ONU acusa forças sírias de crimes de guerra
Durante o conflito as partes envolvidas torturaram e aterrorizaram civis, violando a dignidade pessoal
As Nações Unidas acusaram ontem as forças sírias, grupos armados e “organizações terroristas” de terem cometido “crimes de guerra e contra a humanidade” durante o cerco e a batalha final pelo controlo da região de Guta Oriental.
“Entre Fevereiro e Abril, a intensa campanha das forças pró-governamentais para recuperar o controlo de Guta Oriental, região nos arredores de Damasco, que estava nas mãos de opositores ao Governo sírio ficou marcada, por crimes de guerra generalizados cometidos por todas as partes envolvidas, assinalou a Comissão de Investigação da ONU para a Síria num relatório ontem divulgado. O cerco de Guta Oriental durou cinco anos, de 2013 a 2018, e foi “o mais longo da história moderna”, sublinhou a comissão.
O Secretário-Geral da ONU, António Guterres, qualificou em Fevereiro a situação em Guta Oriental “o inferno na terra.”
Quando Damasco declarou o fim da ofensiva, no passado 14 de Abril, havia 140 mil pessoas deslocadas.
Os grupos armados e organizações terroristas cometeram crimes de guerra ao espalhar o terror entre a população civil e lançar ataques indiscriminados, declarou a comissão.
“Durante o cerco, de forma regular, os grupos armados prenderam e torturaram arbitrariamente civis em Duma (...), cometendo crime de guerra por tratamento cruel, desumano para a dignidade pessoal, e de tortura”, refere o documento.
Sobre as forças pró-governamentais, a comissão afirmou que “durante a operação militar, a natureza das armas empregadas em áreas civis densamente povoadas aterrorizou os residentes.”
“Existe uma base razoável para crer que as forças pró-governamentais cometeram o crime de guerra ao pretender difundir o terror entre a população civil cercada”, indica o relatório.
Na opinião da comissão, as tropas do Presidente sírio, Bashar al-Assad, cometeram o “crime de guerra ao lançar ataques indiscriminados” e “violaram o direito à vida, à liberdade e à segurança das pessoas.”
As tropas sírias também deixaram “destruídos mercados, casas particulares, hospitais” e centros médicos em bombardeamentos intencionalmente planeados, algo que constitui crime de guerra ao lançar deliberadamente ataques contra objectos protegidos e sem poupar o pessoal médico.
Em geral, salienta o documento, as tácticas das tropas sírias durante a campanha militar consistiam em “punir os habitantes e obrigar a população a render-se colectivamente ou a morrer de fome.”Naquele momento, pelo menos, 265 mil sírios ainda remanescentes na região sitiada, foram afectados por aquelas práticas.
Quando Damasco declarou o fim da ofensiva , no dia 14 de Abril, havia 140 mil pessoas desocadas
O Exército sírio, prossegue o texto, “privou deliberadamente” civis de alimentos em Guta Oriental, “negou ajuda humanitária”, “negou retiradas médicas” e lançou “tanto armas convencionais como proibidas contra áreas civis.”
A comissão considera que as forças de Al-Assad perpetraram um “crime contra a humanidade” por terem cometido actos desumanos contra a população, causando aos habitantes “um grave sofrimento físico e mental.”
Os peritos da Comissão da ONU também detectaram evidências de possível uso de armas químicas em três ocasiões entre Fevereiro e Abril,e em duas situações suspeite em que tenha sido utilizado o gás cloro - em Al Shayfouniya e numa área entre Saqba e Hammouriyeh, mas “não lhes foi possível obter material probatório suficiente.”
Ataque químico
Sobre o alegado ataque químico realizado contra Duma a 7 de Abril - que matou pelo menos 70 pessoas e 500 tiveram de ser tratadas com sintomas de exposição a agentes químicos, a comissão referiu que “as provas disponíveis são mais consistentes com o uso de cloro.”