Contradições políticas insanáveis
Acerca de dois meses e meio da ida às urnas são cada vez mais fortes, infelizmente, os sinais de que muito dificilmente o principal partido da oposição conseguirá encontrar os caminhos certos para sair da teia de contradições onde se envolveu.
A razão fundamental para esta previsibilidade é que está claramente a sentir enormes dificuldades em acertar uma estratégia política suficientemente sólida para motivar a opinião pública nacional e a sua massa de apoiantes e em encontrar os protagonistas adequados para darem do partido uma imagem inclusiva e de empenhamento na discussão dos grandes temas nacionais, aqueles que, verdadeiramente, preocupam os eleitores.
Como se não bastasse toda a confusão que vem criando com as suas sucessivas críticas a tudo e a todos os que estão envolvidos, directa ou indirectamente, no processo eleitoral, a UNITA mostrou no passado fim-desemana a sua inabilidade para gerir a manifestação popular que resolveu convocar, num audacioso e fracassado teste à sua capacidade mobilizadora de massas, dando de si mesma uma imagem de desorganização que não ajuda a credibilizar e a fazer passar as ideias que diz ter e com as quais julga poder seduzir o eleitorado ao ponto de chegar ao poder.
Esta manifestação, convocada no pleno exercício das liberdades democráticas em vigor em Angola, parece ter apanhado a própria UNITA de surpresa – apesar de curiosamente a ter convocado – dada a forma como os seus principais dirigentes nela participaram e a nulidade que ela teve para aquilo que o partido pretendia: forçar a Comissão Nacional Eleitoral a rever algumas das suas decisões.
Mas esta é, apenas, uma das muitas contradições e confusões com que o principal partido da oposição se debate, todas elas tendo um único alvo: as eleições. Ou seja, todos os argumentos parecem servir para denegrir o processo eleitoral, mesmo que para isso tenha que haver recurso a argumentos perfeitamente contraditórios, e fazer com que as eleições não se realizem na data já definida e aceite pelas restantes candidaturas.
O último desses argumentos teve aliás uma cobertura mediática extraordinária e surgiu durante a cerimónia de votação para definir as posições que os diferentes partidos concorrentes irão ocupar no boletim de voto e qual a grelha para os tempos de antena da rádio e da televisão.
Nessa cerimónia, transmitida em directo pelos canais nacionais, o pretexto encontrado foi a contestação por uma das bolas que iriam definir a ordem dessas posições pesar ligeiramente mais que as outras, ficando sem se saber se isso era bom ou mau para o partido, neste caso o MPLA, a quem correspondia essa mesma bola. O importante, sim, era criticar.
São cenas como esta que não ajudam a credibilizar quem as protagoniza e muito menos servem para que o autor se imponha por aquilo que deveria ser a sua única preocupação: o discurso político, na completa acepção da palavra, simples e directo.
Mas as contradições políticas, que parecem insanáveis no seio do principal partido da oposição e no que a este processo eleitoral dizem respeito, já vêm de longe, praticamente desde que se começou a falar das eleições deste ano.
Uma das grandes linhas de força na estratégia da UNITA era a de sublinhar a “imperiosa necessidade” do Presidente José Eduardo dos Santos abandonar a Cidade Alta. Para isso, criou a sua “agenda da mudança”, um documento de que se conhecem apenas alguns tópicos e que são claramente insuficientes para que alguém possa ver nela um documento fiável para merecer o seu voto. O problema, e aquilo que representa talvez a maior contradição da UNITA, é que para que o Presidente José Eduardo dos Santos abandone a Cidade Alta é preciso que haja eleições. Eleições que, pelo que se tem visto, a UNITA quer protelar no tempo obrigando assim a que o actual Presidente da República permaneça no poder.
Outro dos objectivos da UNITA era que o Ministério da Administração do Território entregasse à Comissão Nacional Eleitoral a gestão de todo o processo conducente ao voto. Acontece que quando o MAT entregou à CNE esse processo, no seguimento do que havia sido aprovado na Assembleia Nacional, passou esta entidade a ser o alvo preferido das suas críticas.
Todas estas manobras, a par dos ataques feitos à Comunicação Social, deixam perceber que existe uma tentativa desse partido em instrumentalizar órgãos e entidades independentes. Isto, para um partido que aspira chegar ao poder, é no mínimo preocupante, pois deixa perceber aquilo que assim seria o seu comportamento e estilo de governação.
É importante sublinhar que este comportamento do segundo maior partido angolano se repete em cada ano de eleições. A única diferença é que deixou de ter o alvo principal das suas críticas: o Presidente José Eduardo dos Santos. E essa diferença mais fácil deixa perceber o vazio político que emana do seu discurso, pois ao perder um alvo previamente definido começou a atacar tudo e todos de modo incontido.
Isto talvez ajude a perceber o facto da actual direcção do partido estar muito longe de reunir um apoio consensual entre os seus principais militantes, conforme se pode perceber nalgumas intervenções públicas de alguns dos seus quadros que mais se distinguiram nas últimas décadas.
O grande problema que esta estratégia levanta é que a democracia angolana se vê privada de uma componente importante: uma oposição com argumentos políticos suficientemente fortes para ajudar o Governo a melhorar a sua gestão.
Uma oposição com uma postura participativa no debate sobre a melhor forma de se construir um país cada vez mais forte e capaz de vencer os desafios do futuro. Não uma oposição com um discurso caceteiro, ofensivo e que tenta manipular tudo e todos para tentar disfarçar as suas insanáveis contradições políticas que se desnudam a cada intervenção dos seus principais líderes.