Agricultura não é lazer
HERANÇA AGRÍCOLA DA RAINHA NJINGA
Uma revista angolana publicou no final de 2017 uma entrevista com um dirigente de uma empresa pública nacional, na qual afirmou ter como lazer a actividade agropecuária.
Numa outra publicação, nas redes sociais, um conceituado jornalista afirmou: “Quero realizar o sonho de ir fazer uma lavra na minha terra natal e reformarme por lá, em paz e ligado à Internet”.
Tudo foi dito como se se tratasse de uma actividade que é associada à reforma ou ao ócio.
Por outro lado, foi noticiado, durante o mês de Março do corrente ano, o arranque de mais um ano lectivo no Instituto Médio Agrário Joaquim Kapango, em Benguela, sem no entanto possuir um laboratório especializado. A instituição forma técnicos nas especialidades de produção animal e vegetal.
Nos últimos anos, a fatia do Orçamento Geral do Estado (OGE) para a agricultura não chega a um por cento, para não tecer outros exageros, tal são os 10 por cento de valor mínimo assumido pelos chefes de Estado e de governos africanos, reunidos em Moçambique, em 2003.
Apenas Burkina Faso, Etiópia, Guiné, Malawi, Mali, Níger, Senegal e Zimbabwe têm honrado esse compromisso e são a prova de que este tipo de investimentos pode resultar em melhorias na vida dos seus cidadãos. Por exemplo, no Burkina Faso, o crescimento do sector agrícola tem estado acima de 6 por cento ao ano, há já algum tempo, e parece estar no bom caminho para a eliminação dos altos índices de fome e de extrema pobreza.
As situações expostas e outras não reportadas por imperativo de tempo e espaço, impelem-nos a uma análise séria e preocupante do problema, levando, no entanto, a questionar, com bastante tristeza, o que estaria a passar-se com os cidadãos angolanos.
No contexto de crise, parece-me existir um desinteresse quase generalizado por parte dos angolanos na produção dos seus próprios alimentos, respeitando algumas excepções que permitem que chegue até à nossa mesa alguma produção local e que haja excedente de alguns tubérculos e banana que, regra geral, deixaram de ser importada, há tempo.
De várias partes do Mundo chegam alguns exemplos e, em alguns casos, verifica-se até mesmo algum excesso de zelo. De qualquer forma, alguns exemplos ajudam a uma rápida e melhor reflexão. A Etiópia quer atingir até 2025 o estatuto de país com uma economia de rendimento médio. Para tal, foram feitas sérias apostas na agricultura e hoje o país é um dos maiores produtores do continente em gergelim (semente de sésamo) e criação de gado. * O autor é responsável pela revista angolana “Arena Agropec”