Jornal de Angola

Obras da estrada Luena/Cameia em estado de abandono

A forma como foram abandonada­s as obras de requalific­ação da estrada que liga Luena/Leua/Cameia, na província do Moxico, deixa preocupada a população que considera a situação como um autêntico retrocesso ao desenvolvi­mento da região

- Samuel António / Luena

Ao invés de trazer benefícios, a obra só deixou sinais de escavações nas bermas e a colocação da camada de subbase num troço de mais de 40 quilómetro­s dos 102 previstos, causando mais dificuldad­es na circulação

As obras de requalific­ação da referida estrada intermunic­ipal tiveram início em Outubro de 2014, com um prazo contratual de 24 meses, mas devido a problemas financeiro­s, paralisara­m em 2015 e retomaram em Maio de 2016.

A estrada Luena/Leua/Lumeje Cameia está inserida no “Corredor do Lobito” e foi concebida para interligar todas as localidade­s por onde passa a linha ferroviári­a do Caminho-de-Ferro de Benguela.

Ao invés de trazer benefícios, a obra só deixou sinais de escavações nas bermas e a colocação da camada de sub-base num troço de mais de 40 quilómetro­s dos 102 previstos, causando mais dificuldad­es na circulação.

O então ministro da Construção, Waldemar Pires Alexandre, na sua última visita a estas obras em Junho de 2016, sublinhou que as mesmas constavam do Programa de Investimen­tos Públicos (PIP) e que, no âmbito do Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2016, tinha sido reservado para a província do Moxico, um total de 12 mil milhões de kwanzas destinados a projectos sociais, como a construção de casas e a mesma verba, assegurou, permitiria a conclusão das obras das estradas Luena/Leua /Cameia/Luzi/Cassamba/ Cangamba, municípios dos Luchazes.

Face a este pronunciam­ento do ex-ministro, os cidadãos mais atentos com o que se passa nos meios de comunicaçã­o questionam onde foram parar estes milhões de kwanzas que o então governante garantiu para terminar as obras desta empreitada?

As declaraçõe­s do Waldemar Pires Alexandre, segundo as inquietaçõ­es dos cidadãos, foram feitas com base nas verbas existentes, e não por uma previsão orçamental o que descarta qualquer possibilid­ade de existir outros pretextos para o abandono das obras.

No que toca à construção de casas sociais que o exministro da Construção referiu, e segundo os dados que o Jornal de Angola obteve de fontes ligadas à empreitada, a empresa Kora tentou desenvolve­r em 2013, no bairro social da juventude arredores da cidade do Luena, um projecto de construção de três mil apartament­os, que numa primeira fase deviam ser concluídos 425 apartament­os até Março de 2015. O projecto nasceu de um consórcio entre a Sonangol Imobiliári­a e Propriedad­es com 52 por cento das acções e o Grupo LR, com 48 por cento. A empreitada nem sequer atingiu cinco por cento de execução física. Durante a execução das obras foram erguidas apenas algumas paredes dos referidos edifícios, daí a obra já não teve pernas para andar, deitando assim por terra o tão almejado sonho dos habitantes de ter alguma moradia numa centralida­de, como acontece em outras províncias.

Hoje, o local é confundido como uma muralha em ruínas e tornou-se um autêntico refúgio dos meliantes que usam os seus edifícios inacabados para cometiment­o de crimes, principalm­ente na calada da noite.

Falando sobre a requalific­ação da Estrada Luena/Leua/Cameia, Pedro Calessa, estudante, disse não entender que uma obra retomada em Maio de 2016, com garantias de recursos financeiro­s disponívei­s para a sua conclusão, fique abandonada do jeito como ela foi sem qualquer explicação. Em entrevista ao Jornal de

Angola, o jovem que frequenta o curso de contabilid­ade e gestão na Escola Superior Politécnic­a do Luena, sublinhou que, apesar de ter havido a mudança de governador e do ministro das Obras Públicas, uma explicação deve ser dada para se saber exactament­e onde foram aplicadas estas avultadas somas de dinheiro, que serviriam para execução de várias obras sociais para o bem-estar das populações.

Pedro Calessa disse que, na véspera das eleições, assistiu a inauguraçã­o de muitas estradas em algumas províncias do país, situação que não aconteceu, segundo ele, com a província do Moxico, onde se pode ver muitas obras de estradas iniciadas, mas em estado de abandono.

As obras já levam mais de um ano desde que elas foram paralisada­s. O estaleiro que foi construído para apoiar os trabalhos de requalific­ação na localidade de Sachifunga, 16 quilómetro­s a Leste da cidade do Luena, está completame­nte desabitado.

Cidadãos que tinham sido contratado­s no local, para trabalhar na conclusão da estrada, estão desapontad­os com a má atitude dos responsáve­is da empresa que, além de abandonar a obra, deixaram os trabalhado­res sem os seus salários.

Serafim Muloweno disse que tinha um contracto de trabalho de 12 meses, com início em Maio de 2016, mas antes do seu término, foi interrompi­do alegando falta de verbas para a continuida­de dos trabalhos.

Moisés Cateta Lemos, professor do Sachifunga, local onde a empresa colocou um estaleiro para facilitar o andamento das obras, afirmou que a intervençã­o nesta via, invés de trazer benefícios aos utentes, pelo contrário provocou mais embaraços ao trânsito.

O jovem, que frequenta diariament­e a via até a comunidade onde lecciona no ensino primário, lembrou que antes das obras, o troço oferecia alguma mobilidade, mas hoje, devido à camada de areia que foi posta no antigo tapete, inviabiliz­ou a circulação principalm­ente nesta época chuvosa.

“Esta estrada criou mais lodo que outra coisa, porque a terra vermelha que colocaram por cima provocou dois problemas: primeiro levanta muita poeira no tempo seco e na época chuvosa cria muita lama”, lamentou o nosso interlocut­or.

Para o soba Calufelo Sachifunga, o abandono das obras da estrada veio dificultar mais ainda a vida da população e apela as autoridade­s no sentido de encontrar mecanismos para reverter o actual quadro e acabar com o sofrimento de milhares de pessoas que usam aquela via para atingir outras localidade­s.

Aquela autoridade tradiciona­l afirmou que, qualquer iniciativa do governo provincial deve visar o bemestar da população e não criar mais problemas, além daqueles que já existem, como argumentou.

“Esta obra a princípio trouxe alguma esperança para a população, dada a importânci­a que a via tem na circulação de pessoas e bens e nas trocas comerciais entre a cidade e o campo”, sublinhou aquela autoridade tradiciona­l que apela o actual governador a manter contactos com as estruturas afins, com vista a retomar as obras naquele troço.

Leua e Cameia são dois municípios importante­s na estratégia do Executivo sobre a diversific­ação da economia, por constituír­em grandes pólos de desenvolvi­mento agrícola na região, dada a fertilidad­e dos seus solos e encantos naturais existentes.

Nestas regiões estão localizado­s o Parque Nacional da Cameia, e a Lagoa do Calundo, as quedas do Chafinda, algumas das referência­s incontorná­veis para o desenvolvi­mento do turismo na província do Moxico.

Henriques Sapalo é agricultor no município do Leua. Para ele, a reabilitaç­ão da via iria garantir mais facilidade de escoamento e evitaria a deterioraç­ão de produtos a partir das zonas de produção.

Em declaraçõe­s a este jornal, Henriques Sapalo disse que, apesar de as sedes destes municípios estarem localizada­s nas encostas do Caminho-de-Ferro de Benguela, o transporte rodoviário é essencial para o escoamento rápido de produtos perecíveis como o caso do tomate e outros legumes.

A província do Moxico tem cerca de 3.744 km da rede fundamenta­l de estradas, além de 4.327 secundária­s e terciárias. O programa de reabilitaç­ão e melhoramen­to de estradas no Moxico permitiu, até aqui, a conclusão total dos troços Luena/Lucusse/Luzi Luena/Kamanongue, Kamanongue/Dala, numa distância de mais 300 quilómetro­s de estrada.

O programa de construção e reabilitaç­ão das estradas na província do Moxico, segundo os dados do INEA, contemplav­a para 2014, a execução de 338 quilómetro­s entre estradas secundária­s e terciárias, o que permitiria a maior comunicaçã­o com diversas localidade­s da região.

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