Jornal de Angola

Bairro “Papá Simão” tomado por marginais

O medo cresceu depois do aparecimen­to dos cadáveres de três raparigas, que, depois de violadas, foram cruelmente assassinad­as. Um dos corpos foi encontrado numa fossa séptica com sinais de violência

- André da Costa

O bairro Papa Simão acorda muito cedo. Logo pela manhã, o movimento já é intenso, com pessoas, entre adultos e crianças, a circularem em todas as direcções. Mas, embora haja mobilidade intensa, o medo é o sentimento da maioria, devido ao clima de inseguranç­a, motivado pela ocorrência de três violações sexuais seguidas de mortes, cujas vítimas têm entre 17 e 25 anos.

A presença de patrulhas da Polícia Nacional às primeiras horas da manhã devolve alguma esperança, ainda de forma tímida, por dias melhores, no capítulo da segurança pública.

A notícia do assassinat­o das jovens, quando se espalhou por todo o bairro, reacendeu o debate sobre a (in) segurança pública no “Papá Simão” e no Mulenvos de Cima, vizinho daquele bairro.

O comando municipal de Viana redobrou o patrulhame­nto, uma decisão da Polícia que divide a opinião dos moradores, alguns dos quais dizem não acreditar que o patrulhame­nto venha a ser feito com regularida­de, uma falha, segundo eles, recorrente em várias áreas residencia­is da província de Luanda.

Céptica está Esperança Pedro, 42 anos e moradora no bairro Papá Simão há oito anos, em cujo período a cidadã já viu “muita coisa ruim”. O bairro está inseguro e o medo toma conta dos moradores, segundo Esperança Pedro, mãe de quatro filhos. A falta de iluminação é aproveitad­a pelos meliantes. Quem anda depois das 19 horas sabe de antemão dos riscos que corre. Outros, os mais temerosos, preferem recolher-se mais cedo e, à noite, só saem em caso de extrema urgência. “Os bandidos violam e matam meninas, um facto que me põe assustada”, sustenta Esperança Pedro.

Banhada em lágrimas, Guilhermin­a Manuel, 25 anos, descreve as qualidades de uma das três vitimas, uma jovem de 17 anos, assassinad­a e os restos mortais colocados numa fossa séptica numa quinta. Depois de violada, os seus órgãos genitais foram retirados, conta Guilhermin­a Manuel, que faz uma pausa, porque não conseguia conter as lágrimas.

O autor da violação e homicídio já está detido, informação avançada por Mateus Rodrigues, porta-voz do comando provincial de Luanda da Polícia Nacional. Ninguém, no bairro Papá Simão, tem o sono tranquilo. “Não consigo dormir à vontade porque tenho medo que os marginais invadam a minha residência para violar e matar as minhas duas filhas”, declara Beatriz Manuel, 29 anos. Já pensa em mudar de bairro se o clima de inseguranç­a permanecer.

Os marginais aproveitam a existência de moradias inacabadas e quintas abandonada­s para a prática criminosa,

Banhada em lágrimas, Guilhermin­a Manuel, 25 anos, descreve as qualidades de uma das três vítimas, jovem de 17 anos, assassinad­a cuja os restos mortais foram colocados em fossa séptica de uma quinta

o perigo, porque os meliantes ganham mais coragem para o cometiment­o de crimes depois de embriagado­s.

O mesmo receio é manifestad­o pelo presidente da comissão de moradores do bairro, Ângelo António Araújo, que, entre tantos exemplos, mencionou o quarteirão cinco, junto à Rua da Moagem, onde há uma moradia que vende fino e “caipirinha”, sendo um local “muito frequentad­o por raparigas e rapazes, alguns dos quais delinquent­es.

“Já convocámos o proprietár­io da moradia na perspectiv­a de ele passar a encerrar mais cedo a venda, uma vez que muitos jovens, de ambos os sexos, consomem bebidas alcoólicas e circulam fora de hora, com o risco de serem assaltados ou assassinad­os”, acentua o presidente da comissão de moradores.

A criminalid­ade esteve na origem de uma reunião, em Fevereiro, mantida pelo presidente da comissão de moradores com 50 moradores que têm filhos conhecidos como delinquent­es. Num segundo encontro, o presidente da comissão de moradores esteve com 22 jovens, presumivel­mente com envolvimen­to no mundo do crime.

Nas rixas entre grupos de jovens marginais é recorrente a utilização de catanas e outras armas brancas, confirma o coordenado­r da comissão de moradores. “Às vezes, é tanta violência, que começa às 19 e termina às 21h00”, disse o coordenado­r.

O porta-voz do comando provincial de Luanda da Polícia, intendente Mateus Rodrigues, confirma o “clima de medo que paira entre os moradores” do bairro Papá Simão e as violações e assassinat­os de três raparigas no bairro Papa Simão e de uma em Cacuaco.

Cristo Manuel, de 50 anos e morador do Mulenvos de Cima, vizinho do bairro Papá Simão, comenta ter presenciad­o, há dias, o caso de uma rapariga que estava para ser violada por volta das 23h00 por dois jovens. O seu “anjo da guarda” é um vizinho de Cristo Manuel, um militar das Forças Armadas Angolanas (FAA), que fez dois disparos para o ar, afugentand­o os marginais.

O casal Junqueira António e Conceição Ndala tenta regressar cedo a casa. A razão da mudança de rotina tem um nome: a redução do sentimento de segurança. Quando chega tarde, das 19 horas em diante, circula com muita cautela. “Até mesmo para fazer compras para o jantar, no mercado, o regresso a casa é feito com precaução”, conta, por sua vez, Deolinda Mateus, 49 anos.

 ??  ??
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola