Línguas nacionais sem estatuto
Das várias línguas faladas no país apenas seis contam com alfabeto e espera-se que outras tenham manuais
As línguas nacionais de Angola ainda não gozam de um estatuto próprio, disse o director-geral do Instituto de Línguas Nacionais (ILN), José Pedro. A Constituição consagra esse direito apenas à língua portuguesa.
As línguas nacionais de Angola ainda não gozam de um estatuto próprio, por isso precisam de uma protecção jurídica que lhes permite obter maior dignidade, afirmou ontem, em Luanda, o director-geral do Instituto de Línguas Nacionais (ILN).
José Pedro disse que a Constituição da República consagra esse direito apenas à língua portuguesa. “Já em relação as outras faladas no país não se lhes confere um estatuto próprio. Elas aparecem na Carta Magna apenas como as línguas angolanas”, acentuou.
O também docente universitário defendeu a criação de um estatuto próprio para essas línguas, que vai proteger e definir, claramente, o que são e que papel devem desempenhar na sociedade.
Informou que já foi remetido à Assembleia Nacional, há já algum tempo, uma proposta de lei sobre as línguas nacionais, com o objectivo de garantir esse direito às mesmas, mas, até agora, não foi aprovado.“O documento já foi discutido e aprovado na generalidade em 2011. Nesse momento, aguardamos apenas pela sua discussão nas comissões de especialidade”, frisou.
Com a aprovação do estatuto, explicou, vai ser possível aumentar o número de línguas nacionais com alfabeto, pois, até ao momento, das várias faladas no país, apenas seis dispõem de alfabeto.
José Pedro deu a conhecer que uma outra vantagem oferecida pela Lei das Línguas Nacionais, caso seja aprovada pela Assembleia Nacional, é a obrigatoriedade do uso das mesmas nos tribunais, sempre que um cidadão, que só se comunica numa delas, for lá parar.
“Esse documento vai legalizar, do ponto de vista jurídico, a utilização das nossas línguas nos tribunais, na administração pública e em vários sectores da vida pública”, disse.
O director-geral do ILN disse que o que se pretende é criar um ambiente de igualdade entre as línguas faladas no país. “Se o português goza de um estatuto, porquê que as línguas nacionais não gozam também? A Constituição diz que a língua oficial de Angola é o português, mas no país não se fala só o português”, salientou, para acrescentar que é por esse motivo que se quer um instrumento que dê um estatuto às línguas nacionais.
José Pedro é de opinião que, tal como acontece na África do Sul, Angola deveria ter observado na sua Constituição mais línguas oficiais, como, por exemplo, o Kimbundu, Umbundu e Kikongo, e não somente o português como está actualmente. José Pedro disse que, pelo facto de haver mais de um terço da população angolana que tem o português como língua materna, está-se analisar a possibilidade de se elevar este idioma à categoria de língua nacional.
Já em relação as outras faladas no país não se lhes confere um estatuto próprio. Elas aparecem na Carta Magna apenas como as línguas angolanas
José Pedro lamentou que a imprensa, em alguns casos, desenvolva comportamentos que ajudam a desvalorizar as línguas nacionais. Contou que, certa vez, após o encerramento de um seminário sobre as línguas faladas em Angola, numa das províncias do país, produziram-se dois comunicados: um em português e outro na língua local.
Para o seu espanto, a imprensa passou apenas o comunicado escrito em português. “Às vezes, somos nós mesmos que não valorizamos nem defendemos as nossas línguas”, afirmou.
José Pedro lembrou que nenhum país se desenvolve sem a participação das suas próprias línguas e acrescentou ser impensável falar no desenvolvimento de Angola sem que se tenha em conta todas as suas línguas.
O docente universitário recordou que as línguas angolanas de origem africanas eram, até um certo tempo, de tradição oral e sem escrita, mas, após a criação, em 1979, do Instituto de Línguas Nacionais, fez-se um estudo científico sobre as línguas nacionais, o que permitiu à elaboração do alfabeto e regra de transcrição de algumas.