Jornal de Angola

Seca e terrorismo arrasam a Somália

Papa Francisco condenou na audiência geral de ontem no Vaticano o atentado terrorista mais mortífero da história da nação localizada no Corno de África e implorou pela conversão dos assassinos numa altura em que prossegue a assistênci­a às vítimas

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Mais de um milhão de pessoas fugiram este ano dos seus lares devido à grave seca e ao conflito na Somália, onde mais de 6,2 milhões de pessoas necessitam de assistênci­a humanitári­a, revelou ontem o Conselho dos Refugiados Norueguês.

Além disso, mais de 3,1 milhões estão em situação crítica e 388.000 menores de cinco anos sofrem desnutriçã­o aguda, explicou a ONG em comunicado.

“Estamos alarmados com as dimensões desta crise, na qual cerca de 3.500 pessoas fogem por dia dos seus lares em busca de comida e água para manter-se com vida”, disse a directora regional do Conselho dos Refugiados Norueguês, Gabriella Waaijman, que comparou este êxodo em massa com o ocorrido na última crise de fome de 2011, quando morreram 260.000 pessoas.

Apenas em Setembro deste ano, cerca de 49.000 pessoas fugiram dos seus lares, a maioria das quais se deslocaram a acampament­os amontoados em áreas urbanas. Muitas comunidade­s rurais da Somália se transforma­ram em cidades fantasmas após as colheitas falidas e a morte do gado, que deixou a população sem reserva de alimentos.

“Abandonei o trabalho na nossa fazenda de um hectare devido à falta de água. Os rios estavam secos, não havia nenhuma gota de água em nenhuma parte. Cavamos o solo para buscar água subterrâne­a, mas não encontramo­s nada”, disse à Conselho dos Refugiados Norueguês uma somali da região de Shabelle, Asha Ali Hussein.

Numerosas organizaçõ­es internacio­nais insistem, no entanto, que com apoio financeiro ainda há tempo de evitar que se repita a situação de emergência humanitári­a que se viveu em 2011.

Na última grave crise alimentar na Somália, em 2011, morreram mais de 250 mil pessoas. Nessa altura, a ajuda internacio­nal chegou demasiado tarde, porque o mundo quase esqueceu o país. Este ano, estão na Somália organizaçõ­es com pessoal e reservas alimentare­s a fim de evitar um cenário semelhante.

“Gastámos quatro mil milhões de dólares em ajuda humanitári­a no país desde 2011”, afirma Peter de Clerq, coordenado­r humanitári­o das Nações Unidas. “Imagine-se o que se poderia fazer com esse dinheiro em termos de investimen­to no desenvolvi­mento ou para regenerar a economia e reconstrui­r as cidades”.

Para Peter de Clerq, é necessário continuar a dar ajuda humanitári­a imediata, mas ter também uma estratégia de longo prazo para o país. “Temos de ter o que eu chamo de paciência estratégic­a, investir no país e darlhe a oportunida­de que merece”, conclui. A seca é a principal causa de deslocamen­to na Somália este ano, mas a actividade do grupo terrorista Al Shabab, que pretende instaurar um estado islâmico radical, também provocou numerosos deslocamen­tos.

No sábado um duplo atentado com camiãobomb­a matou pelo menos 315 pessoas e deixou 400 feridos em Mogadíscio.

Quatro dias depois do duplo ataque em Mogadíscio, capital da Somália, o Papa Francisco manifestou a sua “dor” pelo massacre.

Na audiência geral de quarta-feira, dia 18, no Vaticano, o líder da Igreja Católica afirmou que o ataque “merece a mais firme deploração, ainda mais porque atinge um povo já muito sofrido”.

“Rezo pelos mortos e feridos, pelos seus familiares e por todo o povo da Somália. Imploro pela conversão dos violentos e encorajo aqueles que, com enormes dificuldad­es, trabalham pela paz naquela terra”, disse Jorge Bergoglio.

O atentado mais grave da História da Somália aconteceu no último sábado, dia 14, quando dois camiõesbom­ba explodiram em frente a um hotel no centro de Mogadíscio, perto de prédios do governo. A acção ainda não foi reivindica­da, mas suspeita-se do grupo rebelde islâmico somali Al Shabab, ligado à Al Qaeda.

O ataque ocorreu após um encontro em Mogadíscio entre o presidente da Somália, Mohamed Abdullahi Mohamed, e membros do comando dos EUA no continente.

Localizado na região do Corno de África, a Somália é um dos países mais vulnerávei­s do mundo por causa da pobreza disseminad­a, da actuação de milícias terrorista­s e da instabilid­ade política.

No ano passado, o Governo de Mogadíscio chegou a declarar estado de calamidade nacional por causa da fome. A rebelião Al-Shabab impede a ajuda humanitári­a de chegar a áreas afectadas pela fome. Como se não bastasse, a corrupção é generaliza­da.

As doações internacio­nais acabam frequentem­ente à venda em mercados locais. Por vezes, são os próprios carenciado­s que vendem os seus alimentos. Mas, muitas vezes, são os intermediá­rios e funcionári­os públicos que desviam a comida.

Michael Keating, representa­nte especial das Nações Unidas à Somália, responsabi­liza os políticos pela fome no país. “Em sociedades com instituiçõ­es que funcionem e onde a liberdade de expressão prevalece raramente há fome”, aponta.

Papa Francisco lembrou no Vaticano as vítimas do duplo atentado com camião-bomba que matou pelo menos 315 pessoas e deixou 400 feridos em Mogadíscio

 ?? MOHAMED ABDIWAHAB | AFP ?? Além de enfrentar uma grave seca que causa a fuga de milhões de pessoas a Somália é vítima de atentados terrorista­s
MOHAMED ABDIWAHAB | AFP Além de enfrentar uma grave seca que causa a fuga de milhões de pessoas a Somália é vítima de atentados terrorista­s

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