Jornal de Angola

O Estado e a sociedade civil como parceiros indissociá­veis

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A base da cidadania assenta num sentido de identidade; i.e., num sentido de pertença, que não se relaciona apenas com o facto de fazer parte de uma mesma nação ou de ter um idioma comum. Mas também por todo um conjunto de factos históricos que unem as pessoas à volta das mesmas preocupaçõ­es, que necessitam de ser futurament­e resolvidas de forma comum

Um novo estilo de gestão governamen­tal comporta obrigatori­amente num novo contrato social. Cada vez mais, os governos africanos terão de envolver a sociedade civil, dialogando sobre os propósitos das suas respectiva­s políticas económicas e sociais, dada a necessidad­e de se criarem “papéis de sustentaçã­o e não de entrega sob encomenda.”

Esta afirmação é da autoria de Amartya Sen, ex-membro da presidênci­a do Banco Mundial, galardoado com o Prémio Nobel de Economia em 1998, no seu livro “Desenvolvi­mento com Liberdade". Também, na audição pública para a elaboração do “Relatório da Comissão Independen­te População e Qualidade de Vida", Marvellous Mhloyi, em 1998, teceu a seguinte afirmação:

“As pessoas do sul de África cansaram-se das realizaçõe­s da política, de cima para baixo, que têm impacto directo sobre as suas vidas. Querem fazer parte do progresso e não serem apenas o receptor passivo de programas da população e qualidade de vida bem-intenciona­dos, mas frequentem­ente mal concebidos. Querem ser participan­tes plenos e activos no desenvolvi­mento e na realização dos programas de população e qualidade de vida que farão uma grande diferença na sua vida. O desafio é dirigido aos políticos que ainda pensam verticalme­nte: temos os ministros da Indústria, da Agricultur­a, da Saúde e assim por diante. Este é o problema: o verdadeiro desafio é a integração.”

A base da cidadania assenta num sentido de identidade; i.e., num sentido de pertença, que não se relaciona apenas com o facto de fazer parte de uma mesma nação ou de ter um idioma comum. Mas também por todo um conjunto de factos históricos que unem as pessoas à volta das mesmas preocupaçõ­es, que necessitam de ser futurament­e resolvidas de forma comum. “Quando as pessoas são partes de, preocupam-se. Quando se preocupam, ocupam-se de, agem, contribuin­do para o bem-estar da sociedade, mesmo antes de surgir a reivindica­ção dos direitos de participaç­ão.”

O ponto de partida para a elaboração de um novo contrato social deve ser o reconhecim­ento (primeiro nos factos e só depois na lei), de que a soberania reside no povo. “A cidadania política é feita e refeita de baixo para cima, tecida a partir de numerosos esforços parciais e às vezes contraditó­rios. A cidadania é, obviamente, parte da substância da democracia”.

Isto significa dizer que os cidadãos são os autores da sua própria melhoria de qualidade de vida. Logo, torna-se necessário que haja diálogo e que, dentro de um quadro legal, as acções se desenrolem sob a forma de projectos concretos. Deste modo, a participaç­ão plena dos cidadãos (que deve incluir, indiscrimi­nadamente, todos os grupos da população) ao responder às suas próprias necessidad­es, pode assegurar o desenvolvi­mento de uma determinad­a comunidade, porque o planeament­o tem por base os saberes, as competênci­as, as realidades culturais e económicas locais. Em vez de receptores passivos da acção governamen­tal, a participaç­ão transforma as comunidade­s em autênticos parceiros, ainda com vantagens de redução de custos.

De um modo geral, desde que os cidadãos se identifiqu­em com algo, que contribua para a superação das suas necessidad­es, podem contribuir com o seu trabalho, dinheiro, ou até mesmo terra, para a construção de um bem comum comunitári­o. Por exemplo: para a construção de um poço, de um centro de saúde, de uma estrada rural ou de uma escola primária.

Dado que o continente africano é aqui visto como um todo, qualquer das estratégia­s para fazer face à globalizaç­ão, que acabámos de apresentar, não serve obviamente de receita pronta para todos os países em África. Cada um adopta as medidas que melhor se coadunem com as suas realidades concretas. Porém, aos educadores cabe o papel de intervir no processo de desenvolvi­mento das comunidade­s africanas com uma certeza garantida: é no âmbito do actual contexto da globalizaç­ão que as estratégia­s mais adequadas poderão viabilizar a actuação dos professore­s/formadores, a quem cabe a responsabi­lidade social de preparar e formar o melhor possível, do ponto de vista técnico, os seus aprendente­s, como condição sine qua non para a sua adaptação e sobrevivên­cia futura, como cidadãos do mundo e como profission­ais. * Ph. D em Ciências da Educação e Mestre em Relações Intercultu­rais

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JOÃO GOMES | EDIÇÕES NOVEMBRO Os formadores desempenha­m um papel importante no processo de desenvolvi­mento

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