O combate à corrupção tem de ser permanente
Angola desperta, estremunhada ainda, da letargia em que mergulhou após um período de deslumbramento pela facilidade de se ter dinheiro para gastar a bel-prazer sem fazer contas.
Os angolanos viviam, finalmente, sem o espectro da guerra e o país começava a ser reerguido, com a reparação e construção de estradas, aldeias, vilas, cidades. Era o tempo de uma esperança renovada na Pátria sonhada por muitos dos seus filhos mais abnegados. Parte deles pagou com a liberdade, encarcerada em cadeias e campos de concentração, a própria vida nos campos de batalha.
Os preços do petróleo ajudavam a aumentar a nossa “bebedeira colectiva” de entusiasmo. O orgulho do país do futuro, que queremos deixar às gerações vindouras, quase nos sufocava, de tanto bater no peito. O progresso, galopante, não diminuía a marcha. Prosseguia veloz. Aumentámos o número de escolas de todos os níveis, bem como estabelecimentos de saúde. Continuávamos a limpar campos semeados de minas e armadilhas para as substituir por lavras, pomares. Construímos entrepostos de produtos de campo para chegarem em condições aos consumidores dos grandes centros urbanos. Transportados pelas vias reparadas ou construídas.
O dinheiro em circulação crescia. Dos salários melhorados dos trabalhadores, dos negócios de comerciantes e industriais. O número de instituições bancárias também. Eram indispensáveis a empresários, mas também a trabalhadores. Para lhes conceder créditos. No primeiro caso, em princípio, para investimentos, no segundo, para a aquisição de casa, automóvel, viagens que já não serviam para trazer roupas. As lojas de moda, algumas de marca, também proliferavam entre nós. E continuávamos com o nosso orgulho em alta e a gastar o que nos faz falta agora.
Um dia, o sonho bonito de muitos de nós transformou-se em pesadelo, quando deixámos de ter o suficiente para pagar a prestação da compra da casa, do automóvel de último modelo. Que fomos incentivados a adquirir. E passámos a ter saudades do cubíco que deixámos no bairro onde crescemos e nunca mais visitámos, da viatura utilitária que usávamos antes...
Os desencantos aumentam quando se percebe que, afinal, as estradas, bairros, centralidades, armazéns destinados a cereais que quase nos sufocavam de orgulho são hoje razão da nossa vergonha e raiva. Dou dois exemplos. O primeiro, refere-se à qualidade dos materiais usados no fabrico do betão betuminoso, principalmente a brita, para a asfaltagem de 93 quilómetros dos troços que ligam Samba Caju à Banga e Balongo, que não são os adequados por tornar “o asfalto frágil e com pouca durabilidade”.
Quem o afirmou foi o ministro da Construção e das Obras Públicas. Quer dizer que, se Manuel Tavares de Almeida não tivesse ido ao Kwanza-Norte, era mais uma via feita... para arranjar dentro de pouco tempo. O que se pergunta é quantas por esse país foram, ou têm de ser, reconstruídas por haver, no mínimo, incompetência e desleixo de quem deve, ou devia, zelar pelos bens públicos. O segundo caso é o das cinco ou seis mil toneladas de arroz e milho abandonadas, pela anterior gestão do Fundo Soberano de Angola, há três anos, em silos, no Bié, Cunene, Cuando-Cuibango, Moxico e Uíge.
Estes são apenas dois exemplos que ilustram a forma como tem sido desbaratado o erário. E por que motivo o país chegou ao estado em que se encontra, a que não são alheios a corrupção, o nepotismo e a impunidade. Que é preciso continuar a combater. Cada vez com mais veemência. Para podermos voltar a sentir o peito a bater de orgulho. Mas, desta vez, com os pés assentes no chão, sem esquecer que “nem tudo o que luz é ouro”.
Os preços do petróleo ajudavam a aumentar a nossa “bebedeira colectiva” de entusiasmo. O orgulho do país do futuro, que queremos deixar às gerações vindouras, quase nos sufocava, de tanto bater peito