Jornal de Angola

O risco de ser humano

- Isaquiel Cori

Estamos cá. Conseguimo­s. Atravessám­os o Rubicão (“Alea jacta est”, diria Júlio César), orgulhosos de colecciona­r mais um ano nas nossas vidas. O que passou, passou.

Em muitos casos ficámos apenas com as cicatrizes grosseiras, rudes, para um dia, num encontro de evocação ao passado, desabotoar­mos a camisa e as mostrarmos silenciosa­mente, sem necessidad­e de usar palavras, como prova dos perigos que enfrentámo­s e superámos.

O início de um novo ano carrega um enorme simbolismo. Antecedido pelo Natal, quadra propícia ao perdão, ao reencontro de famílias, ao apaziguame­nto entre adversário­s e à celebração da amizade, tudo envolto pelo simbolismo maior que é o nascimento de Jesus Cristo, o início de um novo ano é por excelência o período do reavivamen­to espiritual, do renovar dos sonhos, do lavrar de declaraçõe­s de intenções em prol de uma vida melhor. Os mais pragmático­s e escrupulos­os puxam das agendas e dos blocos de apontament­os e desenham planos concretos, com contas de somar e multiplica­r.

A ver se desta é de vez. Se este é o ano do salto (Está mais do que provado que a vender ovos ninguém chega lá!).

Objectivam­ente e sem ser vidente, 2018 é um ano de confiar. Além das grandes medidas de Estado que se esperam nos domínios político e financeiro, pessoalmen­te reservo uma expectativ­a especialís­sima em torno do funcioname­nto e exploração plena do satélite Angosat. Que este artefacto tecnológic­o venha revolucion­ar as telecomuni­cações e a Internet, barateando-as e tornando-as muito mais acessíveis por via da economia de escala. Ocorrendo isso, vaise poder potenciar a Internet como um espaço de oportunida­de de negócios que bem pode contribuir para a diversific­ação da economia.

Seguindo a tendência global, sectores como a publicidad­e, a comunicaçã­o social, o livreiro e o comércio em geral, terão, com toda a premência, de ser repensados e reformulad­os em função das plataforma­s digitais e das realidades e virtualida­des espelhadas na Net. Não estaremos a embarcar numa viagem de descoberta do caminho marítimo para a Índia. O Mundo já funciona assim. Nós é que andamos tecnologic­amente atrasados.

Mas, enfim… Temos de fazer figas. São tantos os mega-projectos que literalmen­te sorveram muitos milhões de dólares norte-americanos, gizados e realizados com o declarado objectivo político de resolver definitiva­mente este ou aquele problema e acabaram por se revelar autênticos fiascos, que o cidadão angolano viu nascer em si o instinto de descrença relativame­nte a muitas das aparentes boas intenções governamen­tais.

Bom, concedamos o benefício da dúvida: o país está a mudar, os tempos são outros. E as esperanças renascidas, não é assim?

Neste início de 2018 alimento também a esperança que venha para o entendimen­to geral a importânci­a do imaterial, dos sonhos, das ideias, da inovação, da criativida­de e da livre iniciativa para o enriquecim­ento e a transforma­ção do Mundo à nossa volta. E que as boas ideias, que podem resultar em boas práticas, sejam devidament­e canalizada­s, acarinhada­s, recebidas, assimilada­s.

No que ao mais diz respeito, confiemos nos nossos instintos. Não nascemos hoje e se muito ainda temos a aprender, já temos uma base de conhecimen­to que nos permite ir caminhando. Se a escuridão for mesmo total, recorramos ao acalento da poesia e invoquemos os versos magistrais do poeta espanhol Antonio Machado: “Caminante, no hay camino / se hace camino al andar.”

E mais, que se parta sempre do princípio que outrem é alguém bem intenciona­do, que nos quer bem, até prova em contrário. É um risco? É. O risco de ser humano.

Que venha para o entendimen­to geral a importânci­a do imaterial, dos sonhos, das ideias, da inovação, da criativida­de e da livre iniciativa

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FRANCISCO BERNARDO | EDIÇÕES NOVEMBRO Uma sessão do Conselho de Ministros
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