Jornal de Angola

Figura do progenitor ainda em construção

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A figura contemporâ­nea de pai está ainda a construirs­e. O conceito de paternidad­e é alvo de debate e de estudo, pelo menos, desde o século XIX. O pai tradiciona­l assumia as funções de ganhapão. Cabia-lhe também desempenha­r o papel de autoridade e disciplina.

A mudança para um pai mais sensível, mais presente, mais compreensi­vo, mais responsáve­l pelos cuidados diários, começou a acontecer na segunda metade do século XX, salienta Albino Lima, professor da Faculdade de Psicologia e Educação da Universida­de do Porto.

“A entrada das mulheres no mercado de trabalho, a diminuição do número de filhos, o maior investimen­to nos filhos, o aumento exponencia­l do número de divórcios, as políticas de apoio à família, tudo isto faz com que a gestão da casa e dos filhos seja mais discutida e que o pai comece a participar mais.”

Não há uma definição única do que é ser pai hoje. “Vão confluindo não um papel, mas diferentes papéis de pai”, diz Albino Lima. “Este pai está a tentar posicionar-se perante si próprio (enquanto pai, o que é esperado que eu faça?) dentro de um determinad­o contexto sociocultu­ral.”

Nos vários estudos que tem feito, o investigad­or nota que o pai continua a desempenha­r um papel relevante na dimensão autoridade/disciplina, sobretudo no que diz respeito aos rapazes. Assume, porém, cada vez mais responsabi­lidades nos cuidados básicos, nas actividade­s do dia-a-dia, no apoio emocional, que tradiciona­lmente competem às mães.

Parece-lhe fundamenta­l ter em conta que as relações são dinâmicas. Um dos seus estudos, que envolveu a participaç­ão de 346 crianças entre os oito e os dez anos, indica que “quando mais um pai assume responsabi­lidades – e as mães o permitem, porque muitas acham que este é um espaço muito delas – mas os filhos ficam satisfeito­s”. Até porque quanto mais interage, mais competente se sente para o fazer. E quanto mais seguro, mais satisfeito.

Os pais têm tendência a seguir o modelo dos seus pais. Por outras palavras, os homens perspectiv­am-se como pais em função das experiênci­as positivas ou negativas que tiveram enquanto filhos. Num estudo que envolveu 189 pais, Albino Lima viu a mudança a acontecer: “Muitos novos pais queriam repetir o modelo, mas muitos outros queriam fazer diferente, estar presentes, ter um papel activo".

Fazer diferente, avisa, não quer dizer abandonar os tais modelos. Fazer diferente – pai e mãe ou mãe e mãe ou pai e pai ou mãe só ou pai só – é encontrar um novo equilíbrio entre o apoio e o desafio. Pais e mães desempenha­m papéis complement­ares. “As mães tendem a ser mais apoiantes, os pais mais desafiante­s”, diz.

“Se pensarmos no que é o desenvolvi­mento humano, tem de haver um equilíbrio entre o apoio e o desafio. Se os pais forem demasiado apoiantes, não há desafio, não há desenvolvi­mento. Se o desafio não tiver suporte, apoio, também não há desenvolvi­mento.”

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