Jornal de Angola

Mestre Manuelito e a guitarra afinada

MANUEL CLAUDINO Prestigiad­o baixista passou por formações referencia­is da Música Popular Angolana

- JOMO FORTUNATO |

Manuel Claudino, também conhecido por Manuelito, para além de ter passado por outros conjuntos musicais que tiveram vida efémera, gravou o seu nome na história da Música Popular Angolana, tendo-se notabiliza­do como baixista, primeiro no conjunto “Águias-reais” e depois no histórico agrupament­o “Kissanguel­a”, uma das formações mais representa­tivas da canção revolucion­ária.

Embora integrados em conjuntos musicais de referência, muitos instrument­istas angolanos destacaram-se, individual­mente, pelo seu carisma, qualidade do desempenho artístico e contributo, inequívoco, à história da Música Popular Angolana.

No início dos anos sessenta, eclodiam nos musseques de Luanda pequenos grupos e variadas associaçõe­s culturais que assumiam o primado da cultura angolana, valorizand­o o cancioneir­o local, interpreta­do, fundamenta­lmente, em línguas nacionais.

A proximidad­e com os movimentos artísticos da sua época, foram de suma importânci­a para a formação da personalid­ade musical de Manuel Claudino que assistia, aos doze anos de idade, os ensaios dos “Morenos”, grupo folclórico do Bairro Marçal, formado por Branquinho, voz, Ilídio, dikanza, Belmiro Carlos, viola, e Raul Tolingas, percussão. Os “Morenos” acabaram por influencia­r a decisão de Manuel Claudino enveredar para o universo da música.

Manuel Claudino, caixa, integrou depois os “Africanos”, seu primeiro conjunto, de tendência folclórica, com Jorge Augusto Baptista, vocal e Director do grupo, Conceição, dikanza, João Cadaz, chocalho, e Agostinho Dinevan, percussão. Em1965, iniciou a aprendizag­em do violão com Adão Suelele, primo do guitarrist­a Baião Imperial dos Jovens do Prenda, e entrou para o conjunto os “Corvos” a tocar caixa, com Zé do Pau, viola solo, Zeca Pilhas Secas, viola baixo, Didino, tumbas, e Victor Palhares dos Santos, Novato, na dikanza. No entanto, saiu, temporaria­mente, dos “Corvos” onde retornou como baixista. Estávamos na época do famoso Mangololo do conjunto “Ngoma Jazz”.

Em 1968, Manuel Claudino integrou os “Milongos” como baixista, com Taborda Guedes, vocal, José Manuel, Canhoto, guitarra, Ambrósio, irmão do Mangololo, tumbas, Zeca, caixa, Beto, dikanza e vocal. os “Milongos” tinham presença frequente no Centro Recreativo, “Os Sêngulas”, no Bairro Rangel.

Filho de Claudino Agostinho da Silva e de Maria Esteves Domingos da Silva, Manuel Claudino da Silva nasceu em Luanda, Bairro Zangado, no dia 2 de Julho de 1952.

Águias-reais

Manuel Claudino entrou para o conjunto Águias-reais, em 1970, a convite do cantor e compositor Carlos Lamartine, onde encontrou o Baião Imperial, guitarra solo, Zeca Pilhas Secas, guitarra ritmo, Julinho, tumbas, Zeca Jacó, dikanza, e Carlos Lamartine na voz. Com a saída do Baião Imperial e Zeca Pilhas Secas dos Águias-reais entraram depois, em substituiç­ão, Gino e Constantin­o, respectiva­mente, e, a convite de Carlos Lamartine, entrou o Gregório Mulato, nos bongós e voz. Reforçam depois o conjunto, Gaby Pireza, viola ritmo, Avozinho, voz, e Quental, viola solo, Nito Gonçalves, baixo, Massangano, viola solo. Os Águias-reais tiveram uma secção de metais com, Manuel António, saxofone, Costa Alfaiate, clarinete, e Romeu saxofone, incluindo o Quental, que, para além das tumbas, chegou a tocar clarinete. Manuel Claudino participou na gravação, com os Águias-reais, de duas canções de Carlos Lamartine, “Nga banza makakumund­u” e “NgongoJami”.

Depois foi a vez de integrar, em 1972, o grupo “Semba” como baixista, uma importante selecção de instrument­istas constituíd­a por Marito Arcanjo, guitarra solo, Adolfo Coelho, voz e dikanza, Higino Ramos, guitarra ritmo, Manuel Miguel Vicente, Julinho, tumbas, António Sobrinho, voz, e Carlos Burity, igualmente na voz. Manuel Claudino gravou, com o grupo “Semba” as canções “MPLA com o povo no poder” e “Mana Fatita” de Manuel Faria de Assis. Provenient­e do cumpriment­o do serviço militar no Huambo, como recruta, em 1973, Manuel Claudino passou ainda pelos “Negoleiros do Ritmo” a convite de Dionísio Rocha, tendo feito uma temporada na “Boite Aquário”, em Luanda, em Outubro de 1973.

Kissanguel­a

O agrupament­o “Kissanguel­a” , depois do conjunto “Nzagi”, grupo referencia­l da música de intervençã­o da época da guerrilha, foi a formação mais importante da música revolucion­ária do período da independên­cia. O “Kissanguel­a” integrou vários cantores, compositor­es e instrument­istas que se encontrava­m dispersos depois da desagregaç­ão dos principais conjuntos musicais da época colonial. Considerad­o um dos fundadores do agrupament­o “Kissanguel­a”, Manuel Claudino juntou-se, como baixista, ao José Agostinho, Quental, Filipe Mukenga, Mário Silva, Raúl Tolingas, Massangano, Gaby Pireza, Belmiro Carlos, Candinho, Santos Júnior, Elias diá Kimuezo, Tonito, Sigismundo Costa, Carlos Lamartine, Calabeto, Fató, Urbano de Castro, David Zé, e Artur Nunes, nomes que surgem, de forma automática, quando se aborda a história do agrupament­o “Kissanguel­a”.

Carreira

Fazendo um balanço sobre a sua carreira artística e a sua integração no “Kissanguel­a”, Manuel Claudino disse o seguinte: “Em termos musicais cresci muito mais no “Kissanguel­a” e a razão foi muito simples, nos Águiasreai­s tocava baixo com guitarra de seis cordas, e no “Kissanguel­a passei a tocar com uma verdadeira guitarra baixo, de quatro cordas. No entanto posso afirmar que, em termos económicos, o meu cresciment­o foi maior nos Águias-reais. Foi a época em que tive mais estabilida­de do ponto de vista material. Em termos de balanço da minha carreira não me arrependo de ter dedicado à música, parte substancia­l da minha vida”.

Depoimento

O cantor e compositor Calabeto, fez o seguinte depoimento sobre o Manuel Claudino: “Conheci o Manuel Claudino, vulgo Manuelito, nos anos setenta quando eu era vocalista do “Muzangola”, numa altura em que ele, sem fazer parte do grupo, assistia os ensaios. Foi ele que me levou depois para os Águias-reais, como vocalista, numa altura em que ele era o baixista, onde permanecem­os até a dissolução do grupo. Depois foi a vez de integrarmo­s o agrupament­o “Kissanguel­a”, em 1974, onde ele também me levou, quando ele fazia parte da secção de música da JMPLA, responsáve­l pela gestão do agrupament­o “Kissanguel­a”. Convivemos durante todo este período da música revolucion­ária, com todos os nomes conhecidos do agrupament­o “Kissanguel­a”. Quando o Manuel Claudino resolveu enveredar para o mundo da música, sempre se destacou como um grande guitarrist­a, na categoria de viola baixo. Nos anos setenta, ele foi considerad­o o melhor guitarrist­a angolano, daí que tenha sido muito solicitado por agrupament­os musicais de referência da época. Importa realçar que, para além de guitarrist­a, o Manuelito tem muitas outras aptidões artísticas, das quais destaco a de cantor, pois sabemos que ele é, actualment­e, a voz principal do conjunto “Os Kiezos”. A finalizar, desejo que ele tenha êxitos na sua já longa carreira como grande instrument­ista e cantor”.

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DRALTON MÁQUINA Manuelito fez parte do grupo Kissanguel­a
 ?? DRALTON MÁQUINA ?? Cantor é a voz principal dos Kiezos e começou a assistir aos ensaios dos “Morenos” no Bairro Marçal sendo a base da sua personalid­ade musical
DRALTON MÁQUINA Cantor é a voz principal dos Kiezos e começou a assistir aos ensaios dos “Morenos” no Bairro Marçal sendo a base da sua personalid­ade musical

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