A maka dos “atrasados”
O preâmbulo é sobejamente conhecido: Com o ecoar da perturbação económica que nos aflige, decorrente da queda acentuada e prolongada do preço do barril de petróleo entre 2014 e 2017, a economia nacional tem conhecido uma preocupante contracção da actividade empresarial com impactos na estrutura macroeconómica:
Assistimos, pois, ao aumento expressivo das taxas de inflação, à redução significativa das Reservas Internacionais Líquidas (RIL) e à degradação dos indicadores do sector fiscal. Decorreu disso uma redução substantiva da capacidade do Governo para fazer face a algumas das suas responsabilidades, contribuindo para a acumulação de atrasados no pagamento aos fornecedores do Estado em diversos sectores. Da construção à saúde, dos governos provinciais à educação e órgãos de defesa e segurança, tornando comum notarmos que muitas obras foram interrompidas ou nem sequer iniciadas e vários serviços foram paralisados, porque os fornecedores deixaram de abastecer.
Por isso, desde 2014, várias empresas sentem o sufoco por terem nascido, muitas delas eivadas de vícios perniciosos e vocacionadas exclusivamente ao abastecimento ou prestação de serviço a entidades públicas. Assim, grande parte destas chamadas “empresas do OGE” não tiveram alternativas para resistir à conjuntura, ao contrário de outras, onde, não obstante o impacto dos atrasados nos seus resultados, continuam a fazer face às necessidades do mercado.
O dilema dos atrasados apresenta, por isso, impacto sobre toda a estrutura da economia nacional, pois por um lado assistimos ao aumento do endividamento público por incapacidade de o Estado honrar estes compromissos; por outro lado, a vitalidade das empresas é posta em causa pelo seu impacto nos resultados financeiros, pela incapacidade para pagar salários e os devidos impostos ao Estado.
Diante de uma realidade assim, o Estado, e muito bem, não pode estar insensível: dado o seu impacto económico e social e à luz dos diferentes programas, está a implementar a Estratégia de Regularização de Atrasados de 2014-2017. Recentemente, o Ministério das Finanças, dadas as suas responsabilidades na actual conjuntura, anunciou o pagamento deste passivo, mas não se fica por aqui.
Na apresentação da Estratégia, a secretária de Estado das Finanças e Tesouro (SEFT), Vera Daves de Sousa, explicou exaustivamente os seus pilares, diferindo-se o Pilar I para a Resolução da dívida registada no SIGFE de 2014 a 2016; o Pilar II para a Resolução das dívidas contratualizadas não registadas no SIGFE e o Pilar III com as Medidas de Prevenção.
Ora, a parte mais delicada na abordagem dos atrasados prende-se com a parcela não registada no SIGFE, decorrente de diversos factores. A estimativa total de atrasados não registados no sistema supera um bilião de kwanzas (cerca de USD 5 mil milhões), relativos a mais de 1700 reclamações de prestadores de bens e serviços. As dívidas em causa, segundo anunciou a SEFT, serão regularizadas mediante a emissão de títulos, mas só após o processo de certificação (para apuração do valor e da conformidade legal), negociação e assinatura de acordo.
Claramente, a entrega destes valores tem de ser feita de modo a combinar os objectivos da política fiscal com a política cambial e monetária. Assim, entre as formas de pagamento, há uma facilidade de pagamentos em dinheiro (para dívidas abaixo dos 500 milhões de kwanzas) e a Emissão de Obrigações do Tesouro Não Reajustáveis (para dívidas com valor acima dos 500 milhões de kwanzas). E não é tudo. Há também a possibilidade de fazer-se recurso aos mecanismos de compensação fiscal e compensação com créditos em bancos públicos.
Não basta ao Estado pagar, o Executivo deve tirar lições para prevenir a acumulação de dívidas (na forma dos atrasados) e acabar com estes ciclos, agravados em momentos de crise. Para impedir o regresso destas bolhas cancerígenas impõe-se uma disciplina implacável da execução das regras orçamentais e a sua responsabilização. No tempo novo, será fundamental contratar apenas em função das reais disponibilidades e pagar oportunamente. O empresariado também deve aprender, pois a sustentabilidade dos negócios é mais importante que a ganância ou a euforia pelo lucro rápido e fácil.
Finalmente, conforme nos ensina a magistral filosofia de Hannah Arendt, no seu livro “A Condição Humana”, o homem revela-se nos seus discursos. Valorizando a boa-fé expressa nas intenções da Estratégia a que nos referimos, temos todas as razões para acreditar que há um novo estímulo à economia nacional. O Estado, como sucede na justiça, também nos pagamentos, atrasa-se mas paga.
Ora, a parte mais delicada na abordagem dos atrasados prende-se com a parcela não registada no SIGFE, decorrente de diversos factores. A estimativa total de atrasados não registados no sistema supera um bilião de kwanzas (cerca de USD 5 mil milhões), relativos a mais de 1700 reclamações de prestadores de bens e serviços