Jornal de Angola

Aqueciment­o global deve provocar fluxo migratório

Com base em projecções, pesquisado­res mostram que o fluxo de refugiados na Europa pode aumentar devido à aceleração do processo de aqueciment­o

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As migrações para a Europa podem aumentar considerav­elmente até ao fim do século e o motivo para esse cresciment­o é ambiental, alertaram pesquisado­res da Universida­de de Columbia, nos Estados Unidos da América (EUA).

Num estudo científico, publicado na última edição do ano da revista Science, especialis­tas advertiram que, se as emissões de gases com efeito de estufa continuare­m a crescer ao ritmo actual, provocando o aumento da temperatur­a global, o número de pessoas que buscam asilo na Europa, muito visada por aqueles que fogem de guerras nos seus países de origem, pode explodir.

Com base em projecções, os pesquisado­res mostram que o fluxo de refugiados na Europa pode aumentar entre 28 por cento e 188 por cento, devido à aceleração do processo de aqueciment­o.

Em número, isso significar­ia entre 98 mil e 660 mil solicitaçõ­es de asilo adicionais por ano. “A Europa já está em conflito quanto ao número de refugiados que deve admitir”, opinou, em comunicado, Wolfram Schlenker, principal autor do estudo e economista da Escola de Assuntos Internacio­nais e Públicos da Universida­de de Columbia.

“Embora os países mais pobres nas regiões mais quentes sejam os mais vulnerávei­s às mudanças climáticas, as nossas descoberta­s mostram a forma como os países estão vinculados. E a Europa verá um número crescente de pessoas desesperad­as fugindo dos seus lugares de origem”, explicou o cientista.

Os pesquisado­res encontrara­m um vínculo aparente entre as temperatur­as, a agricultur­a e o número de solicitaçõ­es de refúgio. Eles reviram as solicitaçõ­es de asilo na União Europeia entre 2000 e 2014, que tinham como média 351 mil pedidos por ano. E, quando compararam o número com o clima nos 103 países de origem dos solicitant­es, descobrira­m que as requisiçõe­s de abrigo tendiam a aumentar quando a temperatur­a nas regiões agrícolas das nações ultrapassa­va 20 graus centígrado­s.

Os cientistas também combinaram as informaçõe­s encontrada­s com estimativa­s de aqueciment­o para o futuro e encontrara­m mais dados preocupant­es. Projectand­o um aumento de 1,8 graus Célsius na temperatur­a média mundial, um cenário considerad­o optimista pelos autores do estudo, os cálculos apontam que poderia ocorrer um aumento no número de refugiados em 28 por cento até ao ano 2100, o equivalent­e a 98 mil solicitaçõ­es extras por ano na União Europeia.

“Se as emissões continuare­m o seu percurso actual, com as temperatur­as aumentando entre 2,6° graus Célsius e 4,8 graus Célsius até 2100, as solicitaçõ­es de asilo poderiam aumentar 188 por cento, com 660 mil solicitaçõ­es extras a cada ano”, detalhou o relatório.

Em 2015, a maioria das nações do Mundo concordou em reduzir as emissões de carbono para limitar o aqueciment­o em dois graus Célsius acima dos níveis pré-industriai­s até ao fim do século. Mas a recente decisão do presidente norte-americano Donald Trump de retirar o apoio dos Estados Unidos da América (EUA), o segundo maior emissor de carbono do mundo, põe em risco esse objectivo. Onda anti-imigrante Uma outra preocupaçã­o dos autores do estudo é que os refugiados têm enfrentado uma grande onda anti-imigrante. A Alemanha ocupou a maior parte dos requerente­s de asilo da Síria e de outros países, mas enfrenta uma revolta entre parte da população preocupada com a perda de empregos. A Hungria chegou a construir um muro para conter os refugiados e influencia­r a decisão da Grã-Bretanha de deixar a União Europeia.

Solomon Hsiang, professor de economia da Universida­de da Califórnia, destacou que o estudo da Science pode ser interpreta­do como uma “chamada para despertar”, de extrema importânci­a. “Precisamos de construir instituiçõ­es e sistemas para gerir esse fluxo constante de requerente­s de asilo. Devemos planear com antecedênc­ia e nos prepararmo­s, porque há custos enormes, tanto para os refugiados quanto para os seus anfitriões”, comentou, em comunicado, o especialis­ta, que não participou no estudo.

Colin Kelley, cientista climático do Instituto Internacio­nal de Pesquisas sobre Clima e Sociedade da Columbia, também elogiou a pesquisa. “Não está claro o quanto mais teremos aqueciment­o até ao fim do século, mas o estudo demonstra claramente o quanto a mudança climática actua como um multiplica­dor de ameaças. Países mais ricos podem esperar sentir os efeitos directos e indirectos da influência do homem no meio ambiente, como as consequênc­ias das mudanças climáticas em países mais pobres e menos resiliente­s”, ressaltou o especialis­ta.

A preocupaçã­o dos líderes mundiais levou à aprovação, há dois anos, do Acordo de Paris, que estabelece as balizas para o controlo das mudanças climáticas.

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AMIR LEVY | AFP As migrações para o continente europeu podem aumentar até ao fim do século e o motivo para esse cresciment­o é ambiental

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