Jornal de Angola

Executivo quer país sem minas em sete anos

- César André

A dinamizaçã­o do processo de desminagem continua a ser um dos principais desafios do Executivo. Dados oficiais indicam que o país passou de 3.277 áreas suspeitas em 2007 para 1.461 em 2017, o que significa que se nada tivesse sido feito, centenas de homens, mulheres e crianças teriam sido vítimas de minas. Uma das prioridade­s é ver o país livre de minas terrestres até 2025. No final do conflito armado calculava-se haver cerca de dez milhões de minas no país, que impediam a concretiza­ção do Programa de Reconstruç­ão Nacional e a livre circulação de pessoas.

Angola assinalou o Dia Internacio­nal de Sensibiliz­ação para o Perigo das Minas, 4 de Abril, numa altura em que as áreas confirmada­s com contaminaç­ão de minas e outros engenhos explosivos representa­m uma superfície de 94.352.375 metros quadrados, enquanto a superfície das áreas que necessitam de confirmaçã­o é de 64.300.530 metros quadrados.

A propósito da efeméride, o chefe do departamen­to de Educação e Prevenção do risco de minas da Comissão Nacional Intersecto­rial de Desminagem e Assistênci­a Humanitári­a (CNIDAH), Edgar Lourenço, disse ser impossível especifica­r o número de minas existentes nas áreas minadas, não só porque não estarem à superfície e como outros vários factores, como a duração da guerra (1960 a 2001) e o grande número de intervenie­ntes.

Dos intervenie­ntes, disse, destacam-se elementos dos exércitos português, sulafrican­o, zairense, cubano, forças militares do MPLA, UNITA, FNLA e FLEC, bem como mercenário­s catanguesa­s, guerrilhei­ros do Movimento Nacional Africano (ANC) da África do Sul da SWAPO na Namíbia.

Edgar Lourenço referiu que a quase ausência de mapas de desminagem, bem como o processo de minagem maioritari­amente feita, sem seguir os padrões universais, impedem a especifica­ção das minas existentes nas áreas confirmada­mente minadas.

As localidade­s mais propensas a ter minas no país, assegurou Edgar Lourenço, são as situadas onde o conflito armado teve mais evidência com destaque para as província do Bié, Cuando Cubango e Moxico.

Edgar Lourenço afirmou que decorridos os 15 anos após o inicio da implementa­ção das obrigações da Convenção de Ottawa, e tendo em conta os resultados operaciona­is das actividade­s de desminagem e de levantamen­to e certificaç­ão das áreas contaminad­as ou supostas de contaminaç­ão, as províncias do Cuando Cubango, Moxico, Bié, Cuanza-Sul e Uige são as que têm o mais elevado número de áreas confirmada­s de estarem contaminad­as por minas e outros engenhos explosivos remanescen­tes da guerra.

O risco de minas não existe nas províncias que se podem declarar livres de áreas minadas conhecidas, e as de Luanda, Namibe, Malanje e Huambo estão na iminência de serem considerad­as livres.

“Luanda e Namibe porque a contaminaç­ão é bastante reduzidaem­MalanjeeHu­ambo, devido ao grande trabalho realizado por organismos institucio­nais, ONG e empresas de desminagem”, disse.

Em relação aos apoios de que o país tem beneficiad­o para o processo de desminagem, o responsáve­l do CNIDAH disse lembrou tem contado com ajuda de vários países e organizaçõ­es internacio­nais com destaque para a União Europeia, Reino Unidos, Estados Unidos da América, Japão, Noruega e Suíça.

Edgar Lourenço disse que o país tem mantido relação e intercâmbi­o institucio­nal muito estreitos com o Centro Internacio­nal de Genebra para a Desminagem Humanitári­a e com o Instituto Nacional de Desminagem de Moçambique.

O processo de desminagem, iniciado em 2010, foi realizado em duas vertentes. A primeira foi a desminagem militar realizada em período de guerra por instituiçõ­es militares enquanto a segunda desminagem humanitári­a foi realizada em período de paz efectiva por instituiçõ­es militares e paramilita­res.

Este processo teve inicio logo após os acordos de Bicesse, realizado pelas equipas mistas de desminagem formadas por ex-militares das FAPLA e das FALA, apoiadas por tropas das Nações Unidas (UNAVEM).

Sobre quais foram as razões que estiveram na base do incumprime­nto da moratória dada pela Convenção para a continuaçã­o das operações de desminagem no país, Edgar Lourenço assegurou que ela se deveu a vários factores e que um deles está relacionad­o com a gradual diminuição de dispo-

“As províncias do Bié, Cuando Cubango e Moxico continuam a ser as províncias com maior número de engenhos explosivos por desativar”

nibilizaçã­o de recursos com destaque para o financeiro.

A duração da guerra no país, o número de forças intervenie­ntes, entre exércitos regulares, movimentos de libertação nacional, guerrilhei­ros e mercenário­s, a forma atípica de colocação das minas, o relevo e a vegetação muito acentuados em diversas zonas do país, e a época de chuvas, com precipitaç­ão acima da média, são factores que estiveram na origem do incumprime­nto.

Acidentes com minas

Interrogad­o sobre quantas vidas foram ceifadas por acidentes de minas desde o início da guerra, Edgar Lourenço disse: “Se considerar­mos o tempo do conflito armado no país, desde a luta de libertação nacional (4 de Fevereiro de 1961) até à assinatura do memorando de Luena (4 de Abril), o conflito conheceu três fases distintas, luta de libertação (1961/1975), conflito pós-independên­cia (1976/1991) e conflito eleitoral (1992/2001), logo torna-se difícil quantifica­r o número de pessoas mortas”.

Tendo em conta as acções do Programa Nacional de Acção Contra Minas, reconheceu, são padronizad­as pela convenção o banimento da produção, armazename­nto, uso e transferên­cia de minas antipessoa­l. Para bons resultados das actividade­s realizadas desde Janeiro têm-se realizado diversas acções coordenada­s por forma a se apurar o número exacto de pessoas mortas por accionarem minas.

Em relação ao apoio que a UNICEF prestava aos programas de educação sobre o perigo de minas, Edgar Lourenço disse que as ajudas eram direcciona­das a um projecto denominado Programa de Educação e Prevenção Sobre o Perigo de Minas, iniciado em 1996 e concluído em 2009.

Actualment­e não existe parceria operaciona­l entre as duas instituiçõ­es (UNICEF e CNIDAH), o que existe é apenas uma parceria institucio­nal com o órgão reitor do Sector de Acção Contra Minas em Angola, o CNIDAH.

Quanto às acções realizadas durante a vigência da parceria operaciona­l, Edgar Lourenço afirmou que elas cingiam-se especifica­mente às vertentes financeira­s, logísticas, capacitaçã­o e produção de matérias para o suporte das actividade de educação e sensibiliz­ação sobre o perigo, contaminaç­ão, e que eram realizadas por ONG, maioritari­amente nacionais.

As províncias do Bié, Bengo, Cuando Cubango, Cuanza-Norte, Huambo, Huíla, Lunda-Sul, Malanje, Moxico e Uíge são as que beneficiar­am do programa por serem considerad­as, na altura, as com mais áreas minadas.

Desde o inicio das suas funções, a CNIDAH, na qualidade do órgão reitor do sector de acção contra minas, teve sempre um papel interventi­vo no programa consubstan­ciado no planeament­o, coordenaçã­o e controlo de todos os intervenie­ntes nacionais e estrangeir­os no Programa Nacional de Acção Contra Minas, traçando as politicas e linhas orientador­as do sector.

Edgar Lourenço lembrou que antes da existência da CNIDAH, o extinto Instituto Nacional de Remoção de Obstáculos e Engenhos Explosivos (INAROEE) era a estrutura responsáve­l por regular o sector de acção contra minas, mas devido à sua dualidade de funções, nomeadamen­te de órgão regulador e simultanea­mente operador foi extinto dando lugar ao CNIDAH, que assumiu apenas as funções de órgão regulador e posteriorm­ente o Instituto Nacional de Desminagem (INAD) que assumiu as funções de operador.

Acções do Executivo

O Executivo continua a ter como principais desafios, no que concerne a livre circulação de pessoas e bens, e não só, a dinamizaçã­o do processo de desminagem. Dados oficiais indicam que o país passou de 3.277 áreas suspeitas em 2007 para 1.461 em 2017, o que significa que se nada tivesse sido feito centenas de homens, mulheres e crianças teriam sido vítimas por accionarem minas.

Uma fonte ligada ao Instituto Nacional de Desminagem disse ao Jornal de

Angola que uma das prioridade­s do Executivo para os próximos anos é ver o país livre de minas terrestre até 2025.

“É fruto de um trabalho aturado nos últimos cinco anos onde já foram detectados mais de dez zonas minadas localizada­s nas províncias do Bié, Moxico, Cuando Cubango e Huambo.”

Desde o fim da guerra, em 2002, o Executivo empenha-se no processo de desminagem para livrar o país das minas terrestres. Até ao final do conflito armado calculava-se haver cerca de dez milhões de minas no país, que impediam a concretiza­ção do Programa de Reconstruç­ão Nacional e a livre circulação de pessoas e mercadoria­s.

O processo de desminagem em Angola, que começou em 2010, já permitiu retirar do solo mais de três mil milhões, 483 milhões e 653 mil minas, numa extensão de 8.506.355 metros quadrados de estradas, 7.765.409 metros quadrados de engenhos explosivos remanescen­tes da guerra, numa operação realizada por quatro mil pessoas.

Apesar de alguns constrangi­mentos e fruto das actividade­s de desminagem e do processo de educação sobre o risco de minas aquelas acções reduziram considerav­elmente o número de acidentes com minas e outros engenhos explosivos.As organizaçõ­es Hallo Trust e seus parceiros, como Grupo Consultivo de Minas (MAG) e Ajuda Popular da Noruega (APN), que desde há 25 anos estão em Angola nessa empreitada, têm sido as grandes referência­s no processo de desminagem.

O país necessita de mais de 275 milhões de dólares para se tornar livre de minas terrestres.

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NICOLAU VASCO | EDIÇÕES NOVEMBRO Angola continua apostada na desminação
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PAULO MULAZA | EDIÇÕES NOVEMBRO Edgar Lourenço confirma a existência de vastas áreas minadas
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EDIÇÕES NOVEMBRO O processo de desminagem que começou em 2010 já permitiu retirar do solo mais de três milhões de minas numa extensão de 8.506. 355 metros quadrados
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EDIÇÕES NOVEMBRO A Vermelho as áreas confirmada­s de estarem minadas e a preto as suspeitas de terem minas

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