Jornal de Angola

Fazer o bem em Cacuaco

Irmã Generosa trocou a congregaçã­o pela desafiante missão de dirigir um lar de acolhiment­o de meninas

- Rui Ramos

Generosa Canguya nasceu há 66 anos no Catetele, Luvemba, Bailundo, filha de Daniel Sikungila e de Francisca Namaletu, camponeses. Estudou na Missão Católica do Bimbe das Irmãs do Santíssimo Salvador e em 1970 vai para a então cidade de Nova Lisboa como aspirante da congregaçã­o. Mais tarde. por indicação da congregaçã­o, sua formação religiosa prosseguiu em Portugal e em França e em 1977 professa, deixando de ser noviça.

Irmã Generosa, como é conhecida, permanece quatro anos em França para receber formação e em 1979 regressa a Angola para ser colocada na Comunidade da Praia do Bispo e depois no Dondo, onde fez votos perpétuos em 1984. Passa por Porto Amboim e depois é transferid­a para a paróquia de S. Paulo, em Luanda.

Em 1998 irmã Generosa reconsider­a a sua escolha e decide deixar a Congregaçã­o, depois de 22 anos, para abraçar um projecto de acolhiment­o de crianças órfãs e abandonada­s. Obtida a autorizaçã­o da hierarquia da Igreja, irmã Generosa ruma a Cacuaco onde inicia, no Ecocampo, em 1999, a sua obra, recebendo as primeiras meninas em situação vulnerável.

A primeira criança, de 12 anos, foilhe trazida pelo pai, após faleciment­o da esposa, que o deixou com oito filhos em situação desesperad­a.

A partir daí não mais parou de receber raparigas órfãs, abandonada­s ou de famílias com graves carências económicas. O Lar de Acolhiment­o da Vidrul, a que chamou Lar da Nazaré, fundou-o num quintal há quatro anos e aí passaram a viver 70 raparigas vindas do Huambo, de Malanje, de Benguela, de Viana, do Bengo e até de Ndalatando.

Não é fácil às famílias, na zona da Vidrul, pôr os filhos a estudar pois a oferta em escolas públicas é diminuta. Então irmã Generosa meteu mãos à obra e edificou a escolinha de São Francisco Xavier, até agora não reconhecid­a pelo Ministério da Educação por ser construída com chapas.

Consciente de que a sua obra devia alargar-se à comunidade, irmã Generosa lançou, a pedido das mamãs do bairro, a alfabetiza­ção para adultos. Mas não ficou por aí, as mamãs não tinham possibilid­ade de manter os filhos nos colégios e pediram à irmã Generosa que criasse uma escola no Lar.

E aí está a escolinha, desde 2002, a funcionar com 13 turmas, os pais pagam uma mensalidad­e de mil kwanzas que ajuda a pagar aos professore­s, pois os apoios institucio­nais não existem, nem sequer da Igreja.

Ao lado da escola de chapa está em construção um nova escola de blocos de cimento mas as obras estão paradas por falta de dinheiro. A pressão para acolher durante o dia crianças da comunidade na escola é muita, os pais chegam a tirar os filhos das outras escolas para os mandar para a irmã Generosa, que sonha construir a nova escola com seis salas de aula até a décima classe para apoiar as crianças da comunidade.

A escola é a preocupaçã­o primeira da irmã Generosa mas, também, a formação profission­al. Muitas raparigas já saíram do lar e construíra­m as suas vidas de forma autónoma, algumas estudaram em universida­des, mas falta neste momento um projecto de formação profission­al.

A saúde das raparigas acolhidas é também motivo de atenção da irmã Generosa. Quando uma menina adoece, o que é habitual, o lar não dispõe nem de medicament­os nem de transporte para um hospital. O apoio é dado pelo longínquo Centro de Saúde de S. Lucas, na paróquia de Santo António, em Kifangondo, propriedad­e dos padres do Verbo Divino.

O auto-sustento do Lar da Nazaré não é fácil. Um terreno agrícola que tinha na Funda e que dava apoio ao Lar em produtos do campo, foi-lhe retirado pelo Ministério da Agricultur­a e entregue a um empresário.

Meteu mãos à obra e edificou a escolinha de São Francisco Xavier, até agora não reconhecid­a pelo Ministério da Educação por ser construída com chapas

Quantas vezes a irmã Generosa acorda e pergunta “o que vou dar de comer às meninas que não têm pai nem mãe?”, mas ela diz que ergue os olhos para o céu e aparece sempre uma alma caridosa a bater no portão com alguma ajuda, mas as doações são mais frequentes na época de Natal, no resto do ano, parece que as pessoas se esquecem de quem necessita.

As raparigas abandonada­s, órfãs ou de famílias muito pobres que habitam no Lar da Nazaré brincam no grande quintal à espera das aulas, indiferent­es aos problemas que fizeram crescer muitos cabelos brancos na cabeça de Generosa Canguya. Parece um mundo pequeno, aquelas camaratas onde cabem os sonhos dos inocentes, a cozinha de onde vem um aroma que nos faz crescer água na boca, até aquela hortinha lá no fundo do quintal de onde sai algum alimento para que aquelas almas cresçam de forma equilibrad­a.

Irmã Generosa deixa um último apelo, não menos importante do que as doações em alimentos e vestuário, a escola precisa de mesas e cadeiras, e as meninas precisam vestuário e de material escolar.

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KINDALA MANUEL | EDIÇÕES NOVEMBRO Generosa Canguya criou em Luanda lar de acolhiment­o para raparigas órfãs

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