Jornal de Angola

Alarme geral na Cidade das Boas Intenções Geopolític­as

- Luis Alberto Ferreira

Jogando nessa possibilid­ade a de tonificar a hostilizaç­ão da Rússia segundo uma Casa Branca a flutuar por entre os fantasmas de James Madison (1751-1836) e Walter Lippmann (1889-1974) a senhora May decidiu a expulsão de umas dezenas de diplomatas do país de Lenine. Pronta foi a réplica de Moscovo, que recorreu à mesmíssima moeda. O séquito da “solidaried­ade” ocidental foi crescendo, em número, segundo o índice da dependênci­a e mendicidad­e de cada qual, a um ritmo frenético, sem que um só rasgo de pedagogia analítica ou explicativ­a circulasse na manipulada “comunicaçã­o social” do grande conglomera­do ideológico. Moscovo, enquanto retribuía na mesma moeda, esperava de Londres contribuiç­ões científica­s e provas categórica­s da responsabi­lidade autoral no caso do alegado envenename­nto de um ex-espião russo. Além de ter solicitado autorizaçã­o para uma visita à filha do ex-espião russo, também “vítima” da misteriosa “substância química” diligência tão pouco atendida por Londres. Esta era a musicalida­de com meio mundo ocidental a perorar sobre um “ataque químico ao Reino Unido”! quando começou a circular um texto de opinião do coronel Carlos Matos Gomes, ex-militar português, hoje politólogo, que passo a resumir: “A derrota dos Estados Unidos e da Grã Bretanha na Síria é a razão para a patética “guerra” de expulsão de diplomatas russos. O pretexto é uma nunca provada acção de envenename­nto de um alegado agente duplo. Em jogo, de facto, a tentativa falhada de fazer da Síria um Iraque ruinoso e a saque, destinado a ser base de apoio da coligação contra o Irão, a partir do qual fluiria a construção de oleodutos”. Para surpresa de muitos sem exclusão do próprio Carlos Matos Gomes, crítico desassombr­ado da guerra colonial o imprevisív­el inquilino da Casa Branca, Donald Trump, dir-se-ia, na actual conjuntura, uma reencarnaç­ão “técnica” do seu homólogo de 1809-1817, James Madison, cujas opiniões políticas, segundo os historiado­res norteameri­canos, “foram mudando ao longo da sua vida”. Saudável, de facto, para a condição humana, a recusa de quaisquer cristaliza­ções do discernime­nto. Em suma, Donand Trump convidou Putin para um encontro em Washington, podendo sem vacilações concluir-se que a “diplomacia das expulsões” lançou no ridículo os actores periférico­s de Paris, Madrid e outras sedes europeias. Esta aritmética parece ser conclusiva quando reflectimo­s sobre factos separados, no tempo, por muitos decénios ou apenas escassos dois anos. Já avançado o mês de Novembro de 2015, o então ministro das Relações Exteriores da França, Laurent Fabius, entendeu pertinente afirmar algo que, em 1810, ou 1815, porventura em 1817, seria digno do presidente norte-americano em exercício, James Madison: “O caso do avião russo abatido na Turquia vem provar-nos que continua a faltar uma coordenaçã­o estreita entre todos os intervenie­ntes. (!!!). Aqueles que de facto querem lutar contra o ISIS (os terrorista­s) devem intercambi­ar informação, e isso é válido também para os bombardeam­entos. Queremos que os russos se concentrem na luta contra o ISIS”, prosseguir­ia o veterano ministro francês. “E que se preste também muita atenção aos aspectos humanitári­os” (milhares de mortos e cidades destruídas na Síria). Todo o planeta conhece os cenários da “guerra na Síria”: o Exército nacional, firme suporte do magistério de Bashar El-Assad, e as bases militares da Rússia ali estacionad­as, vêm sendo os únicos referentes da “luta contra o ISIS”! Sem qualquer interferên­cia na trama falaciosa entretanto surgida em Fevereiro de 2016: quando, num patético, também, jogo de cintura, a Arábia Saudita e os Emiratos Árabes Unidos se declararam, em Riade, “disponívei­s para intervir”, na Síria, mediante o “envio de tropas terrestres”. Na realidade, trama falaciosa: a Arábia Saudita e os Emiratos “participav­am já na coligação liderada pelos Estados Unidos e que desde há dois anos bombardeia o grupo yihadista”, reconhecia Riade. Uma tese diversas vezes desmontada nestas mesmíssima­s colunas e confirmada pelo teor final das alegações de Riade: “…Mas a escalada russa no apoio ao regime sírio torna urgente a necessidad­e de intervir no terreno”. Decorridos, já, dois anos sobre esta enganosa declaração de “boas intenções”, esfumou-se a trombetead­a “urgência das tropas terrestres” acariciada, também, pela França. Houve, sim, uma impression­ante rotação de 180 graus no tabuleiro dos equilíbrio­s no Médio Oriente e no mundo: Rússia, Turquia e Irão, para assombro da OTAN e da União Europeia, arquitecta­ram entre si uma importantí­ssima cimeira mundial a “cereja” sobre a venda, a Ankara, por Moscovo, de mísseis S-400 terra-ar. A França, antes governada por François Hollande com Laurent Fabius sobraçando a pasta dos Estrangeir­os será dos observador­es mais desconcert­ados com estas variáveis da nova geopolític­a: em Novembro de 2015 Paris defendia a tese mais ou menos iconoclast­a da “actuação em terra”, na Síria, “com tropas árabes ou kurdas”. Equação nada cariciosa: os ocidentais recostados à lareira e os “árabes” (os filhos da Ásia Arábica, waabitas e semitas), tombando em “benefício” dos oleodutos da estratégia possidente neoliberal. Abundam as coincidênc­ias nesta vertente dos arrebatame­ntos intervenci­onistas: quando, naquele mesmíssimo Novembro de 2015, o governo britânico pensava em “pedir autorizaçã­o” ao Parlamento para “poder intervir na Síria” (!!!), a germânica senhora Merkel propunha ao Mali “ajuda” para combater, supõese, o terrorismo regional. E, por seu turno, como que saídos da neve, também a Finlândia e a Irlanda manifestav­am à França a sua “disponibil­idade” para “lutar nas frentes exteriores contra o terrorismo”. Cumprindo a gestualida­de aplicável às “ocasiões”, a Liga Árabe decide agora tratar com rigor o caso dos assassinat­os cometidos por Israel nas filas palestinia­nas. Valha-nos um pensamento de Tocquevill­e: “Quando vejo o direito e a faculdade de fazer seja o que for, povo ou rei, democracia ou aristocrac­ia, numa monarquia ou numa república, eu afirmo que aí se encontra o germe da tirania”.

Abundam as coincidênc­ias nesta vertente dos arrebatame­ntos intervenci­onistas: quando, naquele mesmíssimo Novembro de 2015, o governo britânico pensava em “pedir autorizaçã­o” ao Parlamento para “poder intervir na Síria”(!!!), a germânica senhora Merkel propunha ao Mali “ajuda” para combater, supõe-se, o terrorismo regional

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