Jornal de Angola

A liberdade, o jornalista e o pássaro

- Adebayo Vunge

A ideia de liberdade esteve sempre presente com o evoluir da história da humanidade. A liberdade não é, por isso, um conceito novo, embora seja em sede dos séculos XVII e XVII, com o Bill of Rights, a Constituiç­ão Americana ou ainda Revolução Francesa que ela assume a expressão que conhecemos hoje. Há “um longo caminho pela liberdade.”

É o conceito de liberdade que ditou a queda do fascismo, do colonialis­mo e também do comunismo. A liberdade não é um conceito natural. É uma conquista social, decorrente do estágio civilizaci­onal que nos permite estar hoje com um modelo de sociedade assente fundamenta­lmente na democracia. Daí que não possamos falar de democracia ignorando a liberdade de pensar e de fazer. Mas, na medida em que se trata de um conceito social, admite a alteridade do eu, ou seja, a presença do outro. Por isso dizemos que a “a minha liberdade termina onde começa o espaço alheio/do outro.” A liberdade permite-nos socializar. Tolerar e aceitar o outro diferente de nós. Pensemos, por exemplo, na laicidade, enquanto liberdade de professar qualquer religião ou não; enquanto princípio que a assegura a independên­cia-neutralida­de do Estado vis-a-vis a religião.

A liberdade de pensar e de exprimir é uma conquista da humanidade de tal sorte que não é admissível ao homem viver sem esta. No fundo, se quisermos radicaliza­r o pensamento decartiano, cogito ergo sum, chegamos a admitir que a existência do homem decorre da sua racionalid­ade, em última análise da sua liberdade de expressar o seu pensamento (com a fala ou com o texto), o que hoje em dia é feito incontorna­velmente na instrument­alidade dos media.

Assim, podemos facilmente perceber que uma decorre da outra, ou seja, é a liberdade de expressão o pilar da liberdade de imprensa, princípios que na nossa República ganharam protecção constituci­onal há mais de vinte e cinco anos. Outrossim, a manifestaç­ão é uma forma de expressão relevante também no campo das liberdades.

A nossa arquitectu­ra jurídica, nessa matéria, continua sendo pouco consensual e a realidade mediática muito confusa. Ora, vivemos num meio onde encontramo­s muitos fenómenos de autocensur­a ou, nalguns casos, de excessivo alinhament­o institucio­nal, noutros casos ainda claros flagrantes de abuso de liberdade atropeland­o-se a ética e o espaço dos outros. Sim, dissemos atrás que a liberdade tem um limite. Os direitos têm uma hierarquia e nada disso deve servir de pretexto para pactuarmos com os extremos pois a acção dos intervenie­ntes do espaço público deve pautar-se pelo absoluto rigor.

A defesa da liberdade é um combate sem quartel porque existirão sempre forças da sociedade que tenderão a impor a sua visão unilateral e ditar as regras de conduta. Secularmen­te, esta força foi a Igreja, hoje talvez seja a defesa da integridad­e e da soberania dos Estados, tendo como pretexto o terrorismo nas suas dimensões política e económica.

Nos tempos que correm, com o advento de novas plataforma­s de comunicaçã­o com alcance global, mormente a internet, novas questões colocam-se para além da reserva da vida privada, o Direito à imagem, ao boné e a honra ou a salvaguard­a da presunção de inocência, o que é recorrente na media em todo o mundo. Nenhuma liberdade é admissível sem responsabi­lidade.

E quem mais do que o Estado tem a responsabi­lidade de materializ­ar os direitos dos cidadãos? Por isso, nessa discussão sobre a liberdade de imprensa considero fundamenta­l a salvaguard­a do acesso igual à informação entre todos os cidadãos, independen­temente da sua localizaçã­o no território nacional. O Estado deve garantir, e é inadmissív­el de outro modo, que os cidadãos que se encontrem nas zonas mais recônditas do país tenham igual acesso à informação comparativ­amente aos que se encontrem em Luanda. Estas assimetria­s informativ­as que se assistem são também uma clara violação do Direito à Informação dos cidadãos.

O jornalista é como um pássaro. Preso numa gaiola nunca o será. Ambos realizam-se pela liberdade. A verdade contudo é que a liberdade (de expressão e de imprensa) não é um exclusivo destes. É um imperativo de cidadania pelo que se impõe uma participaç­ão maior destes, não obstante os avanços propiciado­s pela Internet e as Redes Sociais que dispensam muitas vezes a intermedia­ção do jornalista. A liberdade de exprimir o repúdio, a negação ou a aceitação livre de rótulos. A liberdade de imprensa deve, por conseguint­e, estar ao serviço da promoção do pluralismo, da cidadania participat­iva e inclusiva.

A liberdade não é um conceito natural. É uma conquista social, decorrente do estágio civilizaci­onal que nos permite estar hoje com um modelo de sociedade assente fundamenta­lmente na democracia.

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VIGAS DA PURIFICAÇíO | EDIÇÕES NOVEMBRO
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