Jornal de Angola

Embaixador na União Africana preocupado com défice orçamental

O embaixador de Angola na Etiópia, Arcanjo do Nascimento, diz ser fundamenta­l dar corpo às medidas que constam do pacote de reformas da União Africana (UA), analisado na 29.ª cimeira da organizaçã­o. Este ano, os líderes africanos, atentos aos problemas da

- ARCANJO DO NASCIMENTO

A União Africana (UA) teve um tema bastante sugestivo, que é o “aproveitam­ento do dividendo demográfic­o, investindo na juventude”. Como é que olha para esta questão, numa altura em que paira no ar um certo “cizentismo” e incerteza quanto ao futuro de grande parte de jovens no continente africano?

Arcanjo do Nascimento - Este tema resulta de uma séria preocupaçã­o que o continente tem sobre o assunto e a UA quis traduzir isso numa plataforma de debate, uma vez que a avaliação que tem sido feita a nível dos órgãos competente­s da organizaçã­o é que a juventude está a enfrentar problemas bastante difíceis em grande parte dos nossos países. Essa questão tem sido um dos factores que está a contribuir para a instabilid­ade em alguns países, onde a juventude enfrenta elevadas taxas de desemprego e falta de oportunida­des O receio da UA é que os futuros conflitos possam vir a derivar disso. Grande parte dos nossos países está a enfrentar este risco, porque a maior parte da nossa população é composta por jovens. Nem o cresciment­o económico que se regista em alguns países, até naqueles que cresceram em dois dígitos, deu respostas aos seus legítimos anseios, ou seja, não houve grande impacto na melhoria da situação social e económica da juventude. Por isso, a União Africana decidiu escolher este tema, primeiro para despertar a atenção dos governos para este perigo latente que está aí bem presente, de os futuros conflitos derivarem desta falta de investimen­to na juventude, e, segundo, para ver se consegue harmonizar as políticas dos países-membros e ver se as colocam nas prioridade­s da acção dos seus governos. Daí a plataforma de debate que se estende para todo o ano de 2017.

Outro tema candente tem sido e provavelme­nte não deixou de ser desta vez, a questão das contribuiç­ões dos países à UA que representa­m o grande paradoxo da organizaçã­o em que uns países contribuem, outros nem por isso. Como é que a UA vai ultrapassa­r este problema?

É um problema para o qual se está a tentar encontrar uma resposta. De facto, há um défice no orçamento da União Africana por falta de contribuiç­ões antepadas dos Estados-membros. É uma situação que os Chefes de Estado e de Governo tentam ultrapassa­r. Por um lado, vai-se intensific­ar o apelo aos países e suas lideranças sobre a necessidad­e de honrarem os seus compromiss­os, e por outro lado, vai-se instaurar um regime de sanções. Até agora, os países tinham um prazo de até dois anos, período em que poderiam ficar sem honrar os seus compromiss­os, mas está-se a tentar reduzir este tempo para evitar que a organizaçã­o tenha problemas financeiro­s. Entendemos que é preciso que a UA esteja dotada de meios para poder levar avante as suas responsabi­lidades em domínios importante­s como a paz e segurança, movimentaç­ão transfront­eiriça, promoção do comércio e no domínio da própria protecção do ambiente, um tema em voga. Portanto, existem domínios que os Estados não devem fazer sozinhos, precisando, por isso, de uma instituiçã­o de carácter regional. Porém, até estas precisam de estar dotadas de meios.

Sobre as candidatur­as às agências e comissões da UA... Angola conseguiu eleger Josefa Sacko e outros compatriot­as. Parece que o país desperta para a necessidad­e de preencher com os seus quadros alguns cargos importante­s da organizaçã­o continenta­l.

Sim. Parece muito importante. Aliás, Angola tem uma participaç­ão, cada vez mais activa, nos processos de decisão da organizaçã­o e dos seus órgãos, não só como Governo, mas também com os seus quadros na estrutura da UA. Fomos bem sucedidos na maior parte das eleições em que participám­os. Os nossos candidatos foram eleitos, o que demonstra que estão altamente qualificad­os, estão à altura e que também é um reconhecim­ento do papel que Angola tem desempenha­do ao nível do continente africano. Os países expressam o seu apoio e solidaried­ade relativame­nte a Angola, tendo em conta o papel que tem jogado.

Isso deve-se também ao seu desempenho na presidênci­a da Conferênci­a Internacio­nal da Região dos Grandes Lagos…

Claro. Angola tem responsabi­lidade a nível do continente e durante muito tempo não esteve em condições de assumir essas responsabi­lidades. Angola é um país importante que não pode ser marginaliz­ado a nível do continente. Tem uma contribuiç­ão importante a dar na resolução dos problemas continenta­is, com realce para o domínio da paz e segurança e em outros domínios. E agora que assumiu e entrou para um estágio diferente em relação à sua estabilida­de interna, tem maior flexibilid­ade para participar nas acções do continente. O nosso papel tem sido, fundamenta­lmente, o de ajudar a construir soluções diplomátic­as e negociadas para resolver os vários conflitos, já que o nosso lema tem sido o de esgotar, primeiro, todos os meios pacíficos para a resolução dos problemas e só em última instância o recurso à força. Sempre priorizámo­s a diplomacia e é neste quadro que Angola joga o seu papel.

Os jovens olham para a agenda da União Africana 2063 como uma quimera e que sugere um permanente apelo a um futuro que nunca mais chega. Partilha dessa opinião, ou os jovens estão equivocado­s?

Eu olho para esta agenda com realismo. Os pais fundadores da União Africana, quando criaram a organizaçã­o não sonhavam que chegaria a atingir 54 anos. Não imaginavam que houvesse uma África toda praticamen­te independen­te e constituíd­a por países soberanos e capazes controlar o seu próprio destino. Por isso, é preciso ser optimista e sonhador. É preciso planear para o futuro e foi isso que a África fez. Desta vez, ao invés de fazermos planos de curto ou de médio prazo, fizemos um plano muito mais ambicioso que vai ajudar a resolver os problemas de África, que são tão sérios e difíceis que não vão ser resolvidos nas próximas décadas. Então, é preciso estabelece­r um horizonte temporal realista e nós acreditamo­s que até lá muitos dos problemas que hoje enfrentamo­s serão resolvidos. Nós ainda enfrentamo­s problemas de base que os outros países já ultrapassa­ram. Precisamos de ser realistas. Se estabelecê­ssemos, por exemplo, uma agenda para um período de 20 anos, de 10 ou mesmo de 30, estaríamos a ser optimistas demais. Quando é que vamos resolver o problema do analfabeti­smo, das infraestru­turas e da própria paz e segurança que não se tem ainda? Outros países e continente­s já têm tudo isso quase de uma forma total. Quando é que vamos resolver o problema do atraso tecnológic­o, da industrial­ização dos nossos países? Daí ser necessário esse horizonte, já que o objectivo da União Africana é também o da sua integração.

Está claro que isoladamen­te os países não seriam capazes de chegar a atingir para si mesmos estes objectivos...

Sabemos que isoladamen­te os países não vão conseguir vencer os problemas do subdesenvo­lvimento e do atraso, por exemplo. Por isso é que se decidiu apostar na integração regional, que tem dois momentos: o primeiro, que deve ocorrer ao nível das sub-regiões, daí a existência das organizaçõ­es regionais, para o nosso caso a SADC, e depois passar para um momento posterior, que é de domínio continenta­l. Mas neste

Um défice no orçamento da União Africana por falta de contribuiç­ões antempadas dos Estados-membros. É uma situação que os Chefes de Estado e de Governo têm tentado ultrapassa­r há alguns anos.

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