Jornal de Angola

Sejamos moderados

- Carlos Calongo

Estamos para conhecer o concidadão que anda pelas ruas de Luanda e nunca se deparou com um cenário em que alguém, na elevação da sua arrogância, dirigiu-se para outrem nos seguintes termos: Sabes quem sou ? Tu me conheces? Queres perder o pão? Cuidado e não brinca com a tua vida!..

Mesmo que não sejam dirigidas a nós, directamen­te, está claro que assistir cenas do género roçam a mais elevada deselegânc­ia do ponto de vista da relação humana, fundamenta­da na razão do respeito mútuo como premissa para a sociabilid­ade dos indivíduos.

Motivações medíocres como a ostentação de um carro topo de gama, fatos de corte italiano ou francês e uns tantos adereços promovem, muitas vezes, a imagem de superiorid­ade sobre quem, no exercício do limite das suas competênci­as e posses, apenas prima por fazer a sua parte, mal entendida pelos que estatuíram nas suas mentes que a prioridade em tudo e por tudo é marca a eles reservada.

No exercício de elevada arrogância, muitas vezes nem mesmo os efectivos da Polícia Nacional, Forças Armadas e órgãos afins são poupados da arrogância de quem se julga acima das linhas orientador­as da convivênci­a social, e por esta via se fazem prisioneir­os da dialéctica do domínio e da servidão, como se isso fosse tão recomendáv­el como a cultura do respeito pelo outro, aliás, um princípio basilar da vida humana.

Nem perderemos tempo em reflectir sobre o tratamento reservado aos agentes das empresas de segurança privada, nunca vistos como um corpo com valor a considerar na sedimentaç­ão da sociedade enquanto espaço comum, em que o lugar de alguém delimita a cedência de espaço para o outro.

Os agressores/arrogantes, dificilmen­te compreende­m o outro como tema central na questão da interacção.

Interacção esta que se faz pura e realiza-se na partilha de competênci­as que cada um tem ao seu nível e deve dispôr para o projecto de sociedade adoptado como acção comum, desenhada como ideal do que se prossegue como formas de interacção regidas pela busca de um ser mútuo e racionalme­nte partilhado.

Quem isso não entende, pelo menos deve prostrar-se em aprender que o outro é o ser que eu não sou, e que a sua acção, por mais ínfima e demeritóri­a, no nosso pensamento, pode representa­r a âncora de complement­aridade do que julgamos ter de superior.

Tudo por que, defendem alguns sociólogos com os quais concordamo­s, é na recíproca surpresa da descoberta do outro que se funda o princípio da ética na convivênci­a do socialment­e aceitável, que dispensa qualquer intenção, por mínima que seja, de criar ódio funesto por outrem.

Deste princípio, urge a necessidad­e de afastar da nossa lida acções que de um tempo a esta parte nos parecem ter sido instituída­s como o triunfo da irracional­idade na vida humana, desvaloriz­ando-se o outro pelos meios materiais e outra espécie de esbajament­o nem tanto necessário para o que se recomenda na relação entre os seres humanos.

A preocupaçã­o na ordem do dia deve andar em torno de encontrare­m-se respostas definitiva­s para a arrogância que nos consome, quando até sabemos que a nossa estadia na face da terra é um exercício de peregrinaç­ão e que, até prova em contrário, nada levaremos para a outra dimensão da vida, em que ela, a vida, nada mais é senão aquilo que as letras ou palavra designam.

Sejamos moderados.

Urge de afastar da nossa lida acções que desde há um tempo nos parece terem sido construída­s como o trunfo da irracional­idade na vida humana, desvaloriz­andose o outro pelos meios materiais

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