Polícia cria Gabinete de Apoio à Vítima
Qualquer pessoa que tenha sido vítima de um crime ou presenciado pode encontrar ajuda psicológica de que precise na esquadra da Cidade do Kilamba, que tem especialistas a funcionar há cinco anos numa estrutura apropriada para o efeito
As vítimas de crime na província de Luanda podem recorrer ao Gabinete de Apoio à Vítima, uma estrutura da Polícia Nacional a funcionar na esquadra da Centralidade do Kilamba, para receber acompanhamento psicológico.
A informação foi avançada ao Jornal de Angola pelo porta-voz do Comando Provincial de Luanda da Polícia Nacional, inspector-chefe Lázaro da Conceição, a quem foi perguntado se a corporação tinha uma estrutura que fizesse acompanhamento psicológico a vítimas em Luanda, província que tem o maior índice de criminalidade em Angola.
A pergunta feita a Lázaro da Conceição deveu-se à necessidade de ser feito um “enquadramento psicológico” à vida de quem presenciou o assassinato de pessoas próximas. O caso mais recente é o de uma jovem, de 30 anos, que assistiu, com os seus dois filhos, ao assassinato do marido, Carlos Albano de Oliveira, de 35 anos, na sequência de um assalto, há uma semana, à moradia do casal, no bairro Mundial, distrito urbano do Benfica.
De acordo com o inspector-chefe, o Gabinete de Apoio à Vítima tem especialistas formados em Psicologia, que “podem fazer um trabalho de acompanhamento psicológico à mulher e aos dois filhos.”
Lázaro da Conceição informou que o assassinato de Carlos Albano de Oliveira está sob investigação e a Polícia Nacional e o Serviço de Investigação Criminal (SIC) estão a fazer aturadas diligências com vista à detenção dos presumíveis autores de mais um crime violento que chocou a população de Luanda. Já a psico-pedagoga clínica Alzira Moço, professora do Instituto Superior Politécnico Internacional de Angola (ISIA), admitiu que a mulher e filhos podem vir a ter trauma psicológico.
A morte de Carlos Albano, de acordo com a psico-pedagoga clínica, pode criar na mulher transtornos relacionados com o pânico e o medo patológico de lidar com qualquer pessoa que aparentemente faça lembrar os autores do assassinato do marido.
Os filhos podem, com o tempo, apresentar problemas de bloqueio relacionados com a aprendizagem e viver fases difíceis, o que os vai obrigar a reprogramarem a sua psique, daí a razão por que a viúva e os órfãos precisam de acompanhamento psicológico, acrescentou Alzira Moço.
“O psicólogo tem a tarefa de orientar a viúva e os filhos sobre como proceder daqui em diante para que os efeitos resultantes do choque da perda brusca do chefe da família sejam minimizados”, acentuou Alzira Moço, que disse ser também necessária que a mulher e os dois filhos do jovem assassinado sejam também acompanhados por sociólogos e por psico-pedagogos para terem uma recuperação adequada.
Tempo da recuperação
“Essa família não pode ficar abandonada”, defendeu Alzira Moço que, quando questionada sobre o tempo da recuperação do trauma, respondeu que não se pode avançar, para já, um tempo determinado, por cada caso ser um caso, embora haja pessoas com um nível de resiliência grande e que conseguem sair de situações difíceis num curto espaço de tempo.
A especialista em Psicopedagogia avisou que uma vítima de crime ou alguém que tenha presenciado um crime pode, numa primeira fase, não apresentar situações de bloqueio, daí que uns se recuperem rapidamente do trauma e outros a médio e longo prazo. Carlos de Oliveira era natural de Calulo, província do Cuanza-Sul, e o seu assassinato ocorreu na madrugada de sábado para domingo, há uma semana, cujos presumíveis autores são dois meliantes que invadiram a casa da vítima com a intenção de matar.
Esta tese é defendida pela família do malogrado. António dos Santos, irmão da vítima, disse ao Jornal de
Angola que os assassinos entraram em casa sem terem arrombado a porta principal nem as janelas.
Já dentro de casa, dirigiram-se para o quarto do onde um dos meliantes disse a Carlos de Oliveira: “manda mais boca! Hoje, vamos-te matar”, descreveu António dos Santos, com base no relato transmitido pela viúva à família.
Um dos assaltantes estava com uma catana, objecto que queria desferir contra a mulher de Carlos de Oliveira, tendo este entrado em luta corporal com o indivíduo. Na luta, Carlos de Oliveira conseguiu colocar o homem ao chão, ficando em cima do assaltante, momento em que o outro assaltante disparou um tiro pelas costas. Mesmo depois de atingido, Carlos de Oliveira continuou a lutar com o meliante para lhe retirar a catana das mãos, mas não conseguiu materializar a sua intenção por ter recebido um segundo tiro em direcção à barriga.
Os dois assaltantes retiraram depois a mulher da sala para o quintal, onde foi violada, informou o cunhado, que disse terem os assaltantes regressado ao interior da casa depois de cometerem o crime de violação. O marido da jovem ainda respirava. “Um deles disse que tinha de acabar de matar o meu irmão para não deixar o trabalho pela metade”, contou António dos Santos, mencionando que os marginais asfixiaram o irmão com recurso a um tapete.
António dos Santos disse estar inconsolável com a perda do irmão e lembrou ter sido ele a pessoa que mandou vir a Luanda Carlos Oliveira, em 1993, devido ao reacender da guerra, depois da realização das primeiras eleições gerais da história de Angola.
Os assaltantes abandonaram a moradia assaltada por volta das cinco horas da manhã. A família da vítima pediu ao Serviço de Investigação Criminal que desvende as motivações que estão na origem do assassinato de Carlos de Oliveira, em “circunstâncias estranhas.”
Carlos de Oliveira era colega da esposa numa empresa de saneamento básico e recebeu a 26 de Abril o diploma de licenciatura em Gestão de Empresa pela Universidade Metropolitana. O casal vivia no bairro Mundial há quatro anos com os dois filhos, um de 11 anos e outro de cinco. Carlos Alberto era o quarto de cinco irmãos. Era um jovem reservado, de poucas amizades e que procurava resolver os problemas pessoais sozinho, sem interferência da família.