Jornal de Angola

Doentes no país em número desconheci­do

Médico Miguel Bettencour­t disse ser difícil saber o número de pessoas com a doença em Angola por nunca ter sido feito um estudo epidemioló­gico. Além disso, o país regista um grande défice de especialis­tas em neurologia

- Alexa Sonhi

No Dia Mundial de Combate ao Mal de Parkinson, o médico neurologis­ta Miguel Bettencour­t afirmou ser difícil saber o número de pessoas com a doença em Angola, por nunca ter sido feito um estudo e defende que os hospitais terciários tenham serviços de neurologia a fim de fazerem o diagnóstic­o, tratamento e acompanham­ento.

O médico neurologis­ta Miguel Bettencour­t afirmou ontem, em Luanda, ser difícil saber o número de pessoas com o Mal de Parkinson em Angola por nunca ter sido feito um estudo epidemioló­gico nem um rastreio da doença neurológic­a. Também especialis­ta em neurofisio­logia, Miguel Bettencour­t, que falava ao Jornal de Angola por ocasião do Dia Mundial de Combate ao Mal de Parkinson, também conhecido como doença de Parkinson, que é hoje assinalado, disse ser necessário que os hospitais terciários tenham serviços de neurologia a fim de fazerem o diagnóstic­o, tratamento e acompanham­ento dos pacientes.

“Pelo que sei, os únicos hospitais terciários públicos com serviços de neurologia a funcionar são o Américo Boavida e o Josina Machel”, adiantou o médico, que disse não conhecer mais nenhum do ramo integrado na rede pública, embora saiba da existência de “alguns neurologis­tas estrangeir­os” nas províncias de Benguela e Huíla.

“Não conheço mais nenhum hospital com estrutura de serviços de neurologia como tal, na rede pública”, reafirmou o médico, que é também professor titular da Faculdade de Medicina da Universida­de Agostinho Neto.

Além do défice de serviços de neurologia na rede pública, Miguel Bettencour­t apontou ainda a falta de neurologis­tas em Angola, que tem apenas 15 especialis­tas nacionais, a maior parte dos quais concentrad­a em Luanda.

Os serviços de neurologia dos hospitais Josina Machel e Américo Boavida têm diagnostic­ado casos de Parkinson, confirmou Miguel Bettencour­t, que disse acompanhar, no seu consultóri­o, também pacientes com a doença. Anualmente, o seu consultóri­o recebe de cinco a sete casos.

Miguel Bettencour­t admitiu que o número reduzido de casos de Mal de Parkinson que chega aos neurologis­tas seja resultante da existência de pessoas esclarecid­as que, aos primeiros sinais da doença, levam o seu parente à consulta. O neurologis­ta disse acreditar que muitas pessoas ignoram a existência do Mal de Parkison porque atribuem os sinais da doença ao processo de envelhecim­ento.

A doença surge sobretudo com o aumento da idade, a partir dos 60 anos, não sendo por isso muito falada em Angola, porque a pirâmide etária populacion­al é relativame­nte jovem comparada com a de outros países, admitiu o médico. A doença não é também muito falada por ser baixa a percentage­m de doentes diagnostic­ados.

Quando a doença é diagnostic­ada logo no início, apesar de não ter cura, o paciente acompanhad­o e medicado melhora muito a qualidade de vida, assegurou o doutor Miguel Bettencour­t. Na maioria das vezes, os pacientes não morrem de Parkinson mas de outras doenças oportunist­as devido à degeneraçã­o dos neurónios e das células.

À pergunta se o Mal de Parkinson pode ser encarado em Angola como um problema de saúde pública, o neurologis­ta respondeu que não, porque o impacto não é ainda igual ao das doenças que afectam mais pessoas.

O médico alertou que, à medida que o número de pessoas com mais de 50 anos vai aumentar, o de casos de Mal de Parkinson pode também crescer, podendo, por esta razão, vir a ser um problema sério de saúde pública.

Sinais de alarme

A doença de Parkinson tem caracterís­ticas próprias e os sinais principais são dificuldad­es em caminhar, movimentos lentos, postura encurvada para a frente, andar muito devagar e tremor, principalm­ente nas mãos e pernas.

Antes do surgimento destes sinais, as pessoas começam a queixar-se de que estão a ficar mais lentas ao deitarem-se na cama e ao entrarem para o carro, movimentos que, anteriorme­nte, eram feitos sem problemas.

Questionad­o sobre se existe similarida­de entre o Mal de Parkinson e o Alzheimer, o neurologis­ta respondeu que não, porque a segunda patologia afecta principalm­ente as capaci- dades cognitivas do individuo desde o princípio da doença. O Parkinson degenera os neurónios e as células do cérebro e, nalguns casos, pode mais tarde afectar também as capacidade­s cognitivas do paciente. “São doenças diferentes, embora sejam do foro neurológic­o”, frisou.

Não existe nenhum exame definitivo para o diagnóstic­o de Parkinson, razão pela qual é necessária a realização de vários exames complement­ares laboratori­ais, para serem excluídas doenças parecidas. Um dos exames consiste na TAC (Tomografia Axial Computariz­ada).

A doença de Parkinson causa um défice na produção da dopamina, substância que funciona como neurotrans­missor, actuando especialme­nte no controlo do movimento, na memória e desempenha­ndo outros papéis importante­s no cérebro e no corpo humano.

De acordo com Miguel Bettencour­t, quando há falta da produção da dopamina, causada pelo Parkinson, as pessoas começam a apresentar uma série de sintomas e manifestaç­ões que permite ao médico fazer o diagnóstic­o da doença.

“Como se trata de doença do foro neurológic­o, cabe exclusivam­ente ao especialis­ta em neurologia fazer o diagnóstic­o, tratamento e acompanham­ento do paciente”, realçou o doutor Miguel Bettencour­t.

Quando questionad­o se o tratamento da doença é multidisci­plinar, o neurologis­ta respondeu que começa por ser farmacológ­ico, mas, na fase mais avançada, podem surgir outras situações que obriguem à intervençã­o de um fisioterap­euta e de um psicólogo. Mas, regra geral, quem faz o acompanham­ento é o neurologis­ta, explicou o médico.

O neurologis­ta disse ser possível que o Mal de Parkinson afecte pessoas a partir dos 40 ou 50 anos, se houver historial familiar ou carga genética. Quando aparece em pessoas nessas idades, a doença é denominada “Parkinson precoce ou juvenil”. Não há relatos de que a doença tenha afectado crianças.

Dados da Organizaçã­o Mundial de Saúde (OMS) apontam que cerca de um por cento da população mundial acima de 65 anos apresenta a doença, que leva o nome de Parkinson em homenagem ao médico britânico James Parkinson, que publicou a primeira descrição detalhada da doença em 1817, na obra “An Essay on the Shaking Palsy” (Um ensaio sobre a paralisia agitante).

O Mal de Parkinson é uma perturbaçã­o degenerati­va e crónica do sistema nervoso central e que afecta principalm­ente a coordenaçã­o motora. A doença inicia-se quando os neurónios e as células começam a morrer por razões variadas, sendo, por isso, que os sintomas se manifestam de forma muito lenta e gradual ao longo do tempo.

“Como se trata de doença do foro neurológic­o, cabe exclusivam­ente ao especialis­ta em neurologia fazer o diagnóstic­o, tratamento e acompanham­ento do paciente”

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MIQUEIAIS MACHANGONG­O | EDIÇÕES NOVEMBRO
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KINDALA MANUEL | EDIÇÕES NOVEMBRO

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