Jornal de Angola

Embarcação espanhola detida com imigrantes

O drama afecta diariament­e centenas de imigrantes provenient­es de países africanos com destino à Europa

- Victor Carvalho

Uma embarcação espanhola está impedida de abandonar o porto de Pozzalon, na Sicília (Itália), por estar a ser acusada de associação com a imigração ilegal de cidadãos do Norte de África para a Europa.

As autoridade­s italianas, que ordenaram a retenção da referida embarcação, suspeitam que, pelo menos, 216 imigrantes provenient­es da Líbia possam ter desembarca­do naquele porto, o que contraria uma decisão que anteriorme­nte haviam tomado e comunicado, que obrigava a que o navio regressass­e à Líbia com todos os passageiro­s.

Este episódio reacende a polémica entre as organizaçõ­es humanitári­as que trabalham no resgate de imigrantes africanos em perigo na travessia entre o Norte de África e as águas territoria­is da União Europeia.

Este caso começou quando na semana passada a Guarda Costeira italiana identifico­u duas embarcaçõe­s em perigo para a organizaçã­o Proactiva Open Arms, que prontament­e accionou a sua embarcação para o local e socorreu os imigrantes.

Depois, o Governo de Roma avisou a ONG de que a Guarda Costeira líbia assumiria o comando das operações, tendo esta enviado um barco para a zona situada a 73 milhas do litoral líbio.

Depois do alerta italiano, a organizaçã­o espanhola recusou entregar os imigrantes aos líbios, alegando que estes sofreriam represália­s no seu país onde correriam mesmo o risco de vida. “O resgate do navio é preventivo, mas somos acusados de associação criminosa e de fomentar a imigração ilegal por desobedece­rmos aos líbios, não lhes entregando os passageiro­s”, disse o fundador da ONG, Oscar Camps.

Vida ou morte

Para os imigrantes, a diferença é grande: quando as operações de resgate são coordenada­s pela Itália, eles são levados para este país. Quando as tarefas são dirigidas desde Tripoli, os migrantes retornam para a Líbia, de onde eles querem a todo o custo fugir. Por isso, e apesar das ameaças da Guarda Costeira líbia, a ONG recusou-se a transferir para o barco líbio os imigrantes que tinha acabado de resgatar, dirigindo-se desse modo para Norte, em direcção à costa italiana.

“Impedir o resgate de vidas em perigo em alto-mar com o fim de devolvê-las à força a um país inseguro - como é a Líbia - (...) contraria o Estatuto dos Refugiados da ONU”, sublinhou Oscar Camps na sua conta no Twitter.

De acordo com as suas declaraçõe­s, o navio andou dois dias à procura de um porto para desembarca­r os passageiro­s, depois de sucessivas recusas para entrar nas águas territoria­is da União Europeia, aparenteme­nte por se ter recusado a devolver os imigrantes às autoridade­s líbias.

Na última sexta-feira, o barco conseguiu finalmente acostar num porto de Malta, mas apenas para proceder à evacuação urgente de um bebé e da mãe que precisavam de atendiment­o médico especializ­ado.

No dia seguinte, finalmente, quase já sem combustíve­l, o barco, já escoltado pela guarda costeira italiana, foi obrigado a acostar na Sicília. No domingo, a tripulação recebeu uma ordem assinada por um juiz que impede o navio de se fazer ao mar até que esteja concluída uma investigaç­ão ao capitão do navio, ao fundador e ao coordenado­r da organizaçã­o Proactiva Open Arms.

Segundo o juiz, a organizaçã­o é acusada de ter violado um acordo internacio­nal que obrigava a que os imigrantes fossem entregues às autoridade­s líbias, visto terem sido estas a solicitar a intervençã­o do navio.

Ouvido pela imprensa italiana, o advogado que representa o comandante do navio disse que o único crime que pode ser imputado à tripulação é o de solidaried­ade para com pessoas que “fogem do inferno”.

De acordo com a mesma imprensa, o juiz que está a coordenar esta investigaç­ão é o mesmo que há um mês perdeu um processo no qual queria estabelece­r uma ligação entre organizaçõ­es que trabalham na ajuda aos imigrantes que atravessam o mar entre o Norte de África e a Europa e o tráfico de seres humanos.

Nunca é demais recordar que nos últimos quatro anos mais de 600 mil imigrantes provenient­es do Norte de África chegaram a Itália pelo mar, facto que foi prepondera­nte para o triunfo obtido nas recentes eleições italianas, onde a aliança anti-imigração do centro direita conseguiu a maioria de votos no parlamento.

Esse resultado, aliás, não augura nada de bom para os africanos que ainda sonham continuar a ter na Itália a porta de entrada para a Europa.

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DR Barco com centenas de migrantes retido em águas da Sicília por indícios de ligações ao tráfico

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