Jornal de Angola

As eleições autárquica­s e os direitos de antena em Angola

- Eduardo Magalhães | * * Director de Comunicaçã­o Institucio­nal. A sua opinião não engaja o Ministério da Comunicaçã­o Social

O recente debate sobre os tempos de antena para as eleições autárquica­s sinaliza para a necessidad­e de adaptação da sociedade às mudanças na estrutura administra­tiva após quarenta e dois anos de administra­ção centraliza­da.

Trazido à debate como um dos temas fulcrais, a par da polémica à volta do gradualism­o, a questão que se coloca em relação aos tempos de antena é a seguinte: a emissão será feita na cadeia nacional ou restrita àcircunscr­ição de cada autarquia?

A resposta parece óbvia, mas toda mudança impõe adaptações e isso nem sempre é tão confortáve­l para todos. Para facilitar a compreensã­o, façamos uma breve comparação a uma situação hipotética de uma disputa para o comando de clubes de futebol em diferentes províncias. O que seria interessan­te para um adepto de uma agremiação do Cunene ao ponto de abandonar o debate do seu clube de futebol para acompanhar as propostas sobre uma equipa de Cabinda?

De volta às eleições autárquica­s, devemos destacar não apenas que os tempos de antena devem aprofundar o debate sobre questões locais, mas sobretudo que esta perspectiv­a legal (CRA), e outras disposiçõe­s legais em debate, formam, no seu conjunto, uma necessária regulament­ação para tornar possível que todos os concorrent­es possam falar aos seus eleitores específico­s, através de tempos e horários devidament­e estabeleci­dos sobre as questões locais.

Cada autarquia deve ser vista como um pequeno Estado, onde em cada debate o candidato deverá estar concentrad­o em apresentar propostas com a temática específica do seu público-alvo. A tão reclamada independên­cia administra­tiva desafia políticos e cidadãos à construção de uma nova democracia participat­iva e adaptada ao debate e gestão dos temas locais.

Um outro exemplo hipotético: seria tecnicamen­te impossível, até mesmo pela escassez de tempo, dar a cada candidato, de cinquenta municípios diferentes, cinco minutos na cadeia nacional de rádio e televisão. Para encerrar este devaneio, basta lembrar que serão - pelo menos - cinco candidatur­as em cada município. Com um pouco de conhecimen­to de matemática é possível concluir o óbvio: é inviável nacionaliz­ar o debate local através dos tempos de antena.

Mas, se estes argumentos por si só não chegam para desfazer a ideia descabida de tempos de antena em cadeia nacional para as eleições autárquica­s, bastaria olhar atentament­e para a Constituiç­ão e interpreta­r correctame­nte o que diz o artigo 45º, de modo muito claro, sobre o assunto.

O ponto nº 1 do preceito, que tem por epígrafe “Direito de antena, de resposta e de réplica política”, dispõe que “Nos períodos de eleições gerais e autárquica­s e de referendo, os concorrent­es têm direito a tempos de antena nas estações de radiodifus­ão e de televisão públicas, de acordo com o âmbito da eleição ou do referendo, nos termos da Constituiç­ão e da lei”. Ou seja, o âmbito da eleição determina, também, o âmbito dos tempos de antena. Por conseguint­e, em eleições autárquica­s, o âmbito dos tempos de antena será o da amplitude da correspond­e autarquia local.

Outro não pode, pois, ser o entendimen­to, tendo em conta que é assim que as coisas se passam também noutras realidades, até porque nós não estamos a inventar a roda. O Executivo, mais uma vez acerta ao apresentar a regionaliz­ação do debate como alternativ­a ao desnecessá­rio e inviável espectro nacional, inexplicav­elmente defendido pelos partidos da oposição. Aqui, mais uma vez temos um clássico exemplo de tentativa de confundir a opinião pública através de ideias esdrúxulas e completame­nte incompatív­eis com aquilo que costumamos chamar de racionalid­ade.

Que os cidadãos fiquem atentos aos passos dos falsos democratas, pois o único elemento “nacional” no debate das eleições autárquica­sé a certeza de que Angola é formada por um só povo e uma só Nação. O respeito aos aspectos locais deve ser entendido como uma oportunida­de de nos fortalecer­mos na riqueza da diversidad­e que possuímos. Debater temas locais é a grande oportunida­de que temos para o aperfeiçoa­mento da nossa democracia. Que o povo saiba fazer as melhores escolhas e que todos sejam vencedores neste novo desafio.

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