Hospital de angustiados
É certo e sabido que a medicina moderna não consegue curar todas as doenças. Mas, pode o mesmo aplicar-se à democracia moderna, que tendo como base etimológica o sistema avançado no século V a.c. em Atenas, na Grécia, não conseguiu até hoje resolver a questão da participação alargada dos diversos estratos sociais africanos no poder instituído no pós-independência? Este, o problema da participação popular, é, sem sombra de dúvida, o cerne da solução da crise do Estado contemporâneo em África. Conclusão liminar a que chegamos perante a precariedade do desenvolvimento social e económico da maioria dos países africanos saídos desde os anos 60 do controlo das potencias coloniais.
Entre nós, a grande preocupação do momento insere-se nesta pergunta: que nova Angola será possível construir sobre as fundações multi-culturais da história, as esperanças frustradas de todo um povo, o sacrifício sem precedentes da juventude, os erros políticos e as ambições desmedidas das elites?
Com a subida de João Lourenço ao poder, assistimos a um reconhecimento de alguns erros económicos que o Governo se propôs combater e ao aprofundamento da análise das soluções para a crise social. Mas, eu continuo a defender que o MPLA e o Governo – independentemente de cooptar vozes discordantes para as mesas onde o Presidente da República absorve opiniões – estabeleçam um diálogo sério e reiterado, a vários níveis, com todas as outras forças que se movem neste hospital de angustiados que se tornou Angola depois de três décadas de guerra e do assalto desenfreado aos cofres do Estado. E uma destas forças são os intelectuais, estejam eles ou não enquadrados nalguma formação política.
A mim, o que me leva a lamentar estes 42 anos de independência, é o facto de nós, angolanos dotados de poder político ou militar, investirmos com a maior das facilidades contra o próprio irmão africano, como aconteceu com a guerra terminada no Moxico em 2002. E, terminada a guerra, como foram os nossos dirigentes capazes de delapidar os tesouro público e deixar a actual governação de cofres vazios? E se tivesse sido outro partido político tomar o poder nas eleições de 2017? Como iria governar, se o Governo saído do próprio partido que nos governa há 42 anos está perante uma crise financeira, que, só quem convive com os médicos do nosso país, pode ter noção, quando nos dizem que usam o próprio salário para comprar alguma fármacos de primeira necessidade, para não verem os pacientes morrer?
Hoje, o mundo está muito consumido. O efeito de estufa ameaça a sobrevivência do planeta. E nós, africanos, na pior das hipóteses, poderemos perecer, dentro de alguns séculos, nessa hecatombe mundial, sem termos usufruído do esforço da nossa contribuição para o progresso de toda a Humanidade.
A maior parte da população não tem água potável nem electricidade regularmente. Mesmo os que habitam na zona nobre da cidade têm de fazer recurso a geradores. E o saneamento básico é uma catástrofe, no centro da cidade capital, capaz de, com estas chuvas, lançar-nos para outra epidemia de cólera ou de febre amarela. Ide ali por detrás da Igreja dos Remédios, no beco da antiga Sonangol – mãe das nossas desgraças – e contemplai a montanha de lixo que se ri na nossa cara de desditosos africanos.
É certo e sabido que a medicina moderna não consegue curar todas as doenças. Mas, o ser humano é um ser racional, dotado de inteligência. Por isso, pode mudar o curso da história.
E mudar o curso da história angolana, passa, sobretudo, pela saída urgente da mais alta esfera de decisão política partidária de quem, tendo já governado, escreveu em Angola uma história de arrepiar os cabelos dos doentes que estão acamados no Hospital Américo Boavida, sem meios para serem atendidos.
E o saneamento básico é uma catástrofe, no centro da cidade capital, capaz de, com estas chuvas, lançar-nos para outra epidemia de cólera ou de febre amarela. Ide ali por detrás da Igreja dos Remédios, no beco da antiga Sonangol – mãe das nossas desgraças – e contemplai a montanha de lixo que se ri na nossa cara de desditosos africanos