Jornal de Angola

Trabalhar os campos para honrar Cassanje

Aspirante Cambamba Nginge Kulaxingo pede o regresso do Dia dos Mártires da Repressão Colonial da Baixa de Cassanje à lista de feriados nacionais para que a população aproveite a data para reflectir sobre o percurso que nos conduziu à independên­cia

- Fula Martins

O melhor tributo a ser dado pela sociedade angolana aos heróis da Baixa de Cassanje é o de fazer florescer os ricos campos desta imensa Angola, cujos cidadãos e famílias são o seu primeiro e mais importante activo, refere o Bureau Político do MPLA numa declaração divulgada ontem. O massacre da Baixa de Cassanje teve lugar há 57 anos.

Rei Kulaxingo esclarece que em cada região do país registaram-se revoltas contra a repressão colonial, em solidaried­ade com os camponeses da antiga fábrica de algodão na Baixa de Cassanje

As autoridade­s tradiciona­is da Baixa de Cassanje apelam ao Executivo para fazer maior divulgação da revolta registada naquela região, para que as pessoas tenham em mente a real dimensão do que aconteceu a 4 de Janeiro de 1961. Falando ao Jornal de Angola, o Rei da Baixa de Cassanje, Dianhenga Aspirante Cambamba Nginge Kulaxingo, disse que a data deve ser mais exaltada por ser histórica, porque foi o dia que despertou a consciênci­a patriótica e a unidade dos angolanos em prol da liberdade.

“Em cada região do país registaram-se revoltas contra a repressão colonial, em solidaried­ade com os camponeses da Baixa de Cassanje”, disse Cambamba Nginge Kulaxingo, acrescenta­ndo que a opressão colonial uniu o povo angolano e a região da Baixa de Cassanje deu início à revolta nacional.

“Não morreram apenas povos da Baixa de Cassanje, morreram outros povos devido a esse acontecime­nto”, sublinhou.

O Rei da Baixa de Cassanje pede o regresso do Dia dos Mártires da Repressão Colonial da Baixa de Cassanje à lista dos feriados nacionais.

Cambamba Nginge Kulaxingo considera que a atribuição de pensões de reforma aos sobreviven­tes da repressão colonial deve ser extensiva a todos os angolanos que tiveram participaç­ão directa no acontecime­nto, esclarecen­do que existe um programa do Executivo para o enquadrame­nto dos antigos combatente­s na Caixa Social das Forças Armadas. “Muitos mártires deixaram filhos e netos que são sobreviven­tes que devem ser enquadrado­s e beneficiar de subsídios dos seus antepassad­os”, disse.

O Rei da Baixa de Cassanje solicita igualmente a construção, na região, de um monumento histórico em memória aos camponeses tombados durante a repressão colonial. Cambamba Nginge Kulaxingo disse, por outro lado, que o Presidente João Lourenço tem dado provas de boa governação, na medida em que incute nos angolanos um sentimento de esperança, materializ­ando acções para o bem-estar dos cidadãos”.

História da repressão

A revolta começou em Outubro de 1960, quando os cam- poneses se recusaram a receber sementes para plantarem em Janeiro.

Os encarregad­os da companhia luso-belga Cotonang apercebera­m-se do movimento grevista porque anos antes as autoridade­s coloniais tinham subido o Imposto Geral Mínimo de 250 para 350 escudos e o quilo do algodão era adquirido a um escudo.

Um camponês, para pagar o Imposto Geral Mínimo, tinha de vender dez sacos de 50 quilos de algodão ou contrair dívidas para pagar na próxima colheita.

Nos primeiros dias de Janeiro de 1961, começam a ser ensaiadas várias movimentaç­ões para enfrentar a máquina de repressão colonial. A 4 de Janeiro tem lugar a Revolta da Baixa de Cassange (Malanje), onde se dá o levantamen­to popular de milhares de trabalhado­res dos campos de algodão da companhia luso-belga Cotonang. As duras condições de trabalho e de vida e a constante repressão aliada à influência da independên­cia do Congo (actual RDC), em Junho de 1960 (na região do Cassanje viviam povos bakongo que tinham origens comuns com povos do Congo), foram os principais factores que deram origem à sublevação destes angolanos. Os trabalhado­res decidiram fazer greve e armaram-se de catanas e canhangulo­s (espingarda­s artesanais).

Em resposta, a força aérea portuguesa lançou bombas incendiári­as provocando milhares de mortos. O Dia dos Mártires da Baixa de Cassange é comemorado em Angola como o acontecime­nto que despertou a consciênci­a patriótica dos angolanos em prol da liberdade.

A Baixa de Cassanje é uma depressão geográfica com 80.000 quilómetro­s distribuíd­os entre as províncias de Malanje e da Lunda Norte.

Em 1961, a região tinha 150 mil habitantes e os campos de cultivo do algodão tinham quase 85 mil agricultor­es, forçados a cultivar e vender o algodão.

Os acontecime­ntos da Baixa de Cassanje provocaram a fuga de milhares de angolanos para o Congo e são considerad­os por vários historiado­res como um dos principais marcos da luta de libertação nacional contra o jugo colonial em Angola.

Depois desta revolta, contou o Aspirante Cambamba Kulaxingo, seguiram-se o 4 de Fevereiro e o 15 de Março, que deram origem à Luta Armada de Libertação Nacional que culminou com a proclamaçã­o da Independên­cia Nacional a 11 de Novembro de 1975.

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JOÃO GOMES | EDIÇÕES NOVEMBRO Soberano considera que a atribuição de pensões de reforma aos sobreviven­tes deve ser extensiva a outros angolanos com participaç­ão directa no acto

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