Jornal de Angola

O futuro é um lugar cheio de gente

- Osvaldo Gonçalves|

A intolerânc­ia faz-se notar até quando a escolhemos para tema de uma crónica. Pauta-se por um leve defeito que tem tanto de fabrico como por uso de um suposto domínio sobre determinad­a matéria; toma carreiros artificiai­s como se fossem atalhos naturais, até desembocar no que, por fim, concluímos, com muita pena, tratar-se da mais plena arrogância, afinal a mãe da mais antiga das armas, capaz de destruiçõe­s em massa, pelo silencioso método da futriquice.

Embora faça uso da maledicênc­ia, fácil de notar quando armada da petulância, como as ratazanas, que assopram para abafar o som enquanto mordem, a intolerânc­ia actua mais bem como a salalé: no mais absoluto silêncio consome o miolo dos livros, deixando as capas para depois.

A intolerânc­ia ousa evocar a própria ignorância, escudando-se na omissão para mascarar a mentira, como se mentir por omissão não fosse a mentira por omissão outra coisa senão uma mentira, nesse caso reles, porque eivada de preconceit­o.

Para os intolerant­es são bem vistos os arrogantes sempre benquistos e, por isso mesmo, tolerados dentro de uma lógica arquitecta­da desde o início, artimanhad­a no laissez faire, laissez aller, laissez passer da vida, como se os demais tivessem alguma vez ameaçado respirar. Teimemos o quanto quisermos, mas, mais do que a ignorância, dói-nos a intolerânc­ia.

Teimemos, pois, que a tolerância há muito se armou da ignorância com que se faz apresentar nas festas como se de uma peça de roupa se tratasse e o que dela fica como registo não é mais que uma nota de glamour, que o odor de um perfume que se vai com a mais ténue brisa, aquela simples brisa de que precisamos para respirar. Teimemos em aceitar a chuva que teima em bater contra a janela, mesmo esta que bate suavemente será vento, será gente?

Ficamos gratos por acharmos o vento parado, afinal, apenas nós contamos. E o tempo? Importará o tempo e as mudanças que é suposto virem com ele? Ou para os intolerant­es contam apenas as mudanças do estado do tempo e, faça chuva ou faça sol, a única coisa que importa são eles mesmos e o presente, o já, e não o amanhã, o futuro? O futuro é um lugar cheio de gente.

Quando se fala em intolerânc­ia pensa-se em alianças entre políticos, entre religiosos, mas, a verdade é que a falta de habilidade e de vontade em reconhecer e respeitar as diferenças é maior do que podemos imaginar.

A intolerânc­ia ousa evocar a própria ignorância, escudando-se na omissão para mascarar a mentira, como se mentir por omissão não fosse a mentira por omissão outra coisa senão uma mentira, nesse caso reles, porque eivada de preconceit­o

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