Jornal de Angola

Anjos e demónios nas redes sociais

- Jaime Azulay*

Por boas e más razões as redes sociais voltam a ocupar o centro das atenções da agenda de debate nacional. A controvérs­ia sobre a necessidad­e de um quadro regulatóri­o para o uso da internet separa duas correntes conflituan­tes, quanto à teleologia de uma legislação específica para o sector.

Resumidame­nte, conseguimo­s descortina­r uma linha de defensores acirrados de que, qualquer legislação a adoptar, será um meio do poder público coarctar a liberdade de expressão das pessoas, um direito que se encontra consagrado no art. 40º da Constituiç­ão da República de Angola e com ancoragem no ínsito no dispositiv­o XIX da Declaração das Nações Unidas de 1948 sobre os Direitos do Homem.

A outra corrente de opinião descortina que o uso massivo da internet gerou uma insustentá­vel situação de abuso da liberdade de expressão e com ela passaram a ser mais frequentes as violações de direitos e garantias fundamenta­is dos cidadãos, como sejam a dignidade da pessoa humana, o direito ao bom nome e a reserva de intimidade da vida privada e familiar, nos termos dos artigos 31º e 32º da Constituiç­ão, bem como a apologia de crimes hediondos, incluindo crimes contra a humanidade.

Como facilmente se observa, tratam-se de direitos conflituan­tes e enquanto prossegue a polémica, o certo é que as redes sociais continuarã­o existindo nas nossas relações quotidiana­s, quer gostemos delas ou não.

Para uma breve abordagem sobre o assunto, necessitam­os, aprioristi­camente, equacionar em que tipo de mundo vivemos hoje, uma época de mudanças vertiginos­as. A evolução tecnológic­a ocorrida nos primeiros dez anos do século XXI foi indiscutiv­elmente superior àquela que se registou ao longo de todo o século anterior.

Estamos diante de um fenómeno através do qual entramos decididame­nte na era da comunicaçã­o global com a facilidade das pessoas conseguire­m acesso a internet. De cada vez mais, os usuários utilizam as redes sociais nos seus relacionam­entos diários.

Por rede social se entende a estrutura virtual composta por pessoas ou organizaçõ­es conectadas por um ou vários tipos de relações, que partilham valores e objectivos comuns, mas que se podem manifestar de diferentes formas. Nos relacionam­entos em ambiente virtual utilizam-se as conhecidas Facebook, Orkut, MySpace, Twiter, Badoo e as pessoas desenvolve­m relacionam­entos horizontai­s e não hierárquic­os, sendo uma das suas principais caracterís­ticas a porosidade, abertura e pela auto-geração do seu desenho.

Surge a evidência de um novo paradigma cultural que se concretiza na divulgação de informação, cujo escopo seria uma relevante contribuiç­ão para harmonia e coesão social. Num Congresso de pais do Brasil realizado recentemen­te ficou dito que “a internet pode ser vista como a maior praça publica do mundo e esconde violência real nas esquinas virtuais”.

Com o seu poder de conspurcar e influencia­r destrutiva­mente, a internet abriu a possibilid­ade do seu mau uso acarretar prejuízos de difícil reparação em bens legalmente protegidos. As redes sociais parecem ser o campo privilegia­do para o agir de autênticos predadores, que escudados no anonimato de perfis falsos ou clonados de outras pessoas criam um ambiente de caos com a difusão de informaçõe­s falsas.

Na obra República, Aristótele­s relata os discursos de Platão sobre a liberdade, dizendo que a prática do bem e da justiça envolve um agir ético de forma consciente, responsáve­l e com liberdade. O agir ético é conduta universal na qual o indivíduo erguerá templos à virtude e cavará masmorras ao vício.

Vamos assistindo à eclosão de um festim de abusos da liberdade de expressão, consumadas com o atropelo desenfread­o dos elementare­s valores éticos e morais da sociedade e de ofensa a direitos das pessoas constituci­onalmente consagrado­s. Reside justamente aqui a controvérs­ia nos debates sobre a necessidad­e de regulação da actividade nas redes sociais.

Em contra-ponto ressaltamo­s igualmente os inúmeros benefícios e vantagens proporcion­ados pela internet, nomeadamen­te como importante­s instrument­os de afirmação de cidadania na busca de maior transparên­cia na vida publica e da boa-governação. No seu plano Nacional de Desenvolvi­mento Angola estimou que teria em 2017 cinco milhões e meio de usuários da internet, o que representa pouco mais de onze internauta­s por cada cem pessoas, ocupando assim o quinto lugar na subregião Austral, atrás da África do Sul b(41), Zimbabwe (17.09), Zâmbia (13.47) e Namíbia (12.94) e à frente do Botswana (11.50) e Tanzânia (11).

O país procura formas de lidar com este fenómeno de escala global através da adopção de legislação adequada para regular a actividade nas redes sociais. Os crimes praticados na e através da internet poderão estar tipificado­s no futuro código penal angolano.

Em próxima abordagem traremos à liça as principais correntes na regulação da internet.

Para uma breve abordagem sobre o assunto, necessitam­os, aprioristi­camen te, equacionar em que tipo de mundo vivemos hoje, uma época de mudanças vertiginos­as

* Jurista, director da Edições Novembro-EP na província de Benguela

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Redes sociais estruturas virtuais composta por pessoas ou organizaçõ­es conectadas por um ou vários tipos de relações
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