África do Sul tem novo Presidente
O Parlamento da África do Sul confirmou ontem ao início da tarde a saída de Jacob Zuma do cargo de Chefe de Estado e, ao mesmo tempo, anunciou que o líder do ANC Cyril Ramaphosa assumia a responsabilidade de Presidente da República
Sem qualquer tipo de surpresa e sob um coro musical protagonizado pelos deputados que entoavam cantigas populares, a Assembleia Nacional da África do Sul anunciou ontem à tarde que Cyril Ramaphosa é, oficialmente, o novo presidente do país e que o pedido de demissão entregue nesse mesmo dia por Jacob Zuma havia sido aceite.
Deste modo é colocado um ponto final na “novela” em que se estava a transformar o braço de ferro entre Jacob Zuma e o ANC, que durante os últimos dias concentrava as atenções nacionais e internacionais no que se estava a passar no país.
O suspense quanto à definição desse braço de ferro arrastou-se até às últimas horas de quarta-feira, pois só nessa altura é que Jacob Zuma decidiu enfrentar a realidade e reconhecer, implicitamente, que já não tinha os apoios suficientes para continuar a dirigir os destinos da nação sul-africana.
Horas antes de aparecer perante os seus concidadãos a anunciar que tinha acabado de assinar o seu pedido de resignação, embora não concordasse com quem exigia a sua saída, Jacob Zuma tinha dado uma entrevista à cadeia SABC a garantir que iria continuar até ao fim do seu mandato. Mas, terá sido a decisão do ANC avançar com a apresentação de uma moção de censura para o derrubar, caso não aceitasse demitir-se, que terá feito Jacob Zuma perceber que se encontrava num beco cuja única saída apontava para a porta das traseiras, onde do lado de lá o espreitava (e ainda espreita) a justiça pronta a ajustar com ele as contas que considera estarem pendentes.
Uma sucessão natural
Face à resignação de Jacob Zuma, não restava outra alternativa legal ao ANC que não fosse a de indicar o nome do seu presidente, Cyril Ramaphosa, para acumular esse cargo com o de Presidente da República. Porém, até à última da hora surgiu a possibilidade de Ramaphosa ir ontem a votos no parlamento com um outro candidato apresentado pela oposição, mas que nunca foi sequer identificado.
Essa possibilidade gorouse pois a interpretação que foi feita da constituição apontava no sentido de ser o vice-presidente da República, neste caso Cyril Ramaphosa, o único candidato que os deputados teriam que ratificar num gesto meramente simbólico, mas constitucionalmente imprescindível. Alguns observadores referem que Cyril Ramaphosa está com um olho na presidência da República praticamente desde que o ANC chegou ao poder em 1994.
Essa percepção é atribuída ao facto de em 1994 Ramaphosa não ter conseguido disfarçar alguma mágoa pelo facto de Nelson Mandela não o ter escolhido como seu sucessor. Terá sido, aliás, essa decepção que o empurrou para o mundo dos negócios e para os sindicatos, interrompendo uma carreira política que ele próprio já nessa altura tinha a certeza de estar condenada ao sucesso. Finalmente, Cyril Ramaphosa tem a oportunidade de concretizar o sonho de ser presidente da República, eventualmente muito melhor preparado do que estava em 1994. Essa preparação, sobretudo a sua passagem pelos sindicatos e a experiência que tem do mundo dos negócios será fundamental para vencer a sua primeira grande batalha e relançar a economia sul-africana.
Trata-se de uma batalha que não será fácil de vencer, numa altura em que o desemprego atingiu uma taxa de 30 por cento e quase metade dos jovens andam à procura do seu primeiro emprego.
Ontem, o mercado financeiro parece ter apreciado e agradecido a demissão apresentada por Jacob Zuma, com o rand a atingir a maior valorização dos últimos três anos face ao euro e ao dólar norteamericano.
O futuro de Jacob Zuma
Mas, enquanto Cyril Ramaphosa começa a dar os primeiros passos para impor o seu programa e o seu estilo de governação, a grande pergunta que agora se coloca relacionase com o futuro que está reservado a Jacob Zuma. Para já não se sabe se ele conseguiu, nas reuniões privadas que teve com Cyril Ramaphosa, garantir algum tipo de acordo que lhe permita ter como garantido o apoio político do ANC.
Embora se saiba que o poder judicial é independente do poder político, seria reconfortante para Jacob Zuma ter a certeza de que poderia contar com uma “rectaguarda segura” e, sobretudo, “solidária” para enfrentar as malhas que a justiça tece para enredar aqueles que têm contas para ajustar com ela, como é inegavelmente o seu caso.
A última informação disponível, tornada pública no calor dos esforços para levar Zuma a demitir-se, refere que Cyril Ramaphosa não garantiu qualquer tipo de imunidade para proteger o antigo presidente das garras da justiça. Mas isso foi no início deste mês.
Daí para cá ocorreram diversas reuniões entre os dois, durante as quais alguma coisa pode ter ficado acordada no segredo das quatro paredes sem que disso fosse dado conhecimento à opinião pública. Tratando-se de um assunto extremamente sensível, por envolver um exPresidente da República, é natural que a própria justiça tenha, também, um especial cuidado para não dar passos em falso. Por isso, aconselha a experiência de casos recentes, que se espere para ver o que se passará nos próximos dias e então se poder ajuizar, com mais rigor, o que pode estar reservado para Zuma.
Justiça sul-africana ainda não se pronunciou sobre o que pode vir acontecer a Jacob Zuma, o que está a levantar grande expectativa em relação ao seu futuro