Dívida à China é sustentável
TRANSFORMAÇÕES ESTRUTURAIS NO CONTINENTE Antigo sub-secretário da ONU Carlos Lopes acredita no desenvolvimento económico
O empréstimo chinês contraído por Angola, durante o “boom” do petróleo, representa um quarto de toda a dívida da China em África, afirmou sexta-feira, em Luanda, o antigo secretário da Comissão Económica para África e subsecretário das Nações Unidas, Carlos Lopes, quando dissertava sobre “As Transformações Económicas Estruturais que África enfrenta no século XXI”. Carlos Lopes admitiu que se Angola contraiu empréstimos numa altura em que o petróleo esteve em alta, pelas características do acordo, o país pode não sofrer com a actual baixa de preço.
Carlos Lopes, que considera a gestão da dívida um trabalho complexo e sofisticado, admitiu que se Angola contraiu empréstimos, numa altura em que o petróleo esteve em alta, pelas características do acordo, Angola pode não sofrer com essa baixa de preço. “Se for contraída em valores de mercado e em dólares, a desvalorização da moeda e a inflação podem fazer com que a dívida aumente. Já se for contraída a contravalores e volume de petróleo, paga-se menos”, esclarece.
Na conferência organizada pelo Banco Nacional de Angola (BNA), Carlos Lopes considerou que os indicadores macroeconómicos da dívida de Angola estão a subir consideravelmente, o que pressupõe o aumento do valor da dívida no mercado.
O economista diz que os indicadores básicos mostram que a dívida de Angola está no patamar dos 70 mil milhões de dólares. Durante a apresentação, o actual professor da Universidade de Cape Town e visitante da Oxford Martin School mostrou-se sempre optimista, com o futuro de África tendo em conta as três mega tendências, nomeadamente, as variáveis demográficas, tecnológicas e climatéricas que oferecem enormes oportunidades para o continente, se forem bem utilizadas. Carlos Lopes avançou que a diversificação é feita pensando na procura interna, numa altura em que as indústrias extractivas em África empregam apenas um por cento das populações locais, o que representa apenas seis por cento do Produto Interno Bruto (PIB) africano. “O Quénia é, por exemplo, um país líder no mundo de transacções bancárias móveis, graças à existência de uma política de apoio às empresas estatais e de tecnologias naquele país e por ter um ambiente de criação empresarial jovem”, disse o também antigo secretário da Comissão Económica das Nações Unidas (ONU) para África, que apela para a aposta na economia do futuro. “A população africana é muito jovem, a janela desta oportunidade é muito pequena para o futuro, porque vai haver robotização e automatização. Se África não fizer o mesmo com rapidez, vai perder esta oportunidade”, referiu.
O continente africano pode sair da dependência das matérias-primas, se apostar fortemente na instalação da indústria para transformar os bens produzidos ou extraídos do seu solo e vendê-los como acabados ou semi-acabados ao mercado.
Devido à dependência às matérias-primas, a economia africana ressente-se da volatilidade dos preços no mercado internacional, o que em muitos casos provoca défices de tesouraria e outras dificuldades macroeconómicas.
Para o antigo sub-secretário das Nações Unidas, o continente pode diversificar a sua economia, produzindo as mesmas coisas . “Tem de fazer uma transformação do tecido e estruturas económicas para poder modernizar a economia, passar de baixa para alta produtividade, num contexto difícil mais possível para África”, referiu. Carlos Lopes disse que a reestruturação da economia africana passa por uma base estatística das economias e uma planificação estratégica, que permita grandes mudanças, na forma como se fazem as políticas económicas para aumentar a produtividade. Para isso, é necessária uma planificação estratégica mais ampla e eficiente, com informação de qualidade nas duas séries estatísticas de um país (as contas nacionais e demográficas).
Dos 54 países africanos, apenas 12 têm contas em dia, sendo a Suazilândia o país mais organizado com a contabilidade nacional eficaz, o que ajuda este país da África Austral a fazer uma boa planificação económica . “Angola e outros países ainda estão muito atrasados neste contexto. Não temos estatísticas e dependemos sempre das projecções do Fundo Monetário Internacional (FMI). Nesses países, 60 por cento da população não tem registo de nascimento, e isso impede fazer uma planificação económica e da verdadeira transformação ligada à industrialização do continente”, disse.
Carlos Lopes, antigo sub-secretário da ONU e secretário da Comissão Económica das Nações Unidas (ONU) para África, foi considerado pela New African Magazine, em Dezembro de 2013, e como um dos 100 africanos mais influentes da lista anual da Jeune Afrique (2015). É bissau-guineense, filho de caboverdianos da ilha do Fogo.