Líbia recebe apoio para realizar eleições este ano
Mais de um milhão de líbios estão em idade de exercer o seu direito de voto nas primeiras eleições após Muammar Kadhafi
A comunidade internacional, representada pelas Nações Unidas e pela União Europeia, acompanhada nalguma medida pela classe política líbia, quer a todo o custo que se realizem, até ao fim do ano, eleições gerais no país.
Mas o problema que se levanta é que muitas organizações de ajuda humanitária que trabalham na Líbia são as primeiras a alertar para o facto do país ainda não estar em condições de ir a votos, temendo que quem vier a perder recorra novamente às armas. Para manter o seu quinhão de poder.
Passados que são pouco mais de seis a nos sobre a execução de Muammar Kadhafi, a Líbia permanece dominada por várias milícias que impõem pela força das armas a sua presença em determinadas zonas e regiões do país.
Nestes últimos seis anos muita gente morreu em consequência de violentos confrontos, tendo o país quase sido ocupado pelo grupo terrorista Estado Islâmico. Os políticos surgiram como emanações representativas de diferentes milícias armadas.
Em Outubro do ano passado, várias organizações internacionais que operam na Líbia disseram que o país estava a atravessar um momento particularmente difícil devido às disputas travadas no seio da sociedade entre os diversos grupos que querem consolidar as suas posições.
Nessa altura, as partes envolvidas no problema iniciaram um processo de discussão sobre a aplicação de eventuais emendas a um acordo que havia sido obtido em 2015, mas que na prática se encontrava paralisado por força da falta de vontade do governo em accioná-lo. Essas emendas previam, entre outras coisas, a organização de uma conferência nacional, de um referendo à constituição e a realização de eleições ainda para este ano.
Falta de união
Embora alguns observadores acreditem que as eleições podem unir as diferentes facções líbias, são mais os que consideram que a ida às urnas vai ainda cavar perigosamente mais fundo a divisão actualmente existente.
Uma máxima habitualmente utilizada para definir o conceito de “eleições boas”, diz que essas eleições serão tão mais pacíficas e justas, quanto maior for a maturidade dos políticos, melhor o funcionamento das instituições e mais seguras estiverem as suas estruturas para servir a nação e o povo. Acontece que, actualmente na Líbia, nenhuma destas prerrogativas está solidamente implementada correndo-se o risco de depois da realização das eleições se assistir a um ciclo de golpes de estado perpetrados por quem não for contemplado com o poder do voto.
Na lista dos potenciais candidatos na corrida para a presidência do país está o actual primeiro-ministro, Fayez alSarraj, o comandante militar que domina a região de Benghazi, Khalifa Haftar, surgindo ainda a possibilidade do filho do falecido coronel Kadhafi, Saif al-Islam Kadhafi, também se apresentar a votos.
Todos estes três potenciais candidatos apresentam “credenciais” diferentes. Se do ponto de vista político e da comunidade internacional, o actual primeiro-ministro parece levar alguma vantagem, não é de descurar os apoios populares de que desfruta o general Haftar, um homem que domina uma parte substancial do país, que fez frente aos jihadistas do Estado Islâmico e mantém uma guerra activa com diferentes grupos de milícias que operam na região de Benghazi.
Dos três, talvez o elo mais fraco seja o filho mais velho de Khadafi, uma personalidade controversa que chegou a ser dado como o sucessor natural do seu pai mas que, depois deste ter sido abatido, foi detido e chegou mesmo a ser dado como morto.
Saif al-Islam, caso avance com a sua candidatura, parece ter apenas garantidos os potenciais votos dos que ainda sonham com o regresso da Líbia aos tempos em que esta era governada pelo seu pai.
Muito pouco para os conturbados tempos que correm onde ainda prevalece, e muito, a vontade daqueles que contribuíram para a sua morte.
Mas para que a realização das eleições seja possível é também preciso que primeiro os tribunais resolvam o problema da constituição de transição, que foi aprovada em referendo popular mas logo a seguir legalmente contestada na justiça por um numeroso grupo de cidadãos.
Face a isto, o grande desafio que se coloca com urgência à nação líbia é conseguir, entre si, os entendimentos necessários para criar as condições de modo a que a ida às urnas, que a comunidade internacional quer obsessivamente apressar, não se torne em mais um obstáculo para a pacificação que todos deveriam desejar. Um dos problemas que se continua a colocar, e do qual poucos querem falar, é que ninguém sabe onde param as armas que a Europa entregou aos radicais.