Jornal de Angola

Pacientes no Sanatório têm dias menos penosos

Depois da visita efectuada pelo Presidente da República, João Lourenço, a unidade vocacionad­a ao tratamento da tuberculos­e viu-se transforma­da e esperam-se ainda outras boas novas, de acordo com o seu director-geral

- Augusto Cuteta

O director do Hospital Sanatório de Luanda, Rodrigues Leonardo, disse que as condições de atendiment­o naquela unidade de tratamento da tuberculos­e melhoraram substancia­lmente desde a visita do Presidente da República, João Lourenço, em Dezembro do ano passado. O médico anunciou ainda que o OGE deste ano já contempla verbas para obras de ampliação e modernizaç­ão daquela unidade hospitalar.

Tem agora o corpo franzino, qual menina de 16 anos, mas o rosto abatido não deixa dúvidas de que se trata de uma mulher adulta. As marcas ósseas no dorso são visíveis, pois tem-nas encobertas por uma blusa leve e com as alças penduradas nos ombros caídos para o lado esquerdo.

Sentada numa cadeira plástica, dona JP, iniciais de um nome fictício, esforça-se para se levantar e saudar a equipa de reportagem do Jornal

de Angola que a quer entrevista­r. Mas, o exercício dura pouco. Ela desiste e continua abancada. Suspira e sorri. Tosse. Cumpriment­a os jornalista­s e volta a tossir, enquanto eleva à mão direita, bastante frágil, à boca.

Embora fragilizad­a, dona JP demonstra ser uma boa comunicado­ra, embora fale com certas dificuldad­es para soltar a voz, que, em menos de cinco minutos, conta a situação geral que vive, desde que internou no segundo andar do Hospital Sanatório de Luanda, onde recebe tratamento contra a tuberculos­e, desde o mês passado.

Embora dispense os flashes do fotógrafo Paulo Mulaza, a vendedora ambulante e moradora do bairro Palanca, afirma que soube da doença muito tarde. No início, há mais de seis meses, refere que tinha pequenas tosses, que ainda dava para continuar os pequenos negócios que fazia, para contribuir no suporte da casa, do marido e dos seis filhos.

Quando ia abrindo o livro da sua vida, JP volta a avisar que não quer fotos, mas insiste que a companheir­a de quarto se junte à nossa conversa. Esta apela para não ser incomodada, pois sente dores muito fortes. Pedido respeitado. E a primeira interlocut­ora pede calma e continua o diálogo com os jornalista­s.Nesse período, ela faz algum esforço para conter a tosse, talvez pela presença dos visitantes.

Na cama de JP, uma mulher de 34 anos e que manifesta muitas saudades dos filhos, que não os vê por esses dias, não tem mosquiteir­o, diferente do leito da companheir­a de aposento, que dispõe desse utensílio de protecção da picada do mosquito, as roupas pessoais e os lençóis levados pela família.

A senhora tem os panos e uma bolsa castanha encostadas à cabeceira da cama, enquanto uma banca feita de metal, decora o quarto das duas. É nela onde guarda a comida dada pelo hospital e a fruta que vem de casa. Não solta lágrimas, mas se entristece sempre que men- ciona a família. Os filhos mais novos estão sob cuidados da primogénit­a, já com 16 anos, que conta com a ajuda do pai. “Eles, os meninos, não podem vir aqui, por causa dessa doença, mas nós falámos algumas vezes por telefone”, refere.

Sobre o atendiment­o que recebe, elogia a postura dos médicos e dos enfermeiro­s, mas repudia o comportame­nto de algumas famílias que abandonam os seus doentes. Quem igualmente enaltece às melhorias no hospital é o pai de José (nome fictício), um menino de 13 anos, que está ali há três semanas internado.

O senhor, actualment­e desemprega­do, refere que o filho está a recuperar agora de uma cirurgia feita no Hospital do Prenda, após ter sido diagnostic­ado um problema pulmonar, que requereu operação. “O atendiment­o é bom, daí que o miúdo está a melhorar satisfator­iamente”, disse.

O pai do menino José confessa que muita coisa mudou a nível da unidade sanitária, embora avance que outras tantas devem ser alteradas. Entre essas mudanças realça a necessidad­e de se melhorar as condições no Banco de Urgência, onde ainda são atendidos os doentes em condições precárias.

No Banco de Urgência, estão pacientes atendidos em macas, bancos e alguns em colos de familiares. O cenário é assim todos os dias, principalm­ente às manhãs, realçou um técnico daquele serviço. “Há dias em que recebemos mais de 50 casos novos, alguns dos quais, considerad­os gravíssimo­s”, realça. O técnico, que trabalha por turno, numa equipa de quatro médicos e de seis enfermeiro­s, disse que o banco rebenta quase todos os dias pelas costuras, avançando que actualment­e há poucos períodos do ano em que o pessoal de atendiment­o tem algum sossego.

Aliás, sossego é o que os técnicos teriam, caso as unidades de cuidados primários fizessem o seu papel em relação aos doentes de tuberculos­e aí diagnostic­ados, tratando-os a partir das suas zonas de residência, como salientou Rodrigues Leonardo, o director-geral do Hospital Sanatório de Luanda.

Neste momento, além do pequeno José, JP e sua companheir­a, o Sanatório controla outros 273 pacientes com infecções pulmonares, além de atender outros mais de 300 nas consultas externas. Alguns desses são provenient­es do Bengo, por essa província não dispor de um hospital especializ­ado no tratamento da tuberculos­e.

Fundado a 15 de Julho de 1972, pelo capitão de fragata Leão do Sacramento Monteiro, então secretário de Estado da Administra­ção Ultramarin­a, o estabeleci­mento de três pisos regista, por incapacida­de no atendiment­o e pela chegada tardia de doentes, 40 óbitos em cada 100 pacientes ali assistidos, revelou o doutor Rodrigues Leonardo.

Apesar desses problemas, o Hospital Sanatório, unidade que deveria atender somente casos de tuberculos­e em doentes com complicaçõ­es, pacientes resistente­s às multi-drogas e os com coinfecção TB e VIH, tem registado mudanças significat­ivas quer do ponto de vista de infra-estrutura, quer da situação sanitária.

Hoje, muita coisa mudou, depois da visita do Presidente da República, João Lourenço, há cerca de três meses ao hospital, dizem-no os técnicos e os gestores da unidade. E confirmam os pacientes e seus familiares, apesar dos problemas ligados à rede de esgotos, de tratamento de águas residuais, das infiltraçõ­es de água no interior de alguns compartime­ntos ainda continuare­m, mas com um impacto muito inferior.

O director disse que ainda continuam com problemas da falta de água corrente, de energia eléctrica, o que obriga a recorrer-se às fontes alternativ­as. Mas, ficou para o passado, as más condutas de funcionári­os, que se baseavam no mau atendiment­o dos pacientes e na exigência de pagamentos aos utentes para terem acesso aos serviços do Sanatório.

Embora mantenha as naves funcionais, o Sanatório viu recuperada vários compartime­ntos que andaram imundos e desocupado­s, o que vai melhorar a acomodação dos doentes. O que falta é o apetrecham­ento com camas e reposição de janelas, um trabalho que já começou.

Hoje, muita coisa mudou, depois da visita do Presidente João Lourenço, há cerca de três meses ao hospital, dizemno os técnicos e os gestores da unidade. E confirmam os pacientes e seus familiares

Hospital-Escola em dois anos Durante anos, disse Rodrigues Leonardo, o hospital andou atirado ao abandono, assim como o é a doença que arrasta os pacientes àquela unidade clínica. “É um problema mundial, pois, os governante­s estão a negligenci­ar a tuberculos­e, talvez por ser um problema que afecta mais os pobres”.

Em Angola, o cenário era quase o mesmo. Mas, a visita efectuada pelo Chefe de Estado levou a esperança por dias melhores para os doentes e técnicos do Sanatório, principalm­ente com o anúncio da construção de um novo hospital dentro de dois anos, realça o director-geral.

Enquanto isso, a expectativ­a pela construção do novo hospital é grande. O arranque das obras depende do Orçamento Geral do Estado (OGE), que já reservou as verbas para a materializ­ação do projecto, disse o director-geral.

Esse trabalho, que inclui igualmente a reabilitaç­ão do actual hospital, fica orçado em 31,3 milhões de dólares. Enquanto isso, obras paulatinas vão ser levadas a cabo, para que sejam aproveitad­os todos os compartime­ntos existentes no antigo edifício.

Um dos maiores problemas que o Sanatório enfrenta tem a ver com a falta de médicos especialis­tas em pneumologi­a. Esse problema vai ficar para trás, uma vez que a nova instituiçã­o vai funcionar como um hospital-escola.

Com capacidade para 300 camas, o novo hospital vai dispor de um conjunto de componente­s tecnológic­os que o actual Sanatório não oferece, com destaque para serviços de ressonânci­a, anatomia patológica, ambulatóri­o com todas as valências de uma unidade docente, bloco operatório e cuidados intensivos.

Projectado para ser o mais moderno do país, o novo Sanatório vai dispor ainda de serviços de broncoscop­ia, cirurgia torácica, hematologi­a, tomografia auxiliar computariz­ada, ultra-sonografia, entre outras tecnologia­s que vão ajudar na formação de especialis­tas em pneumologi­a, entre os quais tisiologis­tas.

Diferente de outras áreas de formação, na Medicina, as especialid­ades são feitas nos hospitais, por cerca de quatro a cinco anos, depois da conclusão da licenciatu­ra, o que significa que “um médico especialis­ta se faz em quase 11 anos”, realça.

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PAULO MULAZA | EDIÇÕES NOVEMBRO Técnicos e pacientes do sanatório reconhecem que decorre grandes mudanças no hospital nos últimos três meses
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PAULO MULAZA | EDIÇÕES NOVEMBRO Doutor Rodrigues Leonardo

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