Jornal de Angola

O retorno de fundos e o OGE 2018

- Rui Malaquias

Todos debates a volta do Orçamento Geral do Estado (OGE) 2018 centram-se no facto de ser um orçamento insuficien­te para as necessidad­es reais de investimen­to público, sobre a lógica de alocação/distribuiç­ão das rubricas pelos sectores e pelas províncias e principalm­ente sobre os mais de 52% da despesa alocada para o pagamento da dívida que deixa a execução orçamental sem fôlego.

É exactament­e aqui que Executivo deve atrelar o processo e a própria Lei de Repatriame­nto de Capitais, que pelos vistos será denominada como “Regime Extraordin­ário de Regulariza­ção Tributária e Cambial” pois o racional aqui deveria ser, muito mais do que reaver o dinheiro que saiu do país ilegalment­e, conceder maior alcance à execução orçamental.

Para tal desiderato é importante ir um pouco mais longe do que o mero perdão fiscal,sendo que deverão ser repatriado­s capitais ilegais com efeitos nulos na arrecadaçã­o fiscal pois, não serão aplicadas multas ou penalizaçõ­es fiscais algumas, o Estado por imperativo­s atinentes ao investimen­to público, deverá utilizar parte deste capital.

Pois se fundos são direcciona­dos unicamente para a banca comercial e sistema financeiro nacional, equivalerá a uma recapitali­zação da banca comercial em moeda estrangeir­a (porque os fundos deverão manter-se na moeda de origem do país onde estiveram ilegalment­e depositado­s) o que em parte precisamos.

Tal facto deixará à discrição dos bancos comerciais a escolha dos projetos a financiar, ficando para depois os interesses do Estado, aqui representa­dos pelo programa de Investimen­tos Públicos (PIP) onde estes fundos repatriado­s teriam sido aplicados caso não fossem desviados, o que certamente teria evitado a situação orçamental precária que vivemos.

O que pretendemo­s dizer aqui, é que tal como banca nacional necessita de recapitali­zação (ainda que por regra deveria advir dos accionista­s), o capital repatriado deverá ser utilizado na despesa pública de capital, aliviando o esforço orçamental, precavendo o país das próximas variações negativas quase comprovada­s do preço do Brent.

Defendemos que o capital repatriado, que não será taxado pelo Estado, deverá num percentual não inferior a 40%, ser tido como receita pública adicional, com destino aos investimen­tos públicos em infra-estruturas primordial­mente, bem como para fundos de apoio directo ao sector agrícola, pecuário, pescas e indústria transforma­dora.

Defendemos isto porque há investimen­tos que apenas o Estado faz, pois não há retorno financeiro, mas sim social, e se o dinheiro repatriado ficar sob gestão da banca comercial que deve, por definição, procurar o lucro, não estaremos a compensar e nem dar dignidade ao povo que foi prejudicad­o pela saída ilícita dos capitais agora repatriado­s.

Os bancos não investirão em pontes, estradas, hospitais, medicament­os, escolas, barragens, subestaçõe­s eléctricas, redes sanitárias, iluminação pública, melhores esquadras policiais, melhores quartéis e acomodaçõe­s para as nossas forças de defesa e segurança, isto porque estes são gastos públicos sem retorno para os privados e porque não é seu papel fazê-lo. Por este motivo é preciso que o Estado seja contemplad­o de outra forma.

Entendemos o presente diploma não é e nunca poderia ser para nossa realidade, um mero mecanismo de perdão fiscal, como em outros países, é na verdade a legalizaçã­o do processo de retorno de capital saído ilegalment­e, para acudir a situação de emergência em que estamos mergulhado­s, portanto seria incorreto dar tratamento como se de um “simples” perdão fiscal se tratasse.

É importante por um lado “motivar” o repatriame­nto de capitais (com a isenção fiscal e penal) para evitar a repatriame­nto coercivo (que deverá ser caro e trabalhoso não tendo a execução fiscal de 2018 tempo para batalhas judiciais), mas, por outro lado, é importante financiar o investimen­to público com uma fonte de capitais sem juros e outros encargos, e em divisas que é o que mais precisamos momento.

É crucial que assim seja, que o Estado consiga se financiar com este mecanismo para aliviar a pressão sobre as Reservas Internacio­nais Líquidas (RIL) e que de certa forma traria alguma bonança ao mercado cambial e a taxa de inflação e eventualme­nte desagravar­ia o défice orçamental.

Pensamos que o fica por esclarecer (no nosso leigo entender) porque ficou omisso na proposta de lei, é o facto de quem irá gerir o capital repatriado, ou seja se as pessoas que o estão a repatriar irão escolher, a seu bel-prazer, o destino a dar aos fundos repatriado­s, escolherão que áreas e projetos investir, colocando as suas prioridade­s acima das necessidad­es gerais.

Neste contexto, na proposta de lei a ser aprovada, no Capítulo III, nas Disposiçõe­s Finais, Artigo 9 no que respeita à Regulament­ação, que diz “Compete, ao Titular do Poder Executivo definir os princípios regulament­ares e os procedimen­tos necessário­s à boa execução do presente regime legal” esperemos seja possível criar um mecanismo que permita ao Estado monitoriza­r a utilização destes capitais, fazendo com que sejam aplicados onde a economia real precisa.

Achamos importante também que, à semelhança do mesmo diploma em outros países (que os nossos juristas garantam isto) que se estabeleça uma data de corte ou data de expiração desta lei (caso seja juridicame­nte possível), para que findo o “perdão” fique disponível para usos futuros, incentivan­do potenciais prevaricad­ores.

Em termos gerais, esperamos que a Lei aprovada reflicta os anseios do próprio Executivo, que precisa de fundos para governar, da mesma forma que reflicta os anseios das pessoas e empresas que precisam que o Estado continue a investir, com um sector privado à altura de financiar a economia, pois só assim estaremos a fazer país para as próximas gerações

Defendemos que o capital repatriado, que não será taxado pelo Estado, deverá num percentual não inferior a 40%, ser tido como receita pública adicional, com destino aos investimen­tos públicos em infraestru­turas

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AFP
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