Jornalismo versus segurança pública
Os verbos informar e violar rimam, mas não são compatíveis. Quando a comunicação social abandona a ética e a deontologia, a primeira vítima é o cidadão. É preciso repudiar a prática jornalística que fere os direitos de personalidade e que, sob argumentos completamente incoerentes, viola princípios constitucionais como o da presunção da inocência. Entrevistas e reportagens não são peças jurídicas, e a televisão não é um tribunal para julgar e condenar pessoas. O acto de acusar alguém de ter cometido crime, quando alguém está a ser investigado, por exemplo, jamais poderá ser visto como uma prática jornalística. Isto é, antes de tudo, um crime. O bom jornalismo não pode – de acordo com o princípio da presunção da inocência – sequer expor uma pessoa até que ela seja julgada. A imprensa exerce um papel importante para evitar a exposição de inocentes. Assim como nos casos de países como os EUA, por exemplo, em que há casos de pessoas inocentes que são condenadas à pena de morte, a exposição de um cidadão, antes de comprovada a prática de um crime, pode representar o assassinato de uma reputação. A cobertura jornalística das ocorrências criminosas deve evitar na totalidade o apelo à exposição de acusados de crime ainda sob investigação, sem uma condenação formal, e das vítimas da violência nas suas mais variadas formas. É preciso olhar também para os riscos da irresponsabilidade na apuração e divulgação dos factos e personagens, pois a apologia da violência ou idolatria de falsos heróis também constituem sérios transtornos para os cidadãos que assistem ou consomem este tipo de conteúdo. Alguns exemplos de violação de Direitos fundamentais na televisão, por exemplo, devem ser destacados. Entre eles estão os seguintes: 1. Desrespeito ao princípio da presunção de inocência; 2. Incitação ao crime, à violência e à desobediência às leis ou às decisões judiciais; 3. Exposição indevida de pessoas e famílias; 4. Discurso de ódio e preconceito; 5. Identificação de menores nos casos de violação do direito ao silêncio, tortura psicológica e tratamento degradante. Para evitar isso, precisamos apenas de respeitar as leis já em vigor no nosso país. É preciso reinventar o modelo angolano do jornalismo policial. Com o advento da Internet, por exemplo, e o acesso mais fácil aos elementos da comunicação, devemos pensar menos na violência (efeito) e trabalhar mais a segurança pública (causa). Há países onde a imprensa e os poderes públicos fazem pactos para o tratamento informativo das matérias ligadas à criminalidade, dispensando o recurso ao sensacionalismo e primando por algum critério para a apresentação de um bom conteúdo sobre as ocorrências criminais do dia-a-dia. É um grande equívoco optar por dar visibilidade mediática apenas à criminalidade violenta. Nos países subdesenvolvidos, com sociedades problemáticas do ponto de vista do seu desempenho socioeconómico e moral, essa questão deve ser tratada com responsabilidade, rigor e elevados padrões de profissionalismo. Nós, angolanos, somos capazes de criar a nossa própriaescoladejornalismocombasenosnossosvalores sócio-culturais, tradições e hábitos e não ir a reboque de modelos ou maus exemplos externos, planeados para outras realidades muito distantes da nossa. Por tudo isso, é necessário que a prática jornalística aplicada à cobertura das ocorrências criminosas melhore o trabalho oferecido e beneficie o púbico-alvo: a sociedade. É preciso, antes de tudo, respeitar os direitos e deveres de todos e abandonar o sensacionalismo, pois julgar e condenar são papéis da Justiça, não da Imprensa.