Trabalho infantil é realidade mundial
ORGANISMOS INTERNACIONAIS REFORÇAM COMBATE
O Instituto Nacional da Criança (INAC) registou de 2016 até ao primeiro trimestre deste ano, 1.075 casos de crianças vítimas do trabalho infantil. A pobreza, a desestruturação das famílias e a violência doméstica são apontadas como as principais causas que levam as crianças ao sector informal da economia. O director-geral adjunto do INAC, Paulo Kalesse, disse que muitas crianças começam a trabalhar a partir dos dez anos. Em declarações ao Jornal de Angola, a propósito do Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil, que hoje se assinala, Paulo Kalesse explicou que as medidas para contornar este quadro passam pela sensibilização das famílias e a responsabilização criminal dos pais e encarregados de educação que envolvem os filhos no trabalho infantil.
O trabalho infantil em Angola, por circunstâncias históricas e factores conjunturais, tem sido uma realidade frequente no mercado de trabalho informal. Muitas crianças abandonam a escola e dedicam-se ao trabalho forçado, para ajudar no sustento das suas famílias.
Dados do Instituto Nacional da Criança (INAC) referem que, no período de 2016, até ao primeiro trimestre deste ano, foram registados 1.075 casos de crianças vítimas de trabalho infantil.
Os números tendem a aumentar a cada dia que passa, situação que preocupa as autoridades, numa altura em que se comemora hoje o Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil, data instituída, em 2002, pela Organização Internacional do Trabalho, uma agência da Organização das Nações Unidas (ONU).
O director-geral adjunto do INAC, Paulo Kalesse, reconhece que em Angola as crianças exercem actividades forçadas, e apontou como principais causas a desestruturação familiar, pobreza e a violência doméstica em que muitas delas são vítimas, além do consumo excessivo de álcool por parte dos seus progenitores.
Paulo Kalesse disse que no país a actividade é exercida por menores com idades que variam entre os 10 e 17 anos. Sublinhou que para se contornar o actual quadro é necessário que se faça um trabalho de sensibilização junto das famílias para a mudança de atitudes.
"Pensamos que é importante que haja harmonia nos lares, para evitar a violência, envolvimento voluntário de crianças no trabalho. Outra medida está ligada à responsabilização criminal dos pais e encarregados de educação que envolvem os seus filhos em trabalho infantil exploratório", disse.
Para travar e desencorajar estas práticas, o Ministério da Administração Pública, Trabalho e Segurança Social (MAPTSS) tem promovido seminários em várias províncias do país, para elucidar as entidades empregadoras sobre o cumprimento da legislação laboral.
O Inspector-Geral adjunto do Trabalho, Vacile Agostinho, considerou de extrema importância a realização de acções que visam à sensibilização e responsabilização de entidades empregadoras no que se refere à contratação, conteúdo e as condições aplicáveis ao trabalho de menores. Vacile Agostinho esclareceu que nos últimos dois anos foram registados oito casos de menores a trabalharem nos sectores da Agricultura e Indústria nas províncias do Cuanza-Sul e Luanda.
Referiu que a Lei Geral do Trabalho estabelece que menores só podem entrar para o mercado de emprego a partir dos 14 anos, mas desde que sejam autorizados pelos pais ou tutores legais.
“Os menores que se encontram dentro da economia informal e que têm menos de 14 anos são classificados como trabalho infantil, que é proibido em Angola. Este mal deve ser combatido, através de acções de sensibilização de diferentes órgãos, nomeadamente, o Ministério da Acção Social Família e Promoção da Mulher, Polícia Nacional e o Instituto Nacional da Criança (INAC)”, disse.
Para o responsável, os menores de 14 anos colocados na economia formal, as empresas do qual estão inseridos devem cumprir com que está previsto na lei, como, por exemplo, a autorização do vínculo contratual, prática de horários definidos, pagamento de salários e a proibição de determinadas actividades, tanto pelo seu estado físico ou intelectual.
Medidas de combate
A ministra da Acção Social, Família e Promoção da Mulher, Victória Francisco Correia Conceição anunciou, recentemente, o lançamento de um projecto de lei de combate ao trabalho infantil que será submetido à consulta pública, a partir deste mês de Junho, na perspectiva de se enriquecer com contribuições de vários actores sociais, para posterior aprovação. O lançamento do projecto de lei, de iniciativa do Executivo, está sob coordenação dos Ministérios da Acção Social, Família e Promoção da Mulher, da Administração Pública, Trabalho e Segurança Social e o Instituto Nacional da Criança.
Victória Francisco Correia Conceição admitiu que a lei vai contribuir para a definição de mecanismos de actuação com base na realidade de cada município, para a erradicação do trabalho infantil, com enfoque para as actividades realizadas por crianças em mercados informais e formais. A acção, prosseguiu, vai igualmente prevenir e combater todo tipo de discriminação e violência contra às crianças na escola, na família e na comunidade. Acrescentou que também irá ajudar a melhorar os sistemas e meio de protecção dos menores, de acordo com as metas preconizadas pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).
“Pretendemos, sobretudo, estimular à adopção de boas práticas de planeamento e a implementação de acções à favor da criança dentro da linha dos 11 Compromissos e das opções do país que convergem para o cumprimento dos Objectivos do Desenvolvimento Sustentável”, realçou a ministra.
Luta pela sobrevivência
José Adão, 12 anos, luta pela sobrevivência. Foi forçado a abandonar a escola para ajudar a mãe a sustentar os seus irmãos mais pequenos. Encontramo-lo por volta das 17horas, na Centralidade do Kilamba. O menino, que é engraxador, chamava pelos clientes, uns acediam ao convite outros nem por isso.
O menor vive com a mãe e irmãos no bairro Bita Tanque. A mãe dedica-se à venda ambulante. O que ganha não chega para sustentar a família. José Adão é o segundo filho entre quatro irmãos. “É difícil ir à escola e regressar sem saber o que comer. Estava cansado de ver os meus irmãos a sofrer. Saio de casa às 6h00 para engraxar. Diariamente levo a casa 800 a 1.200 kwanzas”.
Amélia António,14 anos, também foi forçada a vender na rua. Ela dedica-se à venda de castanhas, em zonas de Luanda com engarrafamentos. Disse que vive com a avô, que não tem mais força para trabalhar. A única solução é fazer alguma coisa para ajudar nas despesas de casa.
Contou que por vender na rua fica vulnerável à assédios, mas, garante que tem resistido a isso. “Muitos nem querem saber da minha idade e quase sempre sou assediada”.
Dados do INAC referem que desde 2016 até ao primeiro trimestre deste ano, foram registados 1.075 casos de crianças vítimas de trabalho infantil