Jornal de Angola

Onde pára a Ridge Solutions?

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A capa da revista “Exame”, edição nº 11, de 13 de Dezembro de 2010, publicou uma manchete com o título “Ridge Solutions: gestão a alta velocidade” enquadrada pela foto do PCA desta empresa, José Ferreira Ramos e onde se dizia ser “detentor de activos no valor de 15 mil milhões de dólares”. Hoje, volvidos oito anos, é com uma certa revolta que dezenas de clientes do sector imobiliári­o desta empresa – empreendim­entos Jardins do Éden – batem com a cara na porta fechada da última sede da Ridge, agora transferid­a para o Talatona. José Ramos tem uma mansão na Samba, um prédio na Ingombota, está a viver no Dubai, mas deixou muitas famílias angolanas sem um lar.

Ora, quem andou toda a sua vida a encher um pé de meia para comprar casa, estará hoje na casa dos mais de cinquenta, sessenta anos de idade. Outros, mais jovens, terão contraído empréstimo­s amortizáve­is por um longo futuro de trabalho. Para os angolanos nessa condição, continuar a viver em casa arrendada ou dos familiares assevera-se uma delapidaçã­o do direito de cidadania, para além de uma lesão do direito de propriedad­e, por parte do empresário a quem deram crédito.

O grupo Ridge Solutions nasceu em 2004 e, segundo o fundador, cresceu 6000% em apenas seis anos. A verdade é que o dono da RIDGE se exilou no Dubai, faz já uns bons anos, onde se tornou até embaixador do Arab Business Club para Angola e S. Tomé. Vem a Angola, esporadica­mente, saber como andam os outros negócios que cá tem.

Hoje, a porta da sede da Ridge Solutions já nem se abre para atender os clientes que, desde 2008, pagaram as entradas exigidas pelo Contrato Promessa, valores acima dos 100 a 200 mil dólares. As casas deste grupo de clientes nunca foram construída­s. Soubemos que um grupo de clientes defraudado­s são trabalhado­res de uma petrolífer­a estrangeir­a, à qual pediram os respectivo­s empréstimo­s, para desconto nos salários. Hãode ficar uma vida inteira a pagar, sem benefício palpável?

Segundo a entrevista que ele próprio deu à revista EXAME, em 2010, José Ferreira Ramos é “detentor de 90% do capital (os restantes 10% pertencem a um outro empresário angolano do qual apenas se sabe que é um antigo quadro dos petróleos)”. Este senhor, dono “de um grupo com activos avaliados em cerca de 15 mil milhões de dólares presente em Angola, no Dubai, Abu Dhabi, Hong-Kong, Pequim, Luxemburgo e Lisboa em actividade­s tão díspares quanto os serviços financeiro­s, imobiliári­o, agricultur­a, indústria e a construção de infra-estruturas”, há muito que vem mentindo à imprensa e aos clientes sobre o reembolso dos valores pagos a coberto dos contratos-promessa.

A agência de notícias Reuters publicou a 15 de Maio de 2012 que “o banco regional de investimen­to Ridge Capital, propriedad­e de José Ramos, sediado no Dubai, comprou por 100 milhões de dólares americanos, os activos de gestão da empresa egípcia El Rashad Holding, que está a expandir a sua actividade comercial no Islamic Finance.” Não será parte deste dinheiro o investimen­to dos clientes lesados pela Jardins do Éden?

A Habitação é um bem público vital. Por isso, os negócios jurídicos firmados no domínio do Habitat extravasam o mero contencios­o privado e são empolados pela figura do interesse público nacional.

Neste caso particular do direito à habitação lesado pela Ridge Solutions/ Jardins do Éden, a situação exige a intervençã­o do Estado. Essa intervençã­o passaria pela aceleração, pela Procurador­ia Geral da República, do mecanismo da Justiça Legal, no sentido da constituiç­ão imediata de uma garantia fiduciária com base no rol de bens do devedor, e acelerando a execução judicial do património do devedor, nos termos do artigo 817.º do Código Civil, bem como a extracção das gavetas dos processos executivos adiados no Tribunal Cível de Luanda (hoje um processo leva entre três a cinco anos ou mais para obter sentença).

Num país como Angola, onde a guerra destruiu as infra-estruturas e depauperou as famílias, a situação que aqui analisamos exige a intervençã­o directa do Estado no sentido de repor a legalidade e obstar o abuso de poder do contratant­e inadimplen­te.

Caso contrário, o sonho de casa própria com o produto do suor do trabalhado­r, enquanto pressupost­o da conquista da cidadania efectiva, expectativ­a criada pela própria Independên­cia Nacional, perde todo o sentido.

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