Os partidos e as listas
O nosso formato político e institucional, por via do qual as formações políticas se organizam para se inscreverem junto do Tribunal Constitucional para participarem das eleições gerais, requer a elaboração e submissão de listas em que sobressaem claramente o número um e dois, respectivamente candidato a Presidente e a Vice-Presidente da República.
Trata-se de um processo normal, cuja experiência demonstra a solidez, estabilidade da democracia angolana e constitui-se inclusive como pressuposto fundamental para a importante disciplina partidária. Afinal, atendendo à nossa realidade e sem prejuízo para as contribuições das chamadas figuras independentes, é normal que os partidos políticos tenham as suas agendas. E como os deputados não são eleitos através de listas uninominais, dificilmente se pode falar de figuras independentes para integrar as listas das formações políticas, salvo à partida. Uma vez integrante e eventualmente eleita deputada, a figura pública convidada deverá, na maioria das circunstâncias, despir-se da pseudo independência para obedecer obrigatória e naturalmente à estratégia e disciplina partidárias.
A elaboração das listas dos partidos políticos e todas as conversas à volta disso trouxeram à superfície uma realidade nova, a narrativa ligada às condições e exigências que certas figuras, ditas independentes terão exigido para fazer parte das mesmas. Atendendo ao desencontro de opiniões contra ou em defesa, tudo estava por se confirmar até à publicação das listas definitivas dos partidos políticos por parte da instância judicial que desempenha o papel de tribunal eleitoral.
A partir de ontem, foram tornadas públicas inicialmente as listas dos partidos políticos que vão concorrer às Eleições Gerais, marcadas para o dia 23 de Agosto. E, embora naturalmente os mandatários das candidaturas tenham, de acordo com a lei, 48 horas para após a publicação inicial impugnarem a regularidade do processo ou a elegibilidade de qualquer integrante da lista, na verdade, muitas dúvidas acabaram dissipadas com a publicação já feita. Vale a pena lembrar o período que antecedeu a tudo isto, nomeadamente o processo de elaboração das listas em que o debate promovido por algumas figuras empobreceu mais o debate político angolano. Esperava-se que as figuras ditas independentes que foram convidadas ou instadas a fazer parte das listas de alguns partidos partilhassem mais a visão ou agenda que, dentro dos partidos, levariam para o Parlamento na eventualidade de eleição a deputado.
Testemunhámos um debate pobre, inclusive com figuras com algum percurso na vida política, que preferiram partilhar pelas redes sociais as exigências que fizeram para integrar as listas em detrimento do que eventualmente pretendem levar como propostas.
Embora seja um direito que assiste a qualquer figura pública fazer algumas exigências para constar de uma lista partidária, pareceu e continua a parecer desonesto e condenável vir a público dizer as exigências que foram feitas para fazer parte desta ou daquela lista.
Vir a público dizer que se exigiu a colocação numa posição de elegibilidade na lista às eleições gerais dá claramente a ideia de que se pretende estar na política apenas por puro aproveitamento e oportunismo.
Acreditamos que os partidos, sobretudo aqueles que acabaram por fazer “acordos de cavalheiro” com as ditas figuras públicas ou independentes desceram também abaixo dos níveis que deles se esperava, independentemente do direito que lhes assiste no recrutamento de integrantes das suas listas. É muito questionável que as formações políticas e coligações tenham aceite integrar ou recrutar figuras para as suas listas que, comprovadamente, aceitaram apenas sob a condição de virem a ser eleitos.
Fazer política não se compadece com aproveitamentos e oportunismos e era bom que nas conversas e entendimentos para integrar as listas predominasse o contributo como futuro deputado em detrimento de publicações sobre as condições e posições numa determinada lista. Era bom que a sociedade angolana fosse poupada de “acertos” que, seguramente, ficavam bem no domínio privado dos partidos e das respectivas figuras. Os eleitores pretendem saber o que é que essas figuras ditas independentes vão proporcionar como contributo para melhorar a democracia, para melhorar a vida e o bem-estar da população.
Insistimos que é sobre este, entre outros assuntos sérios ligados à vida parlamentar, que pretendíamos ver amplamente debatidos, nomeadamente o papel que esperam desempenhar como representantes do povo, como legisladores e como fiscalizadores da actividade governativa, entre outros. Esperamos não vir a ser surpreendidos, pelas figuras ditas independentes, com propostas de discussões no Parlamento que incidam mais sobre o parque automóvel pessoal, subsídios de atavio e viagens, entre outras matérias, numa proporção inversa à dos problemas da população.
Em todo o caso, saudamos os partidos políticos e a coligação que souberam, dentro dos prazos previstos, formalizar as suas candidaturas de deputados para as Eleições Gerais de 23 de Agosto junto do Tribunal Constitucional.