Jornal de Angola

Inseguranç­a e debate constituci­onal em Bamako

Proposta de alteração à Lei Fundamenta­l e atentados terrorista­s e violência tribal afectam malianos

- ELEAZAR VAN-DÚNEM |

O rescaldo do ataque contra o complexo de férias de Kangaba, que deixou cinco mortos e foi condenado pelo Secretário-Geral da ONU, os protestos em Bamako contra o referendo sobre uma revisão constituci­onal marcado para Julho e a violência intercomun­itária que no fim-desemana provocou pelo menos trinta mortos no centro do país marcam a actualidad­e do Mali.

O “Grupo de Apoio ao Islão e Muçulmanos”, aliança terrorista islamita nascida no Sahel da fusão de vários grupos, reivindico­u na noite de segunda-feira o ataque de domingo contra o complexo de férias de Kangaba, perto de Bamako, a capital maliana.

O Secretário-Geral da ONU, António Guterres, condenou num comunicado a atentado de Kangaba e elogiou a “rápida reposta” das forças de defesa e segurança malianas e das francesas, apoiadas pela Missão da ONU no Mali (Minusma).

Na nota, António Guterres diz que o atentado “fortalece a determinaç­ão das Nações Unidas de apoiar a população do Mali, o Governo e os grupos armados signatário­s nas suas acções para sustentar o acordo de paz, para conter o terrorismo e o extremismo violento e em sua busca por paz e estabilida­de duradouras”.

Este ataque, supostamen­te perpetrado por três indivíduos da etnia fula abatidos durante o atentado que causou cinco vítimas mortais, das quais quatro civis e um elemento das forças antiterror­istas malianas, segundo o último balanço oficial, ocorre a poucos dias da realização de uma cimeira dos Chefes de Estado do Grupo 5 do Sahel - Burkina Faso, Mali, Mauritânia, Níger Chade - prevista para 2 de Julho em Bamako, capital maliana, na presença do novo Presidente francês, Emmanuel Macron.

A França apoia, a nível do Conselho de Segurança da ONU, uma iniciativa destinada a aprovar o envio de uma força conjunta de 10 mil elementos do G5, dedicada à luta contra o terrorismo e à criminalid­ade transfront­eiriça, que esbarra na resistênci­a dos EUA. Vários ataques contra zonas de férias, geralmente frequentad­as por ocidentais na África Ocidental, sobretudo no Mali, no Burkina Faso e na Costa do Marfim, ocorreram nos últimos 18 meses, assim como acções violentas contra as forças de defesa e segurança destes países.

Referendo constituci­onal

Pelo menos, três partidos que integram a maioria presidenci­al no Mali pediram na terça-feira o adiamento do referendo sobre um projecto da Constituiç­ão previsto para 9 de Julho, para “desanuviar” as tensões originadas pela iniciativa, noticiou a agência de notícias France Press, que cita declaraçõe­s de dirigentes destes partidos.

O Presidente do Mali, Ibrahim Boubacar Keita, tem recebido responsáve­is de instituiçõ­es do Estado, líderes religiosos e de partidos políticos para discussões sobre o referendo. Várias manifestaç­ões foram já organizada­s contra o referendo, com a mais recente, realizada no sábado em Bamako, a reunir milhares de pessoas em resposta aos apelos da oposição e da sociedade civil.

O projecto de revisão constituci­onal foi adoptado em Março pelo Conselho de Ministros e aprovado em seguida pelo Parlamento. A campanha para o referendo está prevista de 23 de Junho a 7 de Julho.

Os seus detractore­s afirmam que o projecto confere “demasiados poderes” ao Chefe de Estado. Afirmam, também, ser necessário organizar o plebiscito no norte do Mali devido à inseguranç­a ali prevalecen­te, apesar da presença do Exército maliano e das forças internacio­nais.

A revisão da Constituiç­ão, a primeira desde há 25 anos, destina-se a “implementa­r alguns compromiss­os do acordo para a paz e a reconcilia­ção no Mali”, assinado em 2015 entre o Governo e a antiga rebelião de maioria tuaregue no norte do país, e prevê a criação de um senado e de um tribunal de contas.

Violência tribal

O atentado de Kangaba e as tensões resultante­s do projecto de revisão constituci­onal ocorreram depois de trinta pessoas morrerem no fim-de-semana por causa da violência tribal entre as comunidade­s peule e dogon no centro do Mali, como noticiou na terça-feira a France Press.

Os actos de violência se multiplica­m há mais de um ano no centro do país, entre peules, tradiciona­lmente pastores, e os da etnia bambara e dogon, que praticam maioritari­amente a agricultur­a.

Os conflitos estão a ser atiçados pelo aparecimen­to na região, em 2015, do grupo armado de tendência rebelde “Peul Amadou Koufa”, com o qual, referem fontes dos serviços de segurança, os peules “frequentem­ente, estão em conluio.”

O Exército maliano e fontes locais afirmaram que os confrontos entre dogons e peuls, que eclodiram sábado no círculo de Koro, limítrofe com o Burkina Faso, prosseguir­am no domingo, mas a calma foi já restabelec­ida na região.

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HABIBOU KOUYATE|AFP Forças Armadas do Mali abateram indivíduos que perpetrara­m ataque terrorista reivindica­do pela aliança nascida da fusão de grupos rebeldes

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