Analistas admitem que banco central vai manter o controlo do mercado financeiro
A substituição das taxas de câmbio fixas por um regime flutuante, anunciada na quarta-feira em Luanda pela equipa económica do Governo, em nada diminui o poder de intervenção e controlo do Banco Nacional de Angola no sistema financeiro do país, alertou o economista Rui Malaquias.
Para o mestre em finanças, ao criar uma banda cambial, também chamada regime flutuante dentro da banda ou ainda regime de câmbio atrelado, o BNA reserva-se ao direito de intervir no mercado financeiro sempre que achar necessário, para manter o câmbio dentro dos limites previamente estabelecidos.
“Um regime flutuante puro não tem banda alguma”, esclarece o economista, salientando que em semelhantes regimes é a oferta e a procura por moeda estrangeira que ditam a taxa de câmbio, apesar de haver intervenções “pontuais” dos bancos centrais.
A modalidade de câmbio em vista, de acordo com o economista, exige do banco central um grande esforço financeiro. Se houver muitos dólares no mercado, o BNA é obrigado a comprar o excedente, com o que estará a colocar kwanzas no mercado para manter a taxa de câmbio dentro da banda, isto é, no limite mais baixo.
Em caso de escassez de dólares, o BNA é forçado a fazer recurso às reservas internacionais líquidas, para injectar no mercado ou reduzir o volume de kwanzas em circulação e, em compensação, emitir títulos públicos para controlar a base monetária e manter o câmbio dentro do limite máximo.
Dadas as disfunções do sistema financeiro do país, o economista teme que o segundo cenário prevaleça sobre o primeiro. Ou seja, que a taxa de cambio venha a estar permanentemente no limite máximo da banda. Na verdade, “existem muitos kwanzas para pouquíssimos dólares e as reservas internacionais líquidas vão continuar a diminuir, para manter o câmbio dentro da banda”.
Na prática, segundo Rui Malaquias, o regime flutuante dificilmente vai diminuir a pressão sobre as reservas internacionais líquidas e a chamada banda não vai cobrir a diferença entre o que o mercado informal quiser pagar a dada altura e os limites previamente estabelecidos.
Sobre a retoma de leilões de venda de divisas, o economista saúda a iniciativa, lembrando, no entanto, que “o mercado informal tem uma oferta de kwanzas muito grande em relação aos dólares que o banco tem para oferecer”.
Por seu turno, o economista Carlos Rosado disse que a substituição do regime cambial pelo flutuante vai permitir a redução do diferencial do preço das divisas entre o mercado formal e o paralelo. O economista acredita que o grande benefício vai recair sobre o mercado primário, que vai determinar o preço sempre que o BNA tiver de vender divisas.
“Se os bancos estabelecerem um preço muito alto, o BNA vai ter de injectar directamente mais divisas no mercado para fazer baixar a taxa de câmbio”, explicou Carlos Rosado, para quem a história da desvalorização e depreciação é um eufemismo, por entender que a desvalorização é fixa e a depreciação depender das leis do mercado.
Para o economista, é bom que a depreciação do kwanza ocorra o mais rapidamente possível, para que seja o próprio mercado a dinamizar as taxas de câmbio. “O preço do dólar deve ser fixado em função da procura, tal como ocorre com outros produtos”, defende Carlos Rosado, que prevê uma grande depreciação da moeda nacional.
Apesar de todas estas medidas surgirem numa altura em que o mercado paralelo continua forte, Carlos Rosado entende ser melhor que tal ocorra agora, tendo em conta o grande diferencial existente entre a taxa de câmbio informal e a formal. No seu entender, quando a taxa de câmbio ditada pelo mercado reflectir a lei da oferta e procura, as chamadas “quinguilas” vão ver reduzida a sua margem de manobra.
Mais tecnicista, o economista Sérgio Calundungo diz que apesar das diferenças teóricas entre desvalorização e depreciação, os efeitos, no caso especifico de Angola, podem ser os mesmo.
Quando o Executivo decide desvalorizar uma moeda, ou quando uma moeda se deprecia em função da dinâmica do mercado, os cidadãos que auferem salários nessa moeda acabam sempre por perder o seu poder de compra. “O Executivo deve ser bem claro a explicar que, ainda que não se tenha optado por desvalorizar a moeda, uma das prováveis consequências da depreciação da moeda será a perda do seu valor face ao dólar, euros e outras moedas transaccionadas no mercado angolano.
Bem aplicada a taxa de câmbio flutuante, de acordo com Sérgio Calundungo, não só diminui as absurdas diferenças entre o mercado informal e formal, como pode também reduzir, a médio e longo prazo, a apetência para a especulação. A grande desvantagem é que o dólar e euros vão estar mais caros e, consequentemente, os produtos, bens e serviços adquiridos com estas moedas.