“Somos um produtor de paz e de segurança, Angola também é”
Somos um produtor de paz, sim. Angola também é. Quando Angola está a comandar uma força de interposição no Lesotho, está a impedir que a instabilidade possa propagar-se a outros teatros de operações. Quando Portugal aceita uma missão muito arriscada na República Centro Africana estamos a salvar vidas, como aconteceu recentemente em Bangui. Lançaram um ataque a granada numa igreja cheia, matam dez pessoas, uma delas o sacerdote. Se não vão os pára-quedistas portugueses repelir o ataque, as pessoas morriam todas.
Este tipo de missões é diferente das do Afeganistão, por exemplo….
No Afeganistão estamos a garantir, com a força de reacção rápida, a segurança do Aeroporto. Espero que não tenhamos de disparar contra ninguém. Temos também um grupo, de 35 homens, que vai formar militares afegãos nas áreas mais técnicas, por exemplo na artilharia. Também neste caso estamos a promover a paz. Se o Afeganistão for mais sólido, ter mais democracia, menos ataques e menos terroristas a fazerem-se explodir, há mais paz ali, na Europa, Portugal incluído. Quando Portugal está, com a sua Força Aérea, a fazer mais de 500 horas de voo no Mali em condições muito difíceis, ou a treinar no Mali, na missão da União Europeia, os snipers das futuras Forças Armadas daquele país, estão a promover a paz. Não podemos aceitar que as defesas hoje se façam do lado de cá das nossas fronteiras. Angola não se defende nas suas fronteiras terrestres, mas projecta a sua defesa. Sabe que hoje em dia, se acontecer algo num país, é como o sarampo. Por exemplo na RDC, se houver mais paz, é melhor para Angola. Trava o fluxo de imigração ilegal. De cada vez que há violência, e aconteceu no Ruanda, além daquela coisa horrenda que é o genocídio, a região ficou a ferro e fogo. Quando o Chade estava em guerra, era a RCA que sofria. Quando trabalhamos nestas missões, estamos a respeitar os direitos humanos, a respeitar o direito da guerra e, fazendo isso, estamos a proteger pessoas. Hoje ninguém se defende sozinho. Na minha opinião só há um Estado capaz de se defender sozinho: os Estados Unidos. Qualquer outro Estado precisa de cooperar, trabalhar em conjunto com organizações internacionais e com os Estados.
Há decisões que a NATO toma e Portugal segue sem a autorização das Nações Unidas…
Pode dar um exemplo…
No Iraque…
A missão que está no Iraque chama-se coligação antiDaesh, não é da NATO.
Mas a decisão para atacar o Iraque foi tomada em Portugal?
Não, a decisão já estava tomada. Em 2003, houve a cimeira dos Açores, e é bom dar-nos este protagonismo. Mas também estou à-vontade, porque sempre considerei que a intervenção era ilícita, segundo o Direito internacional. O senhor Presidente da República nunca apoiou. Por isso é que nunca enviou militares das Forças Armadas para combater no Iraque. Foi a solução encontrada. Se me diz se tenho pena que isso tenha acontecido no meu país, digo que tenho. Nunca escondi o que achava da intervenção militar no Iraque.
Isso não atrai o terrorismo a Portugal?
Até hoje não aconteceu, felizmente. Aparentemente não há uma relação causa e efeito entre uma coisa e outra. Neste momento devemos ter mais de mil militares projectados internacionalmente. Um número enorme para um país como Portugal. Entre o fim do mês de Abril e 15 de Maio partiram 400 homens.
É o primeiro governante português a visitar Angola, depois do fecho do “Caso Manuel Vicente”. Porque que ficou surpreendido por ter sido recebido pelo Presidente João Lourenço?
Eu disse que fiquei surpreendido ou os jornais portugueses é que disseram? Tem de perguntar aos jornais portugueses.
Então não é verdade?
Não falei com os jornais portugueses sobre este assunto. Foi uma interpretação dos jornais e eles é que têm de explicar porque fizeram esta interpretação. Como pode imaginar, à hipótese de um encontro com o Presidente da República não sou dos que vão aos jornais para anunciar. Respeito muito o jornalismo, a imprensa. Ninguém pode acusar-me de ser contra a liberdade de imprensa, mas não posso estar a contar tudo aos jornais. Quando se propiciou esta hipótese, tive um enorme gosto de ser recebido pelo Sr. Presidente da República e trocarmos opiniões com total normalidade amiga, que é aquilo que conta nas relações entre dois Estados. A minha visita representa quase o culminar de um processo muito feliz. Resolvemos os assuntos em que estávamos a divergir, sem cada um de nós fazer algo de errado. O problema que tínhamos, resolveu-se e isso é um motivo de muita alegria. Tive o privilégio de estar aqui na altura em que isso se concretizou.