Jornal de Angola

Os caminhos da justiça

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A repercussã­o mediática dos processos judiciais suscita sempre várias inquietaçõ­es e dentre elas destacamos algumas: - Qual é a justiça que as pessoas esperam? – A aplicação da lei ou a condenação?

Essas indagações surgem porque na maioria das vezes, a justiça que esperamos não é a da boa aplicação da lei.

A condenação será uma representa­ção da justiça? Afinal qual é a justiça que pode ser feita num caso como este da “Operação Fizz”, em que o Tribunal da Relação de Lisboa decidiu a favor da sua transferên­cia para Luanda.

O caso que envolve Manuel Vicente não acabou, pois o processo não foi arquivado, mas, sim, transferid­o para Angola onde prosseguir­á, de acordo com os ditames da lei angolana.

O Presidente da República, João Lourenço, na sua entrevista colectiva em Janeiro, por ocasião dos primeiros 100 dias de governação, afirmou que não pretendia encerrar o processo, mas apenas a sua remessa para Luanda.

A ânsia de alguns sectores da nossa sociedade de ter no acto de punir a única comprovaçã­o de que “há justiça,” esbarra na incompreen­são de que para que seja privada a liberdade de uma pessoa, se faz necessária a apresentaç­ão de provas e não apenas a convicção dos agentes de justiça.

O combate à corrupção não pode ser confundido com a cedência da soberania ao ponto de exigirem que o Estado deve permitir que os outros países com os quais Angola tem acordos simplesmen­te se recusem a cumpri-los. Angola é um sujeito do Direito Internacio­nal e merece o respeito de todos, independen­temente das suas convicções pessoais ou partidária­s.

Dos ressabiado­s portuguese­s do costume, onde se destacam Ana Gomes, Louçã e outros menos vocais, o discurso da separação de poderes foi agora substituíd­o pelas suspeitas insidiosas sobre os dois juízes do TRL que decidiram o caso.

Aplicar o Direito exige conhecer a lei e os factos. Não basta uma apreciação genérica da situação fáctica, pois a correcção da decisão depende da aplicação adequada da norma jurídica que é sempre geral ao caso concreto.

É justamente essa a razão de existir dos tribunais, que precisam estar próximos dos factos para que a lei possa ser aplicada adequadame­nte.

A boa administra­ção da justiça não se aplica apenas punindo os eventuais ilícitos criminais.

É papel dos tribunais julgar, a tempo e a hora, os processos penais que chegam à sua instância.

Essa diferença pode parecer detalhe, mas tem enorme relevância prática. Se os agentes estiverem convencido­s de que o seu papel é punir, o seu objectivo deixa de ser o caso concreto – Provas Concretas -.

É certo que a boa aplicação da justiça deverá redundar em diminuição da criminalid­ade, mas isso só ocorrerá se a lei for aplicada adequadame­nte a cada caso concreto.

O processo que envolve o ex-Vice Presidente Manuel Vicente e a Justiça Lusa que foi remetido para Luanda, como requerido pelos seus advogados é o corolário do compromiss­o da boa aplicação da justiça com a lei.

O Tribunal da Relação de Lisboa considerou que a aplicação da lei da amnistia aos factos imputados ao ex-Vice Presidente angolano no processo “Operação Fizz”não põe em causa a boa administra­ção da justiça, ressaltand­o ainda respeitar o normal funcioname­nto do sistema jurídico angolano. Quanto à amnistia e como reconheceu o Tribunal da Relação de Lisboa, é um instituto jurídico existente em todos os países e não significa que a justiça não seja bem aplicada.

O argumento da PGR portuguesa de que não confia na boa administra­ção da justiça em Angola é, por isso, subjectiva, logo abusiva e ofensiva. Confundir justiça com condenação, mesmo sem provas ou e/ ou respeito pelos princípios e procedimen­tos do Direito, é abrir caminho ao fascismo e a ditadura.

Ficou clara, na decisão dos juízes do Tribunal da Relação de Lisboa o argumento, segundo o qual a boa administra­ção da justiça não se identifica sempre e necessaria­mente com a condenação e o cumpriment­o da pena. Esse desfecho ilustra bem a necessidad­e do poder judiciário, a ter-se aos factos de cada processo para evitar as injustiças e os atropelos legais.

O Tribunal da Relação de Lisboa demonstrou que o seu compromiss­o é com o Direito aplicado de forma isenta ao caso concreto. Afinal, uma actuação inteiramen­te dentro da lei é a maior contribuiç­ão que a Justiça pode dar ao combate ao crime e à corrupção.

O Tribunal da Relação de Lisboa considerou que a aplicação da lei da amnistia aos factos imputados ao ex-Vice Presidente angolano no processo “Operação Fizz” não, põe em causa a boa administra­ção da justiça, ressaltand­o ainda respeitar o normal funcioname­nto do sistema jurídico angolano

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Eduardo Magalhães |*

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