O desafio dos refugiados
Comemorou-se ontem em todo o planeta o Dia Mundial dos Refugiados, um facto que serve para reflexão e tomada de consciência sobre um problema que afecta milhares de milhões de pessoas.
Num dia como o de hoje, as Nações Unidas prestam homenagem a milhares de mulheres, velhos, crianças e jovens forçados a deixar as suas casas e os seus países por causa de guerras, perseguições e violações generalizadas de direitos humanos.
O problema do refugiado constitui hoje um desafio para todo o mundo, contrariamente à ideia de que se trata de um assunto que envolve apenas os países de partida, os de trânsito e os de eventual destino. Os refugiados em todo o mundo representam uma adversidade social de dimensão mundial que precisa de ser devidamente administrada.
Além desta triste realidade, há ainda o grave problema dos deslocados internos que, ultimamente, contribuem para esforços acrescidos por parte dos Estados na criação de condições para o devido realojamento. Em África, a situação dos refugiados é complexa e problemática na medida em que o continente vive ainda numerosos casos de instabilidade política e militar, inter-Estados e inter-estadual, que provocam milhares de refugiados e deslocados. Embora tenha reduzido substancialmente o número de refugiados directamente resultante de conflitos militares envolvendo Estados, hoje, milhares de pessoas fogem dos seus países por causa de problemas internos. Do norte de África que, ultimamente serve como uma espécie de porta completamente aberta, a partes da África Subsaariana, milhares de famílias africanas têm sido forçadas a deslocar-se, com todas as consequências económicas, sociais, humanitárias e, algumas vezes, políticas.
A União Africana, os seus órgãos e os Estados africanos devem continuar a trabalhar para estabelecer mecanismos de controlo e prevenção das condições adversas por que passam numerosos refugiados. A implementação das convenções e protocolos ligados ao tratamento das questões ligadas aos refugiados devem continuar a merecer atenção e tratamento por parte das lideranças africanas. Não há dúvidas de que a condição de refugiado já é, em si mesma, uma situação extremamente difícil, quer pelas perdas que provoca, quer pela possibilidade de começo a partir do zero. No fundo, ser refugiado em todo o mundo e sobremaneira nas regiões com maiores carências contribui para o aumento do empobrecimento das famílias e para esvaziar os cofres de vários Estados.
Com excepção da região central de África em que, por razões ligadas à instabilidade política e militar na RDC, milhares de famílias viram-se na condição de refugiados, esta é das regiões mais estáveis do continente africano. Angola vive uma situação menos boa na sua fronteira nordeste com a República Democrática do Congo (RDC) por causa da instabilidade militar interna provocada pela rebelião armada de milícias armadas com catanas e paus que têm causado a travessia desordenada da fronteira comum. Fazendo jus à condição hospitaleira e solidária do povo angolano, bem como respondendo ao apelo das Nações Unidas para manter “as portas abertas” para os congoleses, a República de Angola não cruzou os braços.
Hoje, temos milhares e milhares de congoleses, alojados em locais, dentro do nosso país, felizmente com a mais imediata e vital garantia de segurança, acomodados em locais seguros e livres de ataques.
Embora não seja fácil, reconhecemos claramente o papel acolhedor que a RDC teve na recepção de milhares de famílias angolanas nas décadas de 40, 50 e 60 do século XX, quando se refugiaram naquela antiga colónia belga para fugir do tratamento desumano do poder colonial português. Temos plena memória de período difícil para milhares de famílias que tinham deixado para trás as suas aldeias, os seus haveres, numa travessia fronteiriça em que se perderam muitas vidas.
Como demonstra a experiência humana e fruto do ditado popular segundo o qual “hoje são eles, amanhã seremos nós”, hoje, reconhecemos o papel que os nossos irmãos congoleses tiveram na recepção de milhares de angolanos. E, por isso, estamos conscientes dos desafios que pairam sobre os ombros da população angolana com a recepção de milhares de congoleses que fogem da morte e da destruição espalhadas pelas milícias Kamuína Nsapu. Acreditamos que se trata de uma situação passageira, na medida em que as autoridades congolesas procuram a todo o custo repor o poder de Estado em regiões dentro da província do Cassai Central e Oriental.
Em todo o caso, defendemos claramente que as autoridades angolanas devem tomar todas as medidas para que as incursões de membros das milícias Kamuína Nsapu, junto da fronteira comum, sejam rechaçadas militarmente. Os angolanos estão dispostos a enfrentar mais um desafio ao lidar com a condição de refugiados por que passam milhares de irmãos forçados a atravessar a fronteira comum.
Esperamos que os Estados africanos continuem a privilegiar a diplomacia, o diálogo e a concertação para tornar a situação do refugiado africano não necessariamente como um problema ou um fardo, mas como um desafio.