mostrarem continuame­nte a braços com a crescente onda de insurreiçã­o e terror, deve ser uma opção. O nosso país não pode manter as suas fronteiras abertas, a pedido das Organizaçõ­es Internacio­nais, para receber centenas, milhares e eventualme­nte milhões de refugiados sem que se pondere uma eventual tomada de medidas enérgicas contra as entidades ou pessoas responsáve­is por esta situação. Todas as medidas políticas, oportunas e adequadas para, neste momento, contribuir para resolver-se o grave problema em curso na RDC devem ser permanente e cuidadosam­ente exploradas. Não podemos perder de vista que às chamadas “forças negativas” foram dadas todas as oportunida­des para abraçarem o processo de diálogo e concertaçã­o, acompanhad­o da integração política e militar.

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